Herdeiro (Parte 1)

Daniel Camargo 

Regina Peres / Leonardo Drummond

Zélia Drummond / Caleb Rodrigues

     Daniel vai caminhando lentamente sobre a calçada como se não quisesse chegar a lugar algum. Porém ele já estava tão perto de casa e também do casarão da velha Zélia. A cada passado que dava, ele pensava em tudo que estava acontecendo e no quanto precisava fazer algo para sair de lá com sua mãe.

      Ao chegar na esquina que dá acesso ao casarão, ele vê Caleb que era capataz da velha que morava no casarão branco. O encontro de olhares o faz ficar fervendo de ódio e faz o outro homem sorrir debaixo do grosso bigode preto. Tanta fúria que faz Daniel apressar os passos e ir logo entrar pelo grande portão verde gradeado que dava acesso a propriedade.

      Ele vai caminhando pelo caminho de pedras que cortava um lindo jardim de plantas tropicais até terminar na entrada lateral da grande casa. Ao se aproximar, ele vê sua mãe Regina conversando com aquela que ele chamava de ''velha nojenta''. Daniel já cansou de brigar pelas conversas que Regina tinha com Zélia, então ele lança um olhar de raiva para as duas sentadas no quintal e segue com sua cara ''amarrada''. Seu plano momentâneo era de passar direto para casa só que:

Regina: Boa tarde, filho! Voltando cedo? - pergunta alto com medo dele já ter se distanciado.

Daniel: Ah, oi. - ele vira-se para visualizar as mulheres - Não tive todas as aulas. Alguns professores estão com medo pelo assassinato do professor Jorge. - completa e volta seu olhar para Zélia.

Zélia: Mundo perigoso esse, filho. Melhor ter cuidado... - termina num tom de deboche.

Daniel estava falando sobre o professor que foi encontrado morto em sua casa após ser acusado de ter relação com o tráfico de armas no sul. Então ele voltou para ser caminho original.

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     A casa de Daniel e sua mãe, era uma espécie de anexo do anexo do casarão de dona Zélia, a casa ficava nos fundos. Contudo, estava tão frustrado que um banho na piscina não lhe faria mal algum e ainda o deixaria bem melhor.

     Ele amava a piscina que descobriu da velha Zélia, embora o acesso a ela fosse quase no porão do casarão e difícil entrar, ele nunca entendera o motivo de ter uma piscina lá mas era o único lugar fechado que ele poderia utilizar, já que a velha o negara de aproveitar qualquer coisa da propriedade se não a própria casinha destinada a ele.

     Nada lhe tirava da cabeça a vontade de desestressar um pouco. Mudou o caminho e foi até a porta traseira da casa onde não tinha ninguém de tocaia. Passou pelas escadas apertadas praticamente num pulo e já estava a frente da porta vermelha do cômodo.

     Era realmente linda. Toda uma sala de cor creme, com luzes amareladas e ornamentada com sofás, boias, vasos de plantas tropicais, piso polido, cadeira de modelo antigo, abajures e a piscina que Zélia quase nunca visitava. Ele chega a beira da piscina e pela primeira vez pensa se era certo estar ali até que reflete que suas escapadas nunca foram descobertas e por tanto ser humilhado por Caleb e pela velha, ele merecia um banho

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     Daniel entra na água mas permanece com a cabeça fora d'água, na espreita de precisar sair rápido de lá. Por muito tempo ele não aguenta e começa a nada feliz da vida. Os minutos vão se passando porém ele mal consegue notar. Sai dali e vai aproveitar daqueles escorregadores de piscina.

     Na terceira vez que descia para a piscina, a porta da sala se abre porém parecia que o mundo de Daniel caindo diante de seus olhos. Era Caleb entrando e então saindo sem ao menos fechar a porta. Daniel rapidamente colocou seu jeans que estava em cima da mochila a beira da piscina e a agarrou rápido para sair de lá.

     Já chegando as portas, Zélia entra na sala com o olhar de cobra pronta para dar o bote...e ela deu:

Zélia: Chame a policia, Caleb. Invasão de propriedade. - Para e olha friamente para o garoto.

Caleb: Sim, madame. - responde as costas dela mas não se move.

Daniel: NÃO! - grita num desespero - Minha mãe...não pode passar por isso, por favor. - ele suplica.

Zélia: Não sei, garoto. Faz tempo que quero me livrar de você. - diz ela com tom de nojo.

Caleb: A madame sabe que seria uma honra deixar de ver esse pirralho. - ele se intromete.

Zélia: Não se meta, contudo...seria uma sorte mesmo mas deixa ele fugir igual rato voltando pro buraco de onde veio. Vou contar até 3 e se ver seu rastro, juro que chamo a policia. - fala e cruza os braços.

     Daniel saiu correndo e dando um encontro de ombros em Caleb enquanto os dois ali riam do garoto. Enquanto subia as escadas o mais rápido que podia, ele pensava que iria apanhar do bigodudo por aquilo. Os lances de escadas foram praticamente saltados e então ele já estava fora do casarão e correndo feito louco dentro do jardim até sua casa.         Ao chegar ao mini portão que dividia os quintais, ele olhou para trás e viu uma figura de roupa social (calça preta e blusa azul marinho) e sabia que era Caleb sorrindo da sua desgraça.

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     Regina estava assistindo tv quando um Daniel totalmente sem fôlego entra violentamente casa a dentro.

Regina: O que foi, amor? - pergunta assustava.

Daniel: Nada! Como sempre nada! - reponde com raiva.

     Ele entrou no quarto e bateu a porta com toda sua força. O rosto de Regina era de profundo espanto mas ela já imaginava que Caleb tinha feito alguma coisa...ouviu Daniel ligar o único companheiro e só poderia esperar ele sair de lá.

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     Daniel tem seu canal de rádio favorito, deita na cama e deixa seu amigo ligado sobre o tapete ao lado da cama. Estava quase rezando para que Caleb não entrasse lá e o agredisse como sempre faz mas também com os olhos já molhados rezava para não chorar alto e sua mãe ouvir.

     Seu único sonho era poder se livrar de tudo aquilo. Poder finalmente por fim ao seu sofrimento junto ao de sua mãe. Por hora, ele poderia ter a companhia de seu rádio e de sua mãe que imaginava estar de pé do outro lado da porta, já que seu pai Leonardo fora sequestrado por Zélia e desde então estava sumido nesse mundo.

Regina: Filho, vamos conversar...por favor. - ela implora ao lado da porta.

Daniel: Não, eu não quero, mãe. - ele afunda o rosto no travesseiro.

Regina: Mas olha, eu posso explicar, me deixa... - Diz quase chorando.

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     Ele estava quase dormindo de cansaço quando seu coração encheu de medo novamente. A cada saída de sua mãe, ele imaginava o dia em que Zélia e seus bandidos iriam levá-lo para longe de sua mãe e sumirem com ele também. Por isso assim que ela saia, ele ia se esconder debaixo do armário da cozinha.

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     Não passou muito tempo fora do casarão e ela também era escoltada pelos capangas da velha Zélia. Ao passar pelo casarão, não viu o rosto da dragoa pelas janelas e então seguiu em paz para sua casa, levando as bolsas do mercado que continham biscoitos e não bolachas para Daniel. O dia poderia seguir tranquilo ou menos problemático porém Caleb e outro capanga vinha em direção a ela.

Caleb: Pode sair, Mathias. Viu que salve a pele do seu filhinho hoje? - como se quisesse cortejar a mulher.

Regina: Salvou pra poder bater amanhã? Não sei do que você está falando. - e desviou dele.

Caleb: A velha Zélia ia mandar prender o moleque se não fosse por mim. - disse e pegou no braço dela.

Regina: Prender pelo que, homem? - pergunta sem entender.

Caleb: Ele chegou até as piscinas onde o Leonardo ficava... - e Regina se espanta - Eu sabia e deixava ele ficar lá, não queria impedir dele seguir os caminhos do pai. - sorriu e Regina fez um movimento e ele soltou a mão do braço dela. - A velha descobriu e mandou expulsar ele.

Regina: E o que tem o garoto entrar lá? Ele tem 16 e a casa (a mansão) é tanto dele quanto dela. - disse aumentando a voz.

Caleb: Xii, fala baixo...''e o que tem?'' Ele não sabe e ela não quer que ele descubra né?

Regina: Não vai ser assim pra sempre, ele um dia vai descobrir. - e saiu andando rápido.

Caleb: REGINA! Eu te amo, você me pertence agora e nem que o Leo volte do inferno, você vai deixar de ser minha.

     Aquelas palavras pesaram na alma de Regina que fingiu não serem para ela enquanto ela abria o portozinho e entrava em casa.

Daniel: O que ele falou para a senhora? - disse quando ela entrou - Eu ouvi ele gritar que te amava.

Regina: Ele veio falando mais do mesmo e me disse que você foi até a piscina. - disse colocando as bolsas na mesa~.

Daniel: Ouça, mãe. Eu gosto de lá e me sinto bem, não vejo problema nisso. - Disse indo atrás dela na cozinha.

Regina: Mas você sabe, Daniel! Essa gente não é piada, eles são severos... - e sentou a mesa.

Daniel: Você pensou nisso quanto estava conversando com aquela velha? - sentou também.

Regina: Não foi bem assim!

Daniel: Ah como não? Já disse que odeio você de conversa fiada com ela...aquela mulher é má! - disse relutando.

Regina: Fui tratar de assuntos com ela...

     Os dois estavam quase aos berros porém mais uma Regina nunca termina de contar o que daria explicação a Daniel, pelo estar dos dois na casinha ao lado de casarão e de ficarem a mercê dos maus tratos dos capangas.

Daniel: Mãe, a cada vez que aquele estuprador nojento entra aqui, eu quero vomitar até morrer. - disse quase chorando - Eu sei que aquela Zélia é bandida e nem posso contar ao Pedro, ao Marcos, a Cecília e nem aos outros amigos da escola onde moramos e o que acontece. Por favor...precisamos sair daqui.

Regina: Não dá... - e leva as mãos ao encontro das mãos de Daniel.

Daniel: Tem que ter um jeito, mãe. Precisamos nos livrar deles.

Regina: Não dá, é maior que nós dois, é impossível.

Daniel: Por que? Só me diz.

Regina: Zélia Drummond é sua avó.

     Ouvir aquilo foi como levar um tiro nas costas. Daniel nunca pensou que teria chances de uma coisa horrenda feito aquela poder ser cogitada.

Regina: Leonardo é filho dela.

Daniel: Você disse que ele sabia trabalhar a droga e por isso foi levado por ela...que se fosse levado pela policia seria pior.

Regina: Disse! Mas...entenda, ele fugiu disso tudo aqui e ela ia atrás dele então de nós dois, até que nos achou, entende? Ele procurava um jeito de sabotar os negócios dela pra policia conseguir chegar até ela mas essa gente é perigosa demais.

Daniel: E o que houve? Por que temos que ficar aqui?

Regina: Ela nos achou mas...e não demorou muito para eu ficar grávida. Ele sumiu do nada e ela nos deixou aqui por medo de tudo vazar.

Daniel: Medo de tudo vazar...colocando medo na gente? Enviando um estuprador e agressor para ficar de olho na gente?

Regina: Ela iria nos matar na primeira desconfiança que ponhamos os pés fora daqui e de espalhamos o que sabemos...filho o que posso fazer?

     Daniel levantou-se e foi abraçar bem forte sua mãe, chegou próximo ao ouvido dela e disse:

- Vamos fugir.

(Continua)

TEXTO E REVISÃO: Raphael Maitam

Seja bem-vindo para ler esse conto e mais outros no meu livro disponível no wattpad: https://www.wattpad.com/story/118616926-versos-por-aí-segundo-volume