A PRAÇA DOS INVISÍVEIS  
  
   Quando Pedro saiu para dar uma volta na praça, percebeu algo incomum para uma noite de domingo, logo após a missa. Não havia quase ninguém passeando, conversando ou, simplesmente, sentado e observando o movimento na rua. Apenas dois senhores jogando dominó estavam ocupando um banco que ficava sob a luz de um poste. Pedro ficou observando tudo por mais alguns minutos. Estava imóvel e pensando sobre as hipóteses de não haver nenhum dos seus amigos naquele local: _Será que hoje é o aniversário de alguém e eu me esqueci?... Começou a caminhar pela praça, cabeça baixa e confusa, tentando processar uma avalanche de pensamentos sobre estes fatos tão estranhos, dos quais não lembrava se já tivera ocorrido outra vez.

    Ao passar pelos senhores que jogavam dominó, Pedro parou e falou:
   _Boa noite! Hoje tem tão pouca gente aqui na praça, né? O que será que aconteceu?
   _Pouca gente, meu filho?! Tá igual aos outros dias _ falou um dos senhores praticamente sem olhar para o rapaz enquanto fazia mais uma jogada.
   _Igual aos outros dias?! Tá bom! _disse Pedro deixando transparecer um certo sorriso de ironia, enquanto se afastava dos jogadores para sentar em um banco que estava adiante.
   Já fazia algum tempo que Pedro estava  imóvel e com um olhar fixo em algo que estava a sua frente. Na verdade ele não contemplava nenhuma objeto específico, mas encontrava-se totalmente entregue às imagens que vinham a sua mente sobre encontros e festas com os amigos, sempre combinados naquela praça. Estava refletindo sobre momentos de alegria. Alegria que sentia quando estava com a turma, numa tentativa de disfarçar a tristeza que sempre encontrava em seu lar através do pai alcoólatra. Passou a pensar nas diversas vezes em que teve que intervir nas discussões domésticas, quando o pai ameaçava bater em sua mãe. A dureza de tais lembranças foram interrompidas por uma suave música que saia de seu bolso. Era o celular que tocava.
   Pedro pegou o aparelho e visualizou o identificador de chamadas. Era Márcio que estava ligando.
   _Oi, Márcio! O que houve pra nem você nem a galera estar aqui na praça?
   _Eu ia te fazer a mesma pergunta _ respondeu o amigo. _Eu estou aqui na praça e não estou vendo ninguém.
   _Como assim? Você está aqui na praça? Onde? Não consigo vê-lo.
   _Estou aqui no banco perto da estátua do leão. _Respondeu Márcio.
   _Mas... o banco está vazio. Deixe de brincadeira! Onde você e os outros estão?
   _Estou falando sério! _afirmou o amigo. _ Estou aqui há mais de duas horas e também não vi ninguém.
   _Vou tentar ligar para o Fernando. Ontem, ele disse que estaria aqui neste horário, mas também não o vejo. Depois te ligo.
Pedro desligou o celular e rapidamente começou a buscar na agenda o número de Fernando. Mal levava o objeto ao ouvido e já ouvia uma reclamação.
   _Onde é que você está? Faz um bom tempo que estou aqui na praça e não aparece ninguém!
   _Você também está na praça? Onde? _perguntou Pedro, deixando escapar um sorriso que demonstrava muito mais um certo nervosismo do que um contentamento.
   _Estou. Bem aqui no primeiro banco à esquerda de quem sai da igreja.
   _Não consigo vê-lo. Estou no banco que fica ao lado dos senhores que estão jogando dominó. Você pode me ver?
   _Não. Que brincadeira é essa, Pedro?
   _Eu também não estou entendendo. Vou fazer um teste.
Pedro deu um grito tão alto, chamando pelo nome de Fernando, que os senhores do dominó viraram-se para ele com olhar de reprovação.
   _Você escutou o meu grito?
   _Escutei apenas pelo celular.
   _Que estranho! Como você não ouviu? Aliás, como você está aqui e eu não consigo ver? O Márcio também disse que está aqui. E também não consigo vê-lo. Como pode isso?!
   _Mas eu estou aqui. _ reiterou Fernando.

   _Só se...
    Pedro agora pensava em algo surreal que poderia ter sido tirado de um filme de ficção científica: a comunicação entre ele e os amigos acontecia apenas através do celular. Isso significava que não conseguiria mais vê-los, nem tocá-los, tampouco sair com o grupo que o animava e que o fazia esquecer os problemas de casa? Como suportar isso? Pedro começou a perceber que a sua vida estava se tornando muito mais virtual do que real. O seu conforto acontecia muito mais através das redes sociais do que nos reais encontros com os amigos. Todos eram assim: saiam juntos, mas não largavam o celular. Quase toda a comunicação acontecia através de mensagens no whatsapp. Não havia mais tanta conversa olho no olho. Então, por que ele, Márcio e Fernando pareciam tão assustados por não conseguirem mais qualquer contato sem o uso do celular? Era algo que já vinha acontecendo há algum tempo. Pedro estava com o corpo paralisado, imerso em seus pensamentos quando, por distração, deixou cair o celular o quebrando em pedaços. Tomou um susto, baixou o olhar para ver o tamanho do estrago e não lamentou muito. Lentamente, levantou a cabeça e pode ver os dois amigos sentados, um em cada lado da praça.