Paciente sob ataque

As notícias que o médico tinha para Alys naquela manhã não eram nada boas. Após fazer a ronda pela enfermaria pediátrica e verificar os sinais vitais da pequena Layla, comunicou à mãe que a criança teria que voltar para a UTI.

- Ainda não sei a que atribuir isso, mas Layla teve uma piora significativa nas últimas horas. Melhor que ela fique na UTI, onde poderemos monitorá-la 24 horas por dia.

- Mas doutor... - começou a dizer Alys. Na UTI não poderia ficar ao lado da filha, uma perspectiva muito dura para quem já começara a planejar o regresso ao lar.

- Imagino como se sente, mas vai ser realmente necessário - atalhou o médico, fazendo sinal para uma enfermeira:

- Iwan, providencie um maqueiro para levar Layla de volta à UTI.

- Sim, doutor - respondeu a interpelada, saindo da enfermaria.

O médico mudou o foco de atenção para outras crianças da enfermaria. Todos os leitos estavam ocupados, o vírus que estava causando aquela epidemia atacava primordialmente crianças, as levando a óbito em poucos dias se o tratamento não fosse iniciado logo nos primeiros sintomas. Não era este o caso de Layla, já que a mãe procurara isolar a criança logo que o governo baixara uma determinação para evitar aglomerações e buscara atendimento imediato; mas uma vacina ainda não havia sido encontrada, e pioras eventuais não estavam descartadas, mesmo com o melhor tratamento existente na atualidade.

- Eu realmente não sei o que dizer - disse desconsolada ao ligar para o marido, que estava no trabalho. - Ontem à noite Layla parecia bem melhor, a enfermeira até me assegurou que ela poderia receber alta agora pela manhã... e no entanto...

- Calma, Alys, não vamos nos desesperar - tentou acalmá-la o marido. - A febre voltou?

- Sim, foi por isso que o médico resolveu interná-la novamente na UTI - explicou Alys. - Pelo que entendi do protocolo que estão usando, ela não deveria ter mais febre depois de iniciado o tratamento.

O que nenhum dos dois teve coragem de dizer ao outro, é que o vírus sofria mutações contínuas. E que uma dessas variantes poderia ter se tornado imune à medicação ora em uso.

- Eles vão aumentar a dosagem e Layla vai se recuperar - afirmou o pai tentando soar otimista. - Provavelmente, amanhã ela estará de volta à enfermaria.

- Que a Deusa nos proteja e sustente - murmurou Alys, antes de desligar.

* * *

Harri Shah retirou o jaleco contaminado antes de entrar na sala de reuniões, onde duas de suas colegas de hierarquia mais alta na administração hospitalar o aguardavam.

- E então, doutor Shah? - Indagou a superintendente Dunn, que ocupava a cabeceira da mesa de reuniões.

- Dra. Dunn... Dra. Harvey... mandei os resultados da análise de radiância para os seus e-mails - declarou o pediatra.

A outra médica fez um aceno de cabeça em saudação. Shah sentou-se a três cadeiras de distância das colegas, enquanto ambas consultavam as telas dos terminais de computador diante delas.

- Sim, percebo... - disse finalmente a Dra. Harvey. - Ocorreu somente com a paciente Layla Clark?

- Até o momento sim, mas estamos alertas para a eventualidade do fenômeno se repetir - declarou Shah.

- Isso é absolutamente inusitado - ponderou a superintendente, ajeitando os óculos no rosto e encarando o pediatra. - Tivemos um pico de Ressonância dentro da enfermaria pediátrica?

- Sim senhora - assentiu Shah. - O nível foi alto demais, mesmo para os padrões militares usuais. E eles foram avisados, segundo determina o protocolo.

- Um ataque direcionado - comentou a Dra. Harvey.

- Especificamente para Layla Clark - corroborou Shah.

- Mas por que ela? - Questionou a superintendente. - Isso não faz o menor sentido!

- Alguém criou um vínculo com a paciente - resumiu Shah. - E, pelo que podem verificar, é externo à nossa realidade.

- Podemos descobrir de onde partiu o ataque... e, o mais importante, o que faremos para impedir que outros ocorram? Já temos esse vírus mortal para nos preocuparmos, não custa lembrar - disse a Dra. Harvey com expressão cansada.

- Os militares sugeriram que o vínculo não seja rompido - redarguiu Shah. - Até para que saibamos o que o agressor deseja.

- Isso pode e está colocando a vida da paciente em perigo - a Dra. Harvey franziu a testa.

- Sei disso, senhora; - assentiu Shah - fiz um protesto formal, mas ainda assim os militares mandaram instalar monitores de radiância dentro da UTI. A ideia é determinar a origem do vínculo enquanto cuidamos da paciente.

- Outras crianças podem estar em perigo - suspirou a superintendente.

- Precisamente, senhora - redarguiu Shah.

- [27-11-2023]