Meus lábios estão cerrados

[Continuação de "Noctâmbulo"]

Viktor Fábián não manifestou surpresa quando Attila Márton, o editor-chefe do "Kalotúr Sztárja", declinou o motivo pelo qual o havia chamado para uma conversa reservada em sua sala.

- Sua mãe acaba de ser presa pela polícia; o capitão Pataki me ligou e pediu que lhe avisasse.

- Eu compreendo - assentiu Fábián. - Qual é a acusação?

- Ser cúmplice do maníaco da floresta. Encontraram inclusive o Volkswagen bege escondido numa estrebaria.

- Mas não o maníaco, imagino - ponderou Fábián, muito calmo.

- Aparentemente fugiu da propriedade, mas a polícia encontrou sinais de que alguém viveu num dos alojamentos dos empregados por um extenso período de tempo... semanas, no mínimo. Seria impossível que sua mãe não soubesse da existência dele.

- Esse era o verdadeiro motivo pelo qual ela não queria vir para a cidade - refletiu Fábián. - Não tinha receio de ser a próxima vítima do assassino, já que estava lhe dando cobertura.

- Quando começou a suspeitar dela? - Questionou Márton.

- Faz algum tempo, desde que ela comentou que iria contratar alguém para limpar a propriedade. Ela poderia ter chamado gente daqui, mas foi até Töröklas porque disse que não queria bisbilhoteiros no terreno dos Rosinger.

- Gente de Töröklas não acharia estranho caso vissem um desconhecido na propriedade - avaliou Márton.

- Precisamente. Difícil vai ser achar quem eram esses trabalhadores, já que ela deve ter pago em dinheiro vivo e certamente não fez um contrato.

- A polícia vai interrogá-la - redarguiu o editor-chefe.

- Conheço minha mãe, não vão arrancar nada dela - afirmou Fábián. - Mesmo se os cavalheiros do Volga preto voltassem, duvido que conseguissem uma confissão.

- Ela não vai ser acusada de assassinato - disse Márton.

- Naturalmente. Disso ela não é culpada; mas pode ter servido de isca para atrair as duas mulheres assassinadas, e tenho quase certeza de que o fez.

- Por quê? - Questionou Márton.

Fábián suspirou.

- Eu não sou psicólogo, mas acho que minha mãe nunca se conformou em ser apenas mais uma entre muitas. Ela queria ser única. Talvez o primeiro passo para isso fosse se ver livre das "cópias", mulheres que se pareciam com ela. Creio que conseguiu o que queria.

Márton encarou o subordinado com simpatia.

- Eu não vou exigir que escreva uma matéria sobre a prisão da sua própria mãe.

Fábián deu de ombros.

- É um trabalho como outro qualquer. Talvez seja melhor que eu mesmo o faça, para que não paire nenhuma dúvida sobre minha isenção.

- Está bem, se isso o faz sentir-se melhor... - aquiesceu Márton.

* * *

Naquela noite, quando Fábián chegou em casa, a mulher o abraçou ao entrar. Com a cabeça no ombro dele, ela perguntou:

- Acredita mesmo que sua mãe não vai revelar a identidade do criminoso?

- Minha mãe sempre soube guardar segredos - redarguiu Fábián. - Isso a fez sobreviver à Cruz Flechada, aos nazistas e agora aos comunistas.

- Ela provavelmente nunca sairá da cadeia com vida - ponderou a esposa.

- Minha mãe se preparou para isso durante todos os anos em que passou reclusa na mansão dos Rosinger - replicou Fábián. - A prisão agora será um mero seguimento.

E antes de sair do abraço da mulher, consultou o relógio de pulso e declarou:

- Quase hora do programa da Dorka Bognár. Agora, totalmente sem concorrentes.

- [17-07-2023]