MISTÉRIO NO RIO AMAZONAS

A princípio fiquei totalmente cético quando o velho de cento e um anos me contou. Só podia ser coisa de quem caducou pela idade, já está demente em virtude do mesmo motivo ou, também devido a tantos anos de vida, viaja na maionese da insana imaginação. Ele confidenciou que daria a mim a tal extraordinária informação porque viu em meus olhos algo que lhe causou calafrios, pois antes ao longo de seus muitos anos de vida nunca enxergara tanta profundidade.

Naturalmente não alcancei o real sentido dessa observação, preferi calar a respeito e ouvir seus devaneios. Foi então que me surpreendi com a amplitude da criatividade do velho. Ou sua loucura, caduquice, esse tipo de coisa. Ao terminar ele arrematou: " se um dia você for ao interior do Amazonas, vá no mês de julho, dia trinta do mês, só nesse dia, alugue um barco e navegue o mais longe possível, já perto do estuário. É lá que vai acontecer.

Ri da ingenuidade do velho e segui meu caminho. Entretanto, quando o destino brinca com a alma de alguém através de fantasias inusitadas tudo conspira e planeja para a realização de seus planos. Eu já tinha esquecido da história do pobre velhinho quando a empresa onde trabalho precisou enviar alguém a Manaus, e o escolhido para representa-la e resolver negócios empresariais. Viajei no dia vinte e oito de julho, preferindo não declarar o ano por motivo de foro íntimo.

No dia trinta de julho daquele ano, solucionadas as pendências empresariais, tive o dia de folga para passear. Durante o passeio fui ao porto da cidade. No local, abordado por um senhor de seus sessenta e poucos anos, tudo que o idoso de mais de cem anos me contou veio à tona. Naquele instante, quem sentiu o calafrio fui eu. Ele veio até mim e falou: " O senhor quer ver a casa? É hoje, somente hoje."

Quem era ele e como sabia da casa e do dia exato para tudo se realizar? Aquilo tudo pareceu tão estranho, mas de igual modo extraordinário, que aceitei o convite e entrei no barco dele. Só nós dois. Embora movido por aventuras, por dentro eu suava de medo, porém decidi não deixar transparecer. O silêncio imperou durante a viagem no rio, e aos poucos nos afastamos de qualquer sinal de civilização.

Num lugar ermo do gigantesco rio, o homem parou o barco, olhou o relógio, sorriu para mim e garantiu: " Vai acontecer daqui a vinte minutos." Meu coração acelerou as batidas, a ansiedade tomou conta de mim, eu suava e ainda permanecia meio incrédulo apesar das coincidências inexplicáveis. Passados os vinte exatos minutos, o barqueiro gritou para eu olhar na direção por ele apontada. Olhei. E, pasmo, vi surgir do fundo do rio uma casa de boas proporções, relativamente nova e...que viagem! Quando a casa emergiu por inteiro, meus olhos parados na cena, sem piscar, uma mulher surgiu na janela, duas crianças saíram para a varanda brincando e um homem segurando um anzol sentou numa cadeira e começou a pescar.

Eles davam a nítida impressão de não nos ver, mostravam-se alheios à nossa presença, apenas viviam como se protagonizassem uma cena banal e bucólica dos ribeirinhos da Amazônia. Eu ria, chorava, arrancava meus cabelos, pulava, rangia os dentes e assistia a algo sobrenatural que beirava qualquer alucinação. A cena durou apenas dois minutos, após o quê, sob minha perplexidade, a mulher fechou a janela, as crianças entraram na casa acompanhada do homem que pescava, fecharam tudo e a casa lentamente começou a afundar. Até desaparecer completamente.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 05/03/2023
Código do texto: T7733130
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