Herdeiro (Parte 3)

Daniel Camargo (Drummond) / Regina Peres

Zélia Drummond / Caleb Rodrigues

Leonardo Drummond / Cecília Pacheco

Marcos Pontes / Pedro Spratte

      Daniel só teve tempo de responder ''sim'' para Cecília, confirmando que era filho de Regina. O garoto agradeceu a ajuda e saiu rapidamente para não se atrasar. Andou apressado e chegou enquanto ainda estava dia, os capangas da velha mais uma vez o viam atravessar pelo portão e o encarar. Caleb estava metros a frente, depois do portão gradeado, estava sentado numa cadeira de ferro e de pernas cruzadas enquanto parecia admirar o chão até que notou a presença de Daniel.

Caleb: Menino bom! Nunca se atrasa, sempre faz o que o mestre manda. - o garoto se encheu de fúria.

Daniel: Melhor obedecer do que apanhar ainda mais não é? - retrucou retomando seu caminho pra casa.

Caleb: Apanhar? Não sei, me diga você que parece expert. - deu um riso de lado

     Daniel não queria mais ouví-lo e só continuou se afastando dali

Caleb: Ei - o garoto vira o rosto para atender - Se você tiver tramando alguma coisa...lembre-se... - ele mirou o olhar para sua cintura e ao levantar a blusa, apareceu um revolver, era a primeira vez que Daniel via um pessoalmente.

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      Chegando em casa, ele explicou a sua mãe que conseguira entrar em contato com sua possível tia Yolanda por email.

Regina: Tem certeza de que ela vai vir mesmo, filho? Não gosto dessa ideia. - disse ainda desconfiada.

Daniel: Como não, mãe? Disse que a velha estava sobre ameaça e revelei detalhes que mais ninguém no mundo saberia além de nós.

Regina: E quando ela vir? E aí? Vai entrar aqui e simplesmente ''poof'' estamos livres?

Daniel: Bem...quando ela chegar, ameaçamos a velhota de contar, não tem como dar errado.

Regina: Não podemos ter certeza disso, ela pode envolver a polícia.

Daniel: Mas entrando aqui e ameaçando, nenhum dos capatazes podem nos tocar e pedimos demissão sei lá, pedimos para sair daqui e aí então fugimos sem deixar rastros.

Regina: Rastros? Eu já nem sei mais o que é isso, meu filho...

Daniel: Vamos saber, mãe. - passou a mão no cabelo da mãe - Quando a Yolanda vier, damos um jeito de ir embora para sempre.

Regina: Sem dinheiro, sem rumo...não vão demorar a nos achar ainda mais se estivermos por perto...há boatos que ela mandou matar o professor da sua escola que foi descoberto lá no sul.

Daniel: Por isso mesmo, descobri hoje que o marido da velha era o Marcus Paulinske, será que conseguimos pegar algo dele e vender por ai?

Regina: Aí que nos pegariam, filho. A família Drummond é a única detentora dos direitos de venda e todos os quadros foram vendidos, só tem algumas gravuras no casarão mas se forem a leilão, a família descobre.

Daniel: Que droga...Mas deixa eu te perguntar, como você conheceu o papai?

Regina: Então. - a mulher se recompôs - Conheci seu pai no começo dos anos 2000 claro. Em uma das fases que ele fugira de casa e estava desiludido da vida. Depois o descobriram e eu resolvi vir junto mesmo a contra gosto dele.

Daniel: E a família dele como foi?

Regina: O Marcus faleceu quando seu pai tinha uns 12 anos, a irmã Yolanda já trabalhava e era famosa na Europa e a mãe já era uma das maiores chefonas do tráfico de drogas e de armas porém é claro, muito bem protegida e mascarada...

Daniel: Nunca tentou fugir?

Regina: Várias vezes mas sempre pensei que um dia ela me traria seu pai e sempre pensava que aqui estaríamos mais seguros e-

Daniel: De que? Sofremos abusos quase sempre a velha nem se quer menciona o meu pai...tá na cara que ele morreu e só nós dois estamos por aqui.

Regina: Mas ela nos mantém aqui para não contarmos...bem, saímos é fato mas você não sabia e agora nós dois sabendo, é capaz das coisas piorarem.

Daniel: Então, mãe!!1 Quando a Yolanda chegar, nós vamos para fugir pra um dos anexos lá da escola, eles não podem invadir...se bem que nem a gente ia saber também.

Regina: Se me der um grampo, eu consigo com qualquer fechadura. - e deu um sorriso meio nervoso

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      A noite chegou e os dois mantiveram suas rotinas normais. Regina sentada no sofá enquanto assistia tv e Daniel que tinha deixado seu companheiro rádio de lado, para estudar mapas dos livros escolares e de enciclopédias, ele estava procurando uma boa rota de fuga.

     O amanhã se tornou hoje e logo clareou. Daniel se arrumou para o colégio e saiu de casa mais contente do que nunca esteve. Nem a presença dos seguranças ao redor da propriedade o deixavam mal de alguma forma. Foi passando pelo casarão e espantosamente viu a velha Zélia tão cedo acordada ao telefone, até que ela o viu também.

Zélia: Bom dia, meu rapaz. - disse enquanto abaixava o telefone.

Daniel: Nunca vi a senhora acordada tão cedo, consciência pesada não fez a senhora dormir ontem? - e riu

Zélia: Ooh, meu querido, sabe o que dizem quando um ratinho feito você está sorrindo tão cedo? - Daniel permaneceu intacto - Dizem que é quando ele está a caminho a ratoeira. - e abriu seu sorriso mais falso.

      Daniel não ficou ali nem mais um segundo, voltou ao seu caminho e metros depois estava já no portão da propriedade. Saiu e tinham apenas dois seguranças, pegou seu caminho e logo enxergou Caleb sem roupa social e parecia estar chegando ao trabalho.

Caleb: Ora, se o Danielzinho não está indo pra escola. - o garoto nem fez questão de responder mas sorriu involuntariamente. - Eu não sei o que é, mas você tá diferente...e eu vou descobrir.

Daniel: Então eu te ajudo...estou de óculos novos, estou...tendo uma visão melhor. - e saiu rindo.

Caleb: Mas lembre. - Daniel nem fez questão de virar-se - Os óculos são novos, não me faça quebrá-los quando quebrar seus dentes se você contar mais do que deve...odiaria ver a sua mamãe indo ao quartinho dos seguranças pra te arrumar mais uma porcaria para usar.

      Logo o menino achou o que arrancaria toda a felicidade de seu coração. Caleb subiu a rua dando gargalhadas e uma enorme tristeza e peso atingiram o coração de Daniel. Ao imaginar sua mãe nas mais terríveis situações tendo que se humilhar para conseguir comprar coisas mesmo simples para eles, não poderia ter sensação mais cruel para um filho. Então ele seguiu seu caminho de sempre, sempre triste e sempre a esperar de fugir dali

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      Chegou no colégio e sua primeira aula era educação física. Seus amigos Pedro, Marcos e Cecília estavam já na quadra a sua espera. O garoto entrou desmotivado e deu a sua presença ao professor. Cecília disse que os quatro precisavam conversar e que era muito sério, ele preferiu ir tomar um banho antes de fingir ir jogar quando na verdade eles iam como sempre ficar debaixo das arquibancadas conversando.

      Pedro o seguiu alguns minutos depois e entrou no vestiário. Estava vazio e vinha um som de choro e chuveiro aberto do último box, ele se encaminhou até. A porta fechada, ele começou a dizer:

Pedro: Po cara, se for muito difícil pra você não precisa contar... - o choro não acabava - eu tenho problemas em casa...claro que nenhum machucado do meu padrasto mas cê sabe, problemas né? Por favor, a gente só pede que você conte de uma forma mais leve possível, pra gente te ajudar...chamamos o conselho tutelar, a policia, sei lá, vamos proteger vocês, tem muita gente que gosta de ti, você é um cara bacana.

      Então o chuveiro é fechado e a porta do box é aberta por dentro, enquanto abrir lentamente, Pedro observava marcas sendo reveladas no corpo nu de Daniel. De costas, ela vai virando e mostrando cada vez mais vermelhões e cicatrizes, fica de frente ao amigo, ainda de cabeça baixa como quem contemplasse a água escorrer pelo ralo.

      O outro garoto ficou totalmente espantado e chocado, por segundos tentou decifrar como cada marca havia sido feita no corpo de seu amigo. Mas não hesitou, se encaminhou a frente de Daniel e abraçou tentando aliviar um pouco que seja cada dor que havia em seu corpo e sua alma.

Até que um garoto abriu a porta do vestiário e viu os dois:

- Mas que merda...suas bichas. - fez um olhar de assustado e saiu de lá.

       Daniel então apertou a mão que estava repousada no ombro e a outra nas costas de Pedro, começando a chorar. Seu amigo, sem entender nada só pode aceitar que estava sendo para Daniel o porto seguro dele. Apesar de ter sido por uma situação terrível, ambos encontraram conforto naquele braço.

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      Minutos depois e os dois apareceram de baixo da arquibancada. Marcos e Cecília estavam a sua espera já muito nervosos.

Cecília: Que droga, achei que vocês dois tinham tomado tanto banho que desceram pelo ralo. - e os dois se olharem quase envergonhados.

Daniel: Desculpa, eu demorei porquê estava muito mal.

Marcos: Conta, cara, tudo. Precisamos saber de tudo para nos localizar e ajudar você e sua mãe.

Pedro: Eu disse isso a ele e ele vai contar, não vai, Dan?

Daniel: Vou, mas preciso que vocês escondam isso aqui e entre nós.

Marcos: Igual aquele filme da Britney que ela e as amigas enterram uma caixinha cheia de bonecas e desenterram mais velhas?

Cecília: Garoto...deixa ele falar.

Daniel: É, bem, quase isso mas sem a parte do desenterrar.

Cecília: Desculpa, Dan, eu tive que contar sobre sua mãe e a tal Yolanda.

Daniel: Ótimo, tudo o que vocês precisam saber é que minha mãe conheceu meu pai quando ele estava fugindo da família dele. - os três fizeram cara de quem não entendeu - Ele vem de uma família rica não?-

Pedro: Bilionária, vi que todas as obras vendidas do Marcus, dava cerca de 2,1 bilhões e nem foram atualizados para o câmbio atual, nem mesmo contei as gravuras e afins. - todos ficaram impressionados.

Daniel: Então, meu pai, Leonardo Drummond conheceu minha mãe Regina em uma das vezes que fugia da família e seu dinheiro. Até que a Zélia o achou e trouxe ele junto com minha mãe que já estava grávida. Então meu pai sumiu e minha mãe assim como eu, ficamos de reféns naquele casarão. Tive a ideia de chamar minha tia para chantagearmos a velhota e fugirmos de vez.

Marcos: Pera, não faz sentido...mesmo que sua avó não te queira assumir como neto, por que ia manter você e sua mãe lá e ainda mais sendo abusos.

Daniel: Talvez porquê ela ache que eu pediria algo da fortuna...ela não sabe que descobri isso há alguns dias. - e voltou seu olhar a Cecília - O que foi? - disse gentilmente.

Cecília: Nada... - Daniel parecia discordar com o olhar - Tá bem...Dan, eu não conheço sua mãe e acho que nenhum de nós aqui mas...tem inúmeros artigos online sobre o desaparecimento do seu pai...só que nada da sua mãe...será que a sequestradora que nunca encontraram, não seria ela?

Daniel: De jeito algum! Minha mãe permanece lá e ainda sofre assim como eu. - disse meio nervoso.

Cecília: Desculpa, eu só quero tentar juntar as peças.

Daniel: Hoje cheguei muito mal porquê o pior dos capangas que trabalha no casarão, disse que minha mãe vai até o quarto dos seguranças e faz vocês sabem o que pra conseguir comprar coisas para nós dois. Isso me destruiu.

Pedro: Não dá bola, dói pra caralho ouvir isso mas ele só quer te magoar, olha o que ele fez no seu corpo. - Cecília e Marcos se entreolharam.

Daniel: Resumindo: Preciso de um lugar para ficar quando fugir, pensei naquele anexo do colégio mas tô com medo de muitas pessoas verem a gente passando até ele.

Cecília: Se vocês puderem ficar distante dos olhares e de onde possam deduzir que você esteja, a noite pode ir se esconder naquela sala minúscula da ponte que fica do lado do colégio.

Pedro: Aquela sala é horrenda, tem cheiro de urina, coisa podre e morte.

Daniel: Mas pode ser bom até conseguirmos dinheiro para fugirmos para outro estado.

Marcos: E pra onde vão? Pensou já, Dan?

Daniel: Tem ônibus pra Minas as 7hrs da manhã mas não temos dinheiro algum.

Pedro: Tenho o dinheiro do meu aniversário e se vocês dois tiverem um pouco que seja, podemos comprar a passagem mas chegando lá, vocês vão ter que se virar, amigão.

Daniel: Nossa, já tá ótimo. Se puder comprar na hora então!

     Eles foram descobertos momentos depois e tiveram que participar da aula assim como de todas as aulas da grade no dia. Daniel conseguiu esquecer o que Caleb tinha tido a ele sobre sua mãe, conseguiu concentrar no colégio como fazia todos aqueles anos, agindo como um garoto normal para não dar pistas.

     Naquele dia, ele ainda teria que aturar a feira de ciências, que apesar de amar, só poderia ir embora 18 horas, mesmo se distraindo, isso faria menos efeito já que ele não conseguia para de pensar me casa e como sua mãe ficaria tanto tempo sem ele...bem, relembrando que Caleb nunca pedia permissão para as agressões, o dia não terminaria muito diferente dos outros. Ele lembrou que Yolanda ainda não respondeu ao email de Cecília e não sabe quando vai poder finalmente fugir com sua mãe...seu coração estava apertado.

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      Após a feira, Daniel se despediu dos amigos e tomou seu rumo para casa. Subiu a rua que dava acesso ao portão para o casarão, contudo só havia um único segurança. Na dúvida, o garoto se aproximou da casinha onde ele estava e pegou o homem de surpresa:

Daniel: Cadê os outros? - perguntou quase inocente.

Segurança: O Caleb vai te matar, sua praga.

Daniel: Por que? Eu não tenho culpa se a turminha dele não veio em peso.

Segurança: Tu que se engana, moleque. Vai pro seu bueiro e ele te encontra lá, vocês finalmente vão acertar as contas que tem.

      Aquilo atingiu Daniel feito um soco no estômago. Nervoso, ele saiu entrando jardim e a dentro muito rápido e notou um carro de uma coloração azul escura, ele nunca tinha visto aquele carro ali antes. O casarão estava todo iluminado como se fosse dia de festa. Até que ele ouviu um assovio o chamando, na mesma hora acertou de onde vinha e era de Caleb que estava o espionando e o esperando...seja o que fosse, Daniel já sabia, ele iria morrer aquela noite.

Caleb: VEM, BASTARDO! - ele gritou em plenos pulmões e gesticulou a mão chamando o garoto feito um cachorro.

     Daniel não tinha forças para se mover, era capaz de mover um milímetro e desconjunta-se inteiro de tanto medo que sentia pela expressão furiosa e pelo grito de Caleb, assim como o suspense de tudo o que poderia estar acontecendo.

Caleb: Se não vir...seu corpo jazerá para sempre feito o corpo daquela que o trouxe ao mundo... - e voltou a fazer o gestual.

      Todas as suas entranhas começaram a dor, Caleb só poderia ter dito aquela frase para dizer que Regina estava morta ou muito próximo a isso, ele precisava se mover e descobrir...então começou a caminhar o mundo parecia ter aumentado a pressão e tudo estava pesado e concreto demais. Repetiu os passos e respirava pesado, sem pensamento algum em sua mente...chegou até Caleb.

Caleb: Vamos dizer que... - Caleb era mais alto, então o olhava de cabeça pra baixo e seu rosto estava numa expressão horrível - um certo filhinho da puta deixou A Dona muito nervosa e então ela pediu que déssemos um jeito.

Danie: A Dona? Que jeito?

Caleb: Ué, não sabia o nome de guerra da sua avó? A Dona...como ela gerencia os negócios dela. - e deu um soco no meio da cara do garoto que caiu na hora - Vai me dizer que você não sabia? Tanto não sabia que nem pensou em chamar a Yolanda...é, ela chegou, pequeno herdeiro, a sua hora também.

     Agarrou o garoto ensanguentado pelos cabelos e o arrastou até a porta de casa o deixou cair de cabeça ao chão.

Caleb: Não queria ver o jeito que eu dei? Então, filhão. - ele abriu a porta e Daniel viu sua mãe toda machucada e com as roupas rasgadas enquanto os seguranças andavam tranquilamente pela casa.

Mathias: Não tem pra onde correr, ratinho, A Dona nos deu permissão, você agora é nosso e só sai daqui num caixão. - e todos ali riram menos Regina que estava mais desacordada que consciente.

(Continua)

TEXTO E REVISÃO: Raphael Maitam

Seja bem-vindo para ler esse conto e mais outros no meu livro disponível no wattpad: https://www.wattpad.com/story/118616926-versos-por-aí-segundo-volume