Herdeiro (Final)

Elenco:

Daniel Camargo (Drummond)

Regina Peres / Leonardo Drummond

Zélia Drummond / Caleb Rodrigues

      Daniel então tomou consciência. Ele estava acordando mas sua visão era escura e as dores começavam a percorrer seu corpo junto a uma sensação de profundo desgosto. Enquanto abria os olhos vagarosamente, ele lembrara de sua última lembrança: sua mãe machucada ao chão de casa. Aquela lembrança aparecia em sua mente repetidas vezes até ele desejar despertar de fato e se livrar dali...porém ele percebe que estava deitado de lado e com os membros amarrados.

      Por estar sem os óculos, ele não enxergava muito bem toda a situação mas via duas pessoas metros a frente que estavam conversando a porta do quarto da piscina abaixo do casarão da velha Zélia Drummond. Pelo vestido azul claro em uma delas e o bigode no rosto do homem que ''vira e mexe'' olhava para encarar Daniel, só poderia ser Caleb. Então, o garoto resolveu apenas ouvir o que eles estavam falando.

Zélia: Não quero que ninguém chegue perto dela (Yolanda) entendeu?

Caleb: Senhora, e se ela realmente for para a delegacia, ela vai entregar tudo o que sabe.

Zélia: Ela não sabe nada! - respondeu meio raivosa - Minha filha só acha que todos vocês são sequestradores...é importante que você mande todos os capangas para fora daqui e mantenha as duas pragas presas aqui.

Caleb: Regina já está deitada no sofá e o garoto, mandei quem jogassem por ai. - eles então olharam para Daniel estirado no chão e o garoto rapidamente fechou os olhos.

Zélia: Ótimo... - ele parecia se afastar - Mas cá entre nós, me permite?

Caleb: O que, senhora?

Zélia: Como você pode amar alguém como a Regina...amar eu digo mas você não a ama, é somente obcecado por ela-

Caleb: Eu a amo sim, mas ela merece por tudo o que ela faz e já fez...não se lembra do Leonardo?

Zélia: Lembro sim... - havia melancolia no seu tom - Aquela víbora. - aquilo deu um aperto no coração de Daniel - Tão bem recebida no seio de minha família mas era mais uma golpista...

Caleb: Então a senhora concorda comigo mas eu a amo sim.

Zélia: Tanto faz, agora precisamos trazer todos as caixas com cadernos e os computadores para cá, antes que a policia resolva investigar.

      O som deles saindo e depois trancando a porta, entrava a dentro na cabeça de Daniel mas tudo o que ele parecia ter memorizado era a parte em que eles falaram sobre sua mãe Regina. Aquilo não parecia ser real e muito menos tinhas chances de ter acontecido. Todos esses anos os dois ficaram escondidos no casarão e tão maltratados por Zélia e os seus capangas. Daniel não podia levar os amigos para sua casa pois não poderia revelar onde morava.

      Daniel aproveitava a falta de quem o impedisse e tentava se soltar das amarras contudo parecia em vão, não é tão fácil quanto parece em filmes. Ele ouviu porém barulhos vindo do sofá azul que estava de costas para ele, ouvia também sussurros...o som era de sua mãe.

Regina: Daniel, Daniel - chamava bem baixinho como se estive sonhando.

Daniel: Mãe. - disse firme mas ainda baixo - Estou aqui.

Regina: Ah Daniel, meu filho. - leva alguns poucos segundos e Regina apareceu no campo de visão do garoto. - Estou aqui. - e mesmo mancando foi de encontro a ele.

Daniel: Mãe!

Regina: O que fizeram com você? Olha como você está.

Daniel: Vamos, tente cortar com a tesoura na gaveta do armário. - Regina ainda meio zonza mexia-se lentamente - Vai, antes que eles cheguem.

      Regina foi caminhando para o armário de ferramentas que ficava na sala, ao lado de enormes botijões guardados fora da cozinha. Depois de Daniel informar em qual gaveta, ela retorna e consegue cortas as amarras. Livre, ela dá um abraço apertado no filho.

Daniel: Mãe. - disse saindo do abraço - Preciso que me diga a verdade.

Regina: Filho, eu te amo, me desculpa. - as lágrimas desciam pelo seu rosto.

Daniel: Por que dizem que sequestraram o Leonardo?

Regina: Eles te machucaram? Oh meu Daniel, me desculpe por isso. - disse analisando cada pedaço do garoto.

Daniel: Vamos, diga! - disse num tom alto.

Regina: Você não pode acreditar nessas historias, são todas falsas, eu amei o Leonardo...assim como eu amo você. - respondeu enquanto chora copiosamente.

Daniel: Notícias da época dizem que espionavam ele e agora o caleb e a Zélia comentaram que você era uma golpista-

Regina: É mentira! Tudo mentira. - começou a aumentar a voz.

Daniel: Você sabe o que vai acontecer não sabe? Se não contar a verdade, vamos ter que ficar presos aqui eternamente ou planejar fugas que vão custar as nossas vidas...por favor. - e notou um arrependimento na face de sua mãe.

Regina: Tá bem...mas não sei se posso aguentar. - disse enxugando as lágrimas - Vou contar do meu jeito.

Daniel: Como assim?

      Então ela levantou-se e caminhou até a frente da piscina, ao olhar para trás, viu o semblante confuso de Daniel, então mergulhou. Ele chegou mais próximo para entender e sentou-se num banquinho a beira a piscina, a cabeça de Regina surgiu do outro lado porém estava de costas.

Regina: Bem, eu não sou essa que você conhece. Peres não é meu sobrenome e muito menos Regina. - ela deu uma risadinha - Nasci Verônica lá no Maranhão, meu sobrenome eu já nem lembro...não fazia questão de lembrar-

Daniel: Do que você está falando?

Regina: Eu já vou chegar lá...era uma dos 11 filhos de já nem me lembro quem...sei que quando fiz 16 e consegui fazer um caminhoneiro me trazer para o sudeste com ele...foram dias bem difíceis...a primeira vez que fui mulher de alguém. - seu tom era bem triste - Quando cheguei em São Paulo, eu já era ambiciosa, maldosa e gostosa. - riu - E você já pode imaginar, conheci pessoas, viajei o Brasil inteiro e até a Itália-

Daniel: Você era garota de programa?

Regina: Ah não não não, era mais que isso. Depois que conheci algumas pessoas, conheci aqueles que faria de alvo, que me envolveria e iria tirar proveito...nao era nada do tipo roubar fortunas e afins...quando resolvi fazer isso, chegamos aqui.

Daniel: Aqui como?

Regina: Aqui. - ela se virou e ficou cara a cara com o filho - Fiz muitos amigos que assim como eu, gostavam de entrar na vida dos outros e causar certa confusão. Numa noite, num bar em Goiás, meu amigo me apresentou o Leonardo. Não tinha como pegar o celular na época e dar um google para saber que aquele seria o herdeiro Drummond, mas após conversar com ele sem planos algum, nos envolvemos.

Daniel: Você o amou de verdade?

Regina: Não mas ele me amou de verdade até o fim. - o rosto de Daniel mostrava uma raiva - Semanas depois, muita conversa e muitas saídas, percebi que ele era o típico playboy assombrado pela fama, dinheiro e legado da família que vinha. Mas quando a irmã dele saiu numa manchete e ele pirou pois começou a falar mal da familia, eu liguei os pontos e soube que ele valia alguns bilhões...eu nunca nem soube que poderia existir algo além de milionário.

Daniel: E então, você o levou de volta pra família?

Regina: Sim, o convenci que se ele provasse que não queria saber de nada daquilo e que queria ter sua própria família, nós, a familia o deixaria em paz. Só que era tudo falso, tanto as minhas palavras quando a familia dele. A Zélia no caso, a Yolanda era so mais uma adolescente chata e ninguém da familia sabia do tráfico, além do Drummond pai ter morrido há tanto tempo já.

Daniel: Não sei pra que se juntar a isso, a família já tinha tanto dinheiro, pra que drogas e armas?

Regina: O poder corrompe você e o dinheiro compra sua alma. Leonardo era muito bom nos negócios, eu ficava fascinada como ele era criativo e ótimo para gerenciar. Quando eu fiquei grávida, ele quis parar mas eu o convenci a fechar os negocios e então fugiríamos para a Ásia.

Daniel: E então, o que aconteceu?

Regina: Descobriram, levam o Leonardo pra sempre e ficamos aqui.

Daniel: Chegamos ao ponto que tanto me assombra. Por que ficamos aqui? - disse com muita raiva na voz.

Regina: Zélia. - disse meio preocupada com a agressividade do filho - Ela descobriu sobre mim. Pagou para as pessoas que apresentei como amigos, para contarem a verdade sobre mim...que eu já fui tantas outras e fiz tantas coisas...implorei para que ela me permitisse ficar ao invés de me entregar a policia...eu ja estava prestes a dar a luz.

      A porta do quarto se abre e era Zélia com uma arma na mão, atrás dela estava Caleb.

Zélia: Agora, eu venho te trazer alguma escuridão.

       Depois que mirou, tudo o que se pode ouvir foram os tiros em Regina. Na piscina uma enorme mancha se alastrava e finalmente Daniel começava a gritar após uma repentina falta de voz gerado pelo choque momentâneo. O garoto caiu de joelho na borda da piscina, seus olhos nem piscavam para poder ver os olhos de Regina.

       Então vendo as pálpebras fechando e seu corpo já sem vida, Daniel por acaso olha para o lado onde Zélia estava jogada ao chão e Caleb de pé furioso enquanto mirava nela.

caleb: Eu disse que ela era o meu amor, eu te implorei tantas vezes.

      Zélia estava de olhos arregalados mas não tinha forças para dizer algo...Daniel continuava parado apenas assistindo sem saber o que fazer.

Caleb: Depois de todo esse tempo, acho que já esta na hora do ajudante assumir o trono não é mesmo?

Daniel: NÃO! - berrou - Não faz isso.

Caleb: Ah é? Por que não? Ela odeia você, ela matou o Leonardo, sua mãe e sabe sei lá quantas pessoas os negócios dela já não prejudicaram.

Zélia: Você não vai me matar, seu rato imundo. - e riu de desdém.

Caleb: Me dê uma prova antes que eu atire no seu rosto.

Zélia: Os negócios precisam de um rosto. Meus parceiros não vão fazer negócios com outra pessoa...você vai trazer a ruína de tudo que venho fazendo nos últimos 30 anos e haverão outros que vão se matar para chegar onde cheguei.

caleb: Tô cagando pra eles...e se eles precisarem de um rosto. - ele olhou para Daniel - Aprensento a eles... - e fez gesto de reverência com a outra mão - o herdeiro.

Daniel: Não posso ser herdeiro de ninguém, eu não pertenço a esse mundo sujo.

Caleb: Verdade, garoto. nem pra ser filho de sangue do Leonardo você serve. - então ele atira bem no rosto de Zélia - Mas ela não precisa saber disso, fica em segredo.

      Chocado, era como Daniel estava mas ela precisava fazer alguma coisa. No pulo que deu para cima de Caleb, o homem deu um tiro de raspão em seu ombro esquerdo. Então ele caiu ao chão enquanto caleb ria acima de seu bigode.

Caleb: Agora, garoto, a primeira lição que o papaizinho vai ensinar é: como destruir provas.

       Caleb mira em um daqueles enormes botijões no fundo da sala ao lado do armário da ferramentas.

Daniel: Não! Se você fizer isso é capaz do casarão despencar sobre nossas cabeças.

Caleb: E se eu não fizer, é capaz que venham atrás de nós. - então oferece a outra mão para o garoto e volta a mirar.

      A explosão projetou os dois homens para longe e incendiou todo o lugar alem de destruir cada objeto ali e fazendo tudo parecer que ia desmoronar. Havia sangue por todo o cômodo e tudo estava quebrado. Daniel estava caído ao chão sem forças alguma para se levantar, estava ferido no ombro esquerdo e na bacia direita. Estava acabado, destruído e tudo mais que pudesse lembrar. Em meio as chamas que estavam se alastravam por toda parte, ele viu Caleb se levantar e aproximar. O homem estava completamente destroçado e parecia só estar de pé justo a magia das trevas.

      Ele vendo que a arma de Caleb tanto quanto da já defunta Zélia estavam desaparecidas, precisava dar um jeito de parar o homem seja o invalidando ou matando. Apesar do homem ter dito que era seu pai, ele ainda era o causador de tantas dores que Daniel sentiu e viu sua mãe sentir. O fim de um deles dois precisava chegar. Num rompante, pegou um pedaço de concreto que tinha vergalhões expostos e resolve partir para cima de caleb.

       O homem que era mais experiente e estava bem menos machucado e cansado que Daniel, saia bem ao desviar e segurar o garoto.

Caleb: Como pode meu próprio filho me atacar assim? - diz desviando dele.

Daniel: Eu não sou seu filho. - disse se afastando e tomando fôlego.

Caleb: Claro que é! - respondeu alto pois havia agua jorrando alto.

Daniel: Eu não aceito que seja assim! - em seu rosto havia sangue, água e poeira.

Caleb: Mas foi assim que aconteceu e não basta querer ou não, já foi.

Daniel: Você amava a minha mãe?

Caleb: Ainda amo! - disse depois de alguns segundos - E viver sem ela vai ser a maior dor que vou carregar.

Daniel: Então se você sabia e amava, por que fez isso tudo?

Caleb: Eu nunca fui feliz, então nunca soube fazer o que era certo.

Daniel: Faça agora! - ele dizia se abaixando enquanto tudo desmoronava.

Caleb: Ali onde fica o registro de água. - e apontou para uma parede que parecia ter uma portinha desenhada - Tem um pequeníssimo corredor até os jardins. Ao sair pela porta de lá, você pode correr até se sentir seguro.

Daniel: E você?

Caleb: Eu vou depois.

      Reuniu todas as forças que ainda restavam e correu até a parede, observando atentamente, havia um pequeno vão para abrir a portinha. Ao abrir, ele viu o registro e o pequeno espaço para passar que Caleb contou. Se contorceu inteiro para entrar lá dentro enquanto ouvia cada vez mais altos os barulhos do casarão ruindo. ele rastejava tentando ser rápido mas não ouvia Caleb entrar pelo mesmo vão.

      Ao chegar próximo, a uma portinha gradeada e ver quão tarde da noite era, ele gritou por socorro e finalmente o casarão desmoronou.

...

      O garoto gritou por socorro até alguns bombeiros conseguirem abrir a portinhola e tirá-lo de lá. Ao sair, ele apenas via as paredes que antes era todas brancas, quebradas e cinzas de poeira. Até o jardim de plantas tropicais estava cheio de poeira. Havia muito fogo ao redor e todo tipo de gente ajudando a não alastrar pelas outras propriedades.

///

      Daniel ficou hospedado na casa de Marcos e recebia diariamente as visitas de seus amigos Pedro e Cecília. Mesmo nos interrogatórios, assim como para seus amigos, ele não mencionava a história de ser filho do Caleb mas para sua infelicidade, teve de confirmar o passado de sua mãe. O corpo das duas mulheres baleadas assim como o de Caleb, foram encontrados destroçados dias mais tarde. O local do casarão foi limpo e já assumido como herdeiro do filho desaparecido, ele e sua ''tia'' Yolanda resolveram fazer daquele, um centro de atividades e pólo de artes.

      O garoto que andava por ai e não importava para ninguém, que carregava suas mágoas e marcas que não incomodavam mais ninguém, agora precisava se esconder porquê todos os veículos de notícias, queriam saber a história do herdeiro da dona do trafico de armas e do narcotráfico de maior influência do pais. Que ao ter seus documentos avaliados, revelou nomes de empresários importantes, assassinatos e corrupção, nomes de políticos e afins. Agora ele carregava uma sombra assim como Leonardo Drummond carregou um dia...e assim como ele, precisaria ir para bem longe...

(P.s.: Daniel foi colocado na lista de Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, agora ele teria que ir para outro estado e desfazer os contatos com seus amigos e conhecidos, até que os antigos sócios de sua avó, resolvam parar de eprsiguí-lo)

TEXTO E REVISÃO: Raphael Maitam

(aguardem por Herdeiro 2 muito em breve!)

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