O NATAL DO MENINO LOCUTOR E O PROGRAMA "QUINTAL DA GLOBO"


Era uma manhã do mês de abril, o cheiro da terra molhada aos poucos se desfazia com os pingos finos, transparente e cristalizado de mais um dia chuvoso no povoado Sambaíba, município de Caxias, Estado do Maranhão. Adiante, um infante com idade de doze anos que atende pelo nome de "Pedin", observa através da janela, o chuvisco caindo no terreiro. É a marca deixada na terra seca com o cheiro da terra molhada que invade o sertão entre as casas.
O menino com o olhar esperançoso, aguarda apreensivo o tempo passar, esticando o braço e aparando as gotas que caem pelas palhas de babaçu que cobrem a casinha de taipa naquele pobre sertão. Sem demora, o guri se debruça à janela, e nota a galinha no terreiro correndo atrás das mariposas que enfeitam o céu com revoadas. E o vento penetra entre as palmeiras esmeraldinas que se retorcem no balançar brilhante e tão belo da manhã chuvosa.
 
Ainda com o céu escuro, apontando no horizonte as camadas negras de nuvens, estas, indicavam o continuísmo das chuvas por várias horas naquela região. O boy fixado naquele ponto estratégico analisava a chuva, e de imediato, o menino desce e se apoia com os braços na janela, curvando a cabeça sobre as mãos, avaliando as águas que caem das imensas nuvens e escorregam na biqueira da casinha. Os anfíbios saem em plena festa e euforia na beira das poças d’água. Centenas de sapos se espalham e perseguem as mariposas e demais insetos.
Como é sabido, as irregularidades das chuvas que ocorrem na zona rural do município, às vezes, o cabra reza e faz solicitações a São Pedro, aspirando que o volume de águas possa ser bem distribuído nas áreas corrosivas do capoeirão nordestino.

Se há grandes cheias, o inverno será de fartura nas mesas de cada sertanejo agricultor como também nas plantações inteiras que se apodrecem ou são arrastadas pelas correntezas valentes. E nestes termos, flexionando a meditação, o homem do campo pede com fé em Deus. Com os olhos virados nos horizontes, torcendo para que o inverno seja proveitoso em toda cobertura vegetal já cansada pelo desgaste do tempo e encharcada no raso dos lamaçais dos caminhos de barro amarelo, estreitos e tortos do inverno.

É naquele pedaço de terra, onde o miúdo se sentia um rei sem qualquer estrela. Era uma majestade nas folhagens do sertão. O nome do garoto Pedro, repercutia por toda a vizinhança com a alcunha de “Pedin”, apesar da pouca idade, este, já compreendia o desenrolar da vida e as circunstâncias daquele cotidiano caótico.

Na frente das imaginações, ali, permanecia a figura de seu pai, conhecido como Severino da Sambaíba. Dito homem do campo com trinta e cinco anos, forte e com estatura mediana, laborando na lavoura com expectativa de encontrar uma boa oportunidade de sobrevivência.
Na outra banda da casa, lateral da porta da cozinha, estava com um pano na cabeça de cor branca em forma de rosca, tipo rudia. Era a Dona Sebastiana, mulher de fibra e grande guerreira, simples nos trajes do cotidiano, decidida e dona de si. Com seus trinta e dois anos, embora, preparando com os olhos cansados da velha labuta o almoço, a sua preocupação era constante no abrir da aurora com o bem-te-vi cantando nas galhas das árvores. O tempo extravagante com a chuva fina continuava por toda a manhã, caindo no solo rochoso avermelhado da terra dos cocais. A seguir, o pai vislumbrando a presença do filho, e ao perceber o menino na janela, reclama:

-Sai dessa janela Pedin, não está vendo que tu vai acabar derrubando.

-Já vou pai, estou só olhando a chuva passar. Disse o garoto permanecendo no local, momento em que Severino fala em bom tom.

-Rapaz tu é teimoso demais. Já falei mais de uma vez, e não falo mais. Por último, eu vou lhe dá umas lapadas de cinturão. Ora essa! Onde já se viu um menino malino desse jeito. Não tá vendo que a janela não te aguenta. Ela se quebra.


O guri se retirou da janela obedecendo as ordens do pai, vez que a janela era construída de talos de buriti e consequentemente, não aguentava o peso do travesso. E as horas se arrastam com o tempo nublado e os pingos que caem da chuvinha realçam um dia maravilhoso por todo o capoeirão. Sem demora, Dona Sebastiana põe o almoço à mesa e chama o menino e o pai. Enquanto almoçam na pequeníssima mesa da sala, o menino reclama à sua mãe:

-Mãe! Todo dia só fazem feijão. Tô abusado disso. Lá no senhor Raimundin teve carne hoje. Por que a senhora não comprou?

A mãe agoniada responde:

-Se o teu pai não tem dinheiro o que há de se fazer além do feijão?

Disse Sebastiana, pegando um copo com água no pote.
Novamente o meninote indaga:

-Mãe! A senhora devia comprar fiado. Tô abusado de comer feijão. Por que a senhora não fez um ovo estrelado pra mim?

A mulher tenta se explicar ao filho, e diz:

-Meu filho! As galinhas estão todas chocas. Como é que eu posso te dá um ovo desse jeito com elas deitadas?

-Sei não mãe. Na birosca da Candinha tem ovo de granja pra vender. É só pegar lá e pronto.

Irrequieta com as expressões do filho, a mãe retruca:

-Olha! Eu só não te digo uma coisa porque o teu pai tá almoçando. Se não tem dinheiro como é que eu vou comprar fiado. E depois, ela tá na minha porta de manhã bem cedo cobrando. E disso eu não gosto.

O pai complementou e disse ao filho:

-É verdade Pedin. Eu não suporto cobrança no batente da minha porta. Se não tem carne é feijão mesmo até rachar.

-Mais pai, ela vem é porque o senhor não paga. Se o senhor pagasse em dia, ela não viria aqui lhe cobrar. Disso eu tenho certeza. Podes crer!

Irresignado, ele argumenta:

-Por isso mesmo é que eu não compro fiado nem na lua.

Insatisfeito com a opinião, o menino interroga:

-Tá bem pai. E como o senhor compra cigarro US e cachaça fiado no Pé-Sujo do Ribinha?

Severino já bastante irritado responde:

-Rapaz agora tu quer dá definição da minha vida. É? Tu não tem o que perguntar não? Tu não tem mais o que fazer não? Por que tu não vai pegar os teus livros pra ser gente um dia. Em vez de tá perguntado besteira. Tá sendo besta por aí como locutor.Olha mulher! A vida dele agora é ficar falando sozinho debaixo das palmeiras com um pedaço de pau querendo ser propagandista ou locutor. Você devia prestar mais atenção nisto. E não deixar ele querer falar de mim.

O menino permaneceu calado, retorcendo a cabeça para o lado enquanto a mãe dizia:

-Pedin, conversa de gente grande menino não se mete. Tá vendo como são as coisas.

-Mãe, um dia eu vou crescer e vou ganhar dinheiro. Fique sabendo que eu não vou comer só feijão com arroz. Só vou comer coisa boa, só comida de rico, e na minha casa não vai faltar carne.

A mãe sorrindo indaga:

-Quando será isso? Ah meu filho cê tem que estudar muito pra ter tudo isso!

Com insistência, Pedin argumenta agitado:

-Sim, mais na casa do Fernando lá pelo menos eles comem um dia carne no outro peixe e no domingo eles compram carne de porco. Aqui é tudo o contrário, só feijão, feijão, feijão e mais nada. Nem um ovinho pra mim a senhora não guarda mais. Antigamente a senhora guardava uns ovinhos no petisqueiro.

-Agora tu só fala em ovo de galinha, né? Tu não tem o que pensar não? Só fala besteira. Tá vendo que aqui não tem ovo. Ovo mesmo só se for o do teu pai.

Sorriu a mulher. E o menino zangado empurrou o prato para o centro da mesa, e foi sentar debaixo do pé de faveira no terreiro da casinha.

Com os olhos firmes na esposa, Severino reclama:

-Oras bolas! Esse menino não sabe agüentar o repuxo. Hum... A vida é uma roda de bicicleta, rapaz, tanto roda que se arrebenta. Se eles comem carne todo dia, é por que adoram comprar fiado e não pagar o alheio. Esse menino inventa cada uma, e gosta de baralhar as coisas. Se eles comem carne é sinal de que vivem de derrubar as árvores nos terrenos alheios pra fazer caieira e vender carvão. Quem sabe, um dia o IBAMA pegam eles, e aí eu quero ver eles comerem carne.

Disse ela ainda comentando sobre o filho:

- A cada dia esse moleque cria uma moda. De manhã fala que não quer tomar café, Só se for com leite. Eu já não sei o que mais fazer. Tá bom de levar uma pisa de tamarindo seco, só assim ele entende as coisas.

Concluiu o esposo sentado à mesa:

-Mulher se parar a chuva, eu vou juntar umas coivaras na roça.

-Não se esqueça de trazer a minha cabaça que cê deixou no meio da roça.

-Tá, eu vou trazer.

A VIAGEM

As conseqüências que pairam na família de pouca renda, é o assoalho mais contundente a elevar nas sensações das aventuras de um pôr do sol desagradável na contemporaneidade. As eras se apressam e o clima subtropical desaconselha o homem camponês a conviver com as lembranças de um velho sertão. Na salinha da casinha de barro batido, o calendário marcava o mês de fevereiro de 2007. Uma alegria embriagada na tristeza fazia o soluço dos olhares, tangendo na margem de cada lábio a contração que envolvia o coração de quem partia e de quem ficava. Uma oportunidade de trabalho havia surgido através de um “gato” que combinara com Severino da Sambaíba o conteúdo contratual para o Estado do Pará. Apesar que as condições do laço familiar se tornara angustiante com as dificuldades apresentadas naquela vivência, e que somente o dinheiro e o trabalho eram capazes de enfeitiçar o homem do campo, cujas promessas mexiam e fervilhavam numa perspectiva otimizada à família. E nesse momento, Severino se despede da mulher e filho, ainda na porta da casa com a mochila nas costas, diz à mulher:

-Bastiana, Ainda que tu não acredita no meu amorm, eu te amo. E vou ganhar muito dinheiro no Pará. Aqui já deu o que tinha de dá. Olha, assim que eu chegar lá, eu mando recado por qualquer portador conhecido. O arroz da roça dá pra passar um ano e o feijão também. Chegando lá, eu mando logo dinheiro.

O rosto sofrido e penalizado da mulher, não se conteve e abraça o marido e diz:

-Também te amo. Sei que vou sofrer muito sem a sua presença. Cê nunca viajou pra longe. Eu não sei por que a vida é tão ruim dessa forma, afastando cê de mim. Mais Deus é conosco e vai abençoar a todos. Olha rapaz tu anda direito nas terras alheias. Não vai te apaixonar por qualquer guenga que tu vê. Homem gosta de rabo de saia, e tu eu sei quem tu é. Tome cuidado e reze antes de deitar.

O menino Pedin, não suportando a dor que bate nos olhos, desmancha-se em lágrimas caindo na meiga face do guri, abraçando o pai, ele diz:

-Pai, quando o senhor ganhar dinheiro por lá, mande um radinho de pilha pra mim e uma bicicleta, será o meu presente de natal. Será que o senhor vai esquecer? E não se esqueça de mandar também uma fita da Tribo de Jah com o reggae na Estrada. Olha pai! Toda vez que tocar, eu vou está lembrando com mais força do senhor.

-Sim filho. Tudo vai depender quando eu chegar lá. De imediato não dá pra comprar, quem sabe pelo natal eu já tenha condições de lhe dá. Eita Pedin danado. Mais tu gosta dessa Tribo e desse tal reggae. Eu também não posso esquecer. Vou me lembrar de todas as noites quando eu estiver lá, principalmente do programa Quintal da Globo lá casa da das Neves.

Após, o guri limpar os olhos com a ponta da camisa, faz um apelo ao pai:

-Verdade pai. Eu também vou lembrar demais. O senhor é o melhor pai do mundo. Mas, por favor, não vá fumar e nem beber. O senhor sabe que um homem não conhece a sua alma quando ele está bêbado. Pense em nós aqui que estaremos pensando no senhor, seja de dia ou de noite, eu não vou deixar de pensar no senhor. O senhor pode está em todos os lugares, eu não vou para de pensar nem um minuto no senhor.

-Tá bom! Pare com isso Pedin, tá feito um truão. Quando eu tinha a tua idade eu já era gente. Tá querendo me ensinar as coisas da vida. É? E quanto a fita kassete, vou me lembrar de comprar por lá. Eu também quando ouvir o reggae na Estrada, vou me lembrar de você de montão. E quero que seja atencioso e faça tudo direitinho pra sua mãe.

-Não pai. É que eu desejo o melhor pro senhor. Se o senhor não beber e nem fumar, o senhor não gasta dinheiro e nem fica embebedado. Assim o senhor vai ter dinheiro que sobra. Pai não me deixe sozinho, pra onde o senhor for, eu vou com o senhor sem sair daqui. Vou pensar todas as noites no senhor.

A mãe interpela o filho:

-Filho deixa de falar coisas pro teu pai. Ele sabe muito bem o que faz. Olha Severino, cuidado com o frito de galinha e o bolo de puba para não virar bagunça dentro da bolsa.

-Tá bom mulher.

Disse o menino:

-Bênção pai!

Segurando a mão direita, Severino da Sambaíba, afirma:

-Deus te dê fortuna e juízo!

-Amém

Com um abraço caloroso, partiu Severino guiando-se pela estrada vicinal entre as folhagens de babaçu até a Rodoviária conhecida nos povoados com o nome do ex deputado federal “Rodoviária do Paulo Marinho” localizada na cidade de Caxias (MA). Após um mês, o menino sentado no terreiro da casinha de palha, indaga à mãe:

-Mãe! Por que o pai ainda não deu notícias? O que terá acontecido com ele?

-Não sei filho, mais já era pra ele ter dado notícias. Tem noite que não durmo preocupada.

-Mãe, eu quero lhe pedir uma coisa.

-O que tu quer pedir. Fala. Fala com a boca e deixa de ficar mordendo o beiço.

-Mãe! Na boca da noite, eu quero ir na casa da Dona das Neves.

Insatisfeita com o pedido responde:

-Não é pra sair daqui de jeito algum.

-Poxa! O pai sempre deixou. E como vou ouvir o programa de radio na casa dela com os meninos. Mãe! Eu queria tanto ouvir o Quintal da Globo. Olhe! Antes das dez, eu prometo que chego. Na verdade, a senhora não tem condições de comprar um radinho de pilha pra mim.

Respondeu Dona Sebastiana:

-O seu pai não lhe disse que vai mandar um pro cê?

-Sim, mais quando? Até agora ele não mandou notícias e nem dinheiro. Mãe, se eu tivesse sido aprovado na bolsa família, eu já teria comprado o meu rádio. Se for assim, tenho que fazer a coleta de coco, quebrar e vender. Sabe? Com o dinheiro do coco babaçu eu ajunto e compro um radio no camelô de primeira. Novinho em folha!

-Tá bom Pedin. Também não sei por que até hoje eles dizem que você não foi aprovado na bolsa família. Tanta gente na cidade tem bolsa família e não sei que diabos acontece por lá.

-Mãe! Será que alguém tá recebendo o meu dinheiro no meu lugar? O Joãozinho da Dona Lulu que mora no Baixão Grande, ele estuda comigo, é da minha idade e já recebe há mais de um ano a bolsa família. Por que eles só dizem que o meu nome não foi aprovado? Eles não mostram os papéis onde diz tudo isso. Eu não acredito, aí tem rolo pra chuchu.

-Pedin, escreve pro Lula e diz tudo isso que tu tá falando. Eu sei que uma carta de um garoto pobre, ele vai ler com atenção, basta escrever.

-Mãe, eu tenho medo que alguém faça alguma coisa contra nós. Esse povo da cidade que vive à custa dos outros são desumanos, eles roubam, matam e são corruptos e nós somos pobres. Não podemos lutar contra eles. Se alguém vive da minha bolsa família, deixe quieto. Deus não vai nos abandonar por falta disso. Eu sei que faz falta, mais o que há de fazer, o jeito é a gente trabalhar mais e mais com a luz do sol.

A conversa se prolonga, e Dona Sebastiana diz:

-Vá dormir filho, já é tarde e apague a luz da lamparina pra não gastar todo o querosene.

O menino obedeceu, e sonhou com o novo rádio de pilha, adormecendo na rede listrada de cor azul e vermelha em diagonais. Após três semanas, acordando cedo e juntando os cocos debaixo das palmeiras, o moleque já havia quebrado mais de noventa quilos de amêndoas de babaçu, e levando nos finais de semana na venda do senhor Xavier que fica nas proximidades da localidade do “Teso Duro” no bairro carente da cidade de Caxias. Ali, ele vendeu toda a mercadoria e recebeu o dinheiro com satisfação. Tudo se transformava num momento prazeroso do pequeno Pedin que quebrava os cocos com uma velocidade incrível, simplesmente para alcançar uma aspiração.

Todos os dias, debaixo da palmeira de palhas longas e verdes, o vento assoprava no império verdejante de cocais, e o bem-te-vi cantava em bom tom a sua melodia. Enquanto isso, o guri sentado no chão, com uma perna afirmando o machado afiado, lascava o porrete seguro na mão direita contra o coco na lâmina do machado, e com a mão esquerda, abria ao meio, assim, repetia em melhores ângulos para a retirada das amêndoas. O tempo passava e o miúdo cantava a sua melodia preferida na maior floresta de cocais com a melodia da Tribo de Jah no seguinte estilo:

“Vivendo como nômade, rolando o reggae mundo afora
Correndo o corpo do planeta enquanto o tempo nos devora
Viajando sem fronteiras, pela estrada, pelos ares
Cruzando as tribos regueiras de todos os lugares
Tarde de chuva breve, bruma sobre os montes
Caminho em curvas, cheiro verde, vista extasiante
Noite de lua, céu cintilante
A lua seminua acentua a sensação de estar distante
Eu não consigo parar de pensar
Na hora de te ver, na hora de chegar
Eu gosto do jeito que você mexe e você faz

REFRÃO

Quando “cê” dança e se balança o seu jeitinho é demais
Não importa o que dizem, o que podem pensar
Quero estar com você em todo lugar
Rio-Bahia, Criciúma, Vitória ou Guarapari
Pode ser no Japão ou então no Havaí
Caribe, Califórnia, Canadá ou Cariri
Além do horizonte, pra lá de logo ali
Manhã de tons azuis seduz a começar de novo
Jah é a luz que me conduz, a música meu consolo
Coração em fuga seguindo em nova viagem
O reggae envolve e muda, com a velocidade, a paisagem
Eu não consigo parar de pensar na hora de te ver na hora de chegar
Eu gosto do jeito que você meche você faz
Quando cê dança ,e se balança esse jeitinho é demais
Não importa o que dizem, o que podem pensar
Quero estar com você em todo lugar
Belém-Brasília, Buenos Aires, Bali, Sampa ou São Luiz
Em Cayena ou Macapá em Londres ou Paris
Descendo a serra, seguindo o litoral
No sertão ou no cerrado, Planalto Central”.


Numa certa manhã de sábado, não demorou muito, o garoto já abria um sorriso pelas veredas com o novo radinho de pilha que havia comprado. A felicidade estampava por todos os lados e nos olhos do guri brilhava com chamas incalculáveis de alegrias. Ao chegar na residência com o radio, comentou com a mãe:

-Olhe aí mãe, comprei o meu radinho. Veja como é lindo. Agora eu vou curtir à bessa o Quintal da Globo todas às noites. Quem sabe eu não ouço o pai falando comigo e pedindo a minha pedra de responsa ou dando um alô pra nós. Eu acredito no que ele pode fazer por mim.

-Mais você é besta mesmo menino. Tá vendo que teu pai nas matas do Pará vai se lembrar do Quintal da Globo.

-Mãe! A senhora tá por fora de tudo. O locutor do Quintal da Globo é o Marcus Aurélio. Ele é da Rede Globo e é muito conhecido pra chuchu. O cara é massa, Mãe! Ele é ouvido em todo o Brasil. Pra mim é o melhor locutor do mundo. A senhora precisa ouvir o programa dele, a voz dele mexe com a cabeça da gente, oferece músicas pra os ouvintes, fala bem e seguro com todo mundo. O cara é massa. Ele é dez! Hoje à noite a senhora vai adorar ouvindo o Quintal da Globo com Marcus Aurélio, meu amigo.

-Você já está com suas besteiras novamente. Como ele é teu amigo se ele não te conhece e nunca te viu. Aliás, jamais falou contigo?

-Tá vendo como a senhora é? O cara é meu amigo demais, mãe. Não precisa ele me conhecer, Basta eu ser ouvinte dele. Ele manda um abraço pra todos os seus ouvintes. É só isso. Se aqui em casa tivesse telefone, eu falaria com ele todos os dias no ar, e mandava um alô pra senhora e pro pai. Quando ouço o programa dele na casa de Dona das Neves, o pessoal telefona, manda recados e ainda pede músicas e a gente fica só ouvindo.

-Ó meu filho cê tá sonhando demais. Cuidado pra não cair da rede.

-Que nada mãe. O mais difícil eu já comprei. Agora, só vai dá o Quintal da Globo com Marcus Aurélio, o meu locutor preferido. E amanhã, eu vou escrever uma carta pra ele pedindo notícias do pai pra colocar no ar, e também vou pedir pra rodar a minha música “Reggae na Estrada com a Tribo de Jah. A senhora vai ouvir ele falando no ar pra todo mundo escutar. Pense numa coisa boa! Ele falando desse jeitinho: “Pedin meu amigo da Sambaíba, ouça a sua pedra de responsa”. Olha mãe! Eu juro por Deus que isto um dia vai acontecer e a senhora vai ouvir.

Sem demora, o pequeno garoto do sertão escreve uma carta endereçada ao Programa Quintal da Globo, direcionando ao mega Radialista Marcus Aurélio da Radio Globo. Naquele momento, após a mãe ouvir o programa, esta se irradiou com as verdades do filho, instantes em que vai dormir, e o guri pega a lamparina e coloca encima da mesa. Com a caneta na mão e a folha de caderno, escreve os seus profundos sentimentos que respigam em lagrimas, caindo sobre a folha de papel de cor branca. Já era tarde, o menino Pedin imaginava... Olhando para as paredes de barro enquanto escrevia com as gotículas que germinava do coração, e sobressaía lentamente nas laterais dos pequeninos olhos. Assim, bem retratada a carta nos olhos do pequeno, este relia, relia por várias vezes e modificava em todos os instantes durante a madrugada taciturna. E finalmente, Pedin termina a carta endereçada ao Quintal da Globo nos termos abaixo:

Sambaiba (MA), 14 de julho de 2007
“Ao Programa Quintal da Globo”
Para o amigo Locutor Marcus Aurélio

Amigo locutor, sou o Pedin da Sambaíba, de Caxias do Maranhão, tenho doze anos, tô sempre escutando o seu programa todas as noites no meu radinho de pilha que comprei com a venda de coco babaçu. Gostaria de saber notícias do meu pai que viajou pra trabalhar no Pará, e até agora não deu notícias. Eu e minha mãe estamos sofrendo com isso. Olha amigo locutor! Quando chega à noite, fico ouvindo suas mensagens e suas músicas e os alôs que você envia daí. E a saudade do meu pai é tanta que às vezes choro. Eu lhe peço encarecidamente que procure por meu pai no Pará, o nome dele é Severino da Sambaíba do povoado de Caxias. Também peço que toque a música Reggae na Estrada da Tribo de Jah. É um reggae de responsa e uma grande pedra, Quando estiver no ar, fale que eu mando um beijo pra minha mãe Sebastiana que está do meu lado na sua escuta.
Olha! Eu estou direto na sua escuta, desejando a você muitas felicidades. Não esqueça amigo que sou seu fã número 01. E não esqueça do meu pai, viu?
Boa noite.

Abraço do amigo de hoje e de sempre
Assina: Pedin da Sambaíba



Agosto de 2007 - Da Sambaíba ao Centro da Cidade


No dia seguinte após o garoto sair do colégio na Simbaíba, com tanta empolgação, atravessa a estrada tortuosa e poeirenta que leva rumo a pista negra de Aldeias Altas à Caxias, e aguarda sentado debaixo de um pau pombo com os livros recolhido nas pernas. A camisa branca e suada com os dizeres estampados na frente - “Colégio Coração de Jesus”, caracteriza um pequeno estudante na espera de uma carona. Em instantes, veículos cruzavam a autopista, e o menino se levanta, acenando com os braços curtos uma parada na beira da estrada Estadual, porém, os veículos ultrapassam em grande velocidade aqueles minúsculos braços estendidos em vão que não atinge os objetivos. A ansiedade se veste na irritação, e o menino não se cansa de esticar o braço solicitando uma carona aos diversos veículos que passam. Nem mesmo as horas não mede o espaço na compreensão daquela pobre criança que não se cansa de olhar o estradão negro.

Adiante, o meninote percebe um caminhão trafegando em marcha lenta em sua direção com uma carga de lenha, o coração explode na mão, lançando o braço insistentemente ao motorista que nem observa os apelos. Os avanços e a intenção de chegar à cidade transmitiam a desejada agonia de subir na traseira daquele veículo. Em condições desiguais, o guri empreitou uma corrida com os passos leves durante mais de oito minutos, oportunidade em que o caminhão de lenha desce a ladeira com mais celeridade, afastando-se o caminhão do garoto. Bem ali, ele permanece inerte no meio da pista com as sandálias na mão e a outra com os livros escolares. Chegava dentro do espírito mais um fim de uma luta contra o tempo, e a desvantagem empreendida com tanto suor derramado e labuta.

Naquela ocasião em que o veículo atingia uma distância de sessenta metros do menor, um jovem sentado no alto da carga de lenha ouviu o grito do menor pedindo carona. Atento, testemunhou a luta perdida do garoto atrás do caminhão cujo impacto na mente do ajudante o fez sentir profundamente vendo ali parado no meio da pista. O rapaz gesticulando com a mão direita, convidou Pedin a seguir o trajeto, onde o cansaço desfrutava por todo o corpo do menino. Já sem fôlego, desaba em direção aos chamados com passos agigantados atrás do caminhão que não para. De repente, um rapaz bate com a mão na cabine do motorista e grita:

-Ei motora! Para esta joça, por favor! Não tá vendo o moleque correndo atrás?

Atendendo ao pedido, o motorista diminui a velocidade, e Pedin já cansado, grita;

-Ei! Vocês aí de cima, me dão uma carona pra Caxias, por favor!

Um dos ajudantes do caminhão de lenha gritou ao motorista:

-Ei motora! Para esse trambói de uma vez aí que vai subi um boy.

O motorista do caminhão manobrou à direita e parou, e uma voz de adolescente falou:

-Sobe aí moleque! Cuidado pra não escorregar nas toras de madeiras.

O menino Pedin entregou as sandálias e os livros e subiu no caminhão velho. Um deles indagou:

-Você estuda em Caxias?

-Não, eu moro na Sambaíba.

-O que tu vai fazer em Caxias fardado?

-Eu vou colocar uma carta no correio. Você sabe onde fica?

Surpreso o rapaz inquiri:

-E aí cara? Cê num conhece Caxias?

-Não. Conheço muito pouco. Eu nunca fui aos correios da cidade, também nunca precisei mandar carta pra ninguém.

-Você sabe onde fica a Praça Panteon, moleque?

-Sei. Não é perto do centro de Cultura aonde agente faz a bolsa família? Não é?

-Isso mesmo, é bem perto e fica ao lado.

Supreso, Pedin confirma, olhando os tres novos amigos de carona.

-Verdade amigo? E vocês trabalham carregando lenha?

-Sim, não tem outro jeito amigo da gente viver. Ninguém da nada pra ninguém, se lá em casa a gente não trabalhar a gente não come. Nós não temos pai, e minha mãe, coitada... vive lavando roupa no Riacho do Três de graça. Ela trabalha e não recebe o dinheiro do lavado. É triste tudo isso, né? E se a gente andar por aí, a polícia pega a gente e vai logo chamando de vagabundo, mala e viciado, além de dá porrada no meio das nossas pernas.
O outro jovem assegura:

-A nossa vida é uma desgraceira mesmo. Mais aí o que há de se fazer. Se a gente anda pela rua, as pessoas olham pra gente com um olhar diferente, achando que somos uns trombadinhas e perigosos. Vida de pobre amigo é nobre, por que não devemos nada a ninguém, Não temos corrupção nas mãos e essa moçada de filho de papai anda por aí, desfilando de carro novo devendo até os ovos da calça, fumando crack e bebendo com um monte de nina. As leis são deles que fazem e nós só olhamos.

Pedin compreende a situação e pergunta a um deles:

-E quanto você ganha amigo?

-Eu ganho uma miséria que não tem nome. Lá no serviço eles pagam cinco reais pra ajuntar a lenha cortada do motor serra, cinco reais pra carregar e descarregar o caminhão na cerâmica ou padaria conforme o freguês contratar. Olha, eu vou sair desse serviço amigo. É pesado e a gente sofre demais, além da humilhação dentro do mato que não é fácil. Tá vendo o que nós merendamos lá, farinha de puba com rapadura. É isso aí. Mata a fome mesmo de montão.

-E qual a sua idade ?

-Eu tenho quatorze anos, o Julinho tem doze e o Raimundão tem dezesseis.

-Não é perigoso a polícia pegar todos vocês?

-Que nada. O dono do caminhão é esperto. Quando a gente chegar no Teso Duro, ele manda a moçada descer e passar pra cabine. E o patrão tá comprando uma lona pra cobrir a carga pro IBAMA não ver a madeira ilegal.

-Vocês não podem trabalhar desse jeito. Todo dia eu ouço o Programa Quintal da Globo e sempre o locutor fala sobre a exploração infantil e o trabalho escravo.

O garoto que atende por nome de Raimundão, indaga:

-Não é o programa do radialista Marcus Aurélio?

-Sim. Você conhece?

-Demais cara! É massa! Na casa de minha tia à noite é o pau que rola. Ela não perde uma noite do programa do Marcus Aurélio do Quintal da Globo.

-Poxa! Que legal, mais ele é massa mesmo. Tô mandando uma carta pra ele rodar a música Reggae na Estrada da Tribo de Jah, e procurar por meu pai que foi trabalhar no Pará e até hoje ele nunca deu notícias. Eu sofro muito por tudo isso e eu não sei o que mais fazer sem o meu pai.

Em instantes, Pedin iniciou a derramar lágrimas, repassando a mão direita nos olhos. Logo, o ajudante Raimundão conforta dizendo:

-Ei amigo! Não chore. Não será preciso você chorar. Se você mandar a carta pro Programa dele, eu tenho certeza que o radialista Marcus Aurélio vai dá conta do seu recado. Ele é amigo dos amigos. Seu pai pode está até no exterior, o Marcus Aurélio é fera no som e vai dá conta do recado, fique firme. Ele tem amigos espalhados por todos os cantos do Brasil, logo vai trazer informações e quem sabe trazer o seu pai de volta. Meu amigo, não chore! Um garoto como você não deve chorar, aguarde as notícias.

Outro menino que se comove com as lágrimas de Pedin, diz:

-Vai nessa moleque! Sei que tu é fera demais na escrita e tenho certeza que os seus sonhos você vai realizar. Acredite, o Marcus Aurélio vai trazer o seu pai pra você. Não chore! Você tá me deixando triste também, apesar de nós não ter um pai, isso me dói por dentro pra caramba.

O terceiro ajudante do caminhão também afirma:

-Não adianta chorar, não, não mesmo? Sei que o pior já passou agora e você tá aqui com a gente e se depender de nós, faremos o sol ficar quadrado. Por que você é um bom menino. Sabe, o meu coração dói cara vendo você chorar por seu pai. Se eu tivesse um pai, eu não deixava ele sair de perto de mim. Um pai é tudo na vida de um filho.

O miúdo da Sambaíba é puxado pelo ajudante mais velho que abraça consolando, e Pedin fala:

-É tudo... O que tenho na vida é meu pai, sem ele eu não sei mais sonhar, não sei o que é a minha vida. Quando acordo que não lhe vejo, eu fico triste. Não sei como a vida é tão ruim pra mim, levando o meu pai pra longe. Já está com dois meses que não temos notícias dele.

O ajudante mais novo de doze anos fala ao Pedin:

-Amigo, não chore. A pior coisa da vida é a gente não ter um pai pra dá a benção, receber um presente ou mesmo um abraço. Não precisa ser rico, o importante é que ele seja um pai e que nos mostre um caminho pra gente andar. Sabe moleque, a pior data da minha vida é o dia dos pais. Quando vejo toda a moçada indo pra lojas comprar presente pro seus pais, eu fico chorando aqui por dentro. Logo, eu não tenho um pai pra dizer que amo também e nem pra dizer um alô ou pedir um trocado pra comprar um sacolé.
Sem demora, o bate-papo percorre o tempo do trajeto do caminhão que adentra pelo centro da cidade, momento em que um deles diz:

-E aí camarada, nós não descemos do caminhão e já estamos no centro da cidade. Vou pedir pro motora dá uma paradinha pra você descer. Olha! O Correio é logo ali naquele prédio grande de andar.

-Tá bom amigo. Obrigado pela ajuda, eu não vou esquecer de vocês nunca mais. Vocês são meus amigos.

-Valeu garoto! Tome dez!

O menino seguiu, atravessando a Praça Panteon e avistando o prédio dos Correios, instante em que adentra naquele prédio, empurrando a porta de vidro, e logo indaga ao senhor do balcão;

-Ei moço! Eu quero colocar está carta para o Marcus Aurélio do Quintal da Globo?

O funcionário sem dar muita atenção, responde:

-É simples ou registrada?

-Não sei. O que quer dizer isso?

-Simples, o pagamento é cinqüenta centavos e registrada é mais cara.

- Quero pagar no modo simples.

-Está faltando o CEP do destinatário garoto e o seu endereço com CEP também.

-Moço, lá... Onde moro não tem CEP e nem Correio por lá anda. Como posso resolver isso. Lá é interior dentro da chapada. O senhor já ouviu falar na Sambaíba?

-Já sim. Você tem algum endereço na cidade ou de um conhecido ou parente?

-Não. Não tenho ninguém conhecido aqui na cidade.

-Então tá difícil enviar esta carta. Me fale uma coisa? Não é lá na Sambaíba que é festejado a festa de São Raimundo Nonato?

-É sim, na casa de Dona das Neves.

-Vou lhe dá uma mãozinha neste seu caso. Preste atenção! Vou por o seu nome no local de remetente e o endereço lá da minha casa pra facilitar. Qualquer novidade de resposta, eu vou deixar na casa de Dona das Neves na Sambaíba. Tá certo?

-Sim moço e muito obrigado. Posso lhe fazer uma pergunta?

-Até dez.

-Quantos dias leva esta carta para chegar às mãos do locutor da Radio Globo –o radialista Marcus Aurélio? Perguntou o garoto ansioso.

-Aproximadamente de cinco a sete dias. Hoje é dezessete de agosto, possivelmente no dia vinte e três ou vinte e quatro, a sua cartinha já estará no destino.

-Moço como é o seu nome?

-Francisco.

-Senhor Francisco, eu posso usar o seu endereço para eu poder me comunicar com o Quintal da Globo outras vezes?. Sabe amigo, não será somente esta carta que vou escrever, talvez eu faça mais.

-Claro e a vontade. Qualquer novidade eu mando deixar na Sambaíba. Você parece um garoto muito legal. Você estuda?

-E muito. Estudo demais, tô na terceira série. Já li vários romances e livros de história, quando eu crescer eu quero ser locutor de rádio. Quem sabe o senhor ainda vai me ouvir dando um alô assim. “Alô Francisco que trabalha nos Correios, fazendo a comunicação importante entre as pessoas, meu ouvinte favorito, aqui é Pedin que envia um grande abraço e lhe ofereço uma música. Gostou?

-Adorei. Você é um garoto inteligente. Quem sabe Marcus Aurélio vai responder a sua cartinha no ar. Parabéns e obrigado. Volte sempre, será um prazer.

-Obrigado moço! E até logo!

Dali o garoto partiu rumo à Praça da Chapada no centro de Caxias, onde possivelmente iria esperar uma carona na Rodoviarizinha Nacor Carvalho - ponto de ônibus que fica localizado em frente ao Colégio José Sarney na Avenida Santos Dumont. E nestas circunstâncias, pode-se afirmar que eram as puras emoções de um menino do capoeirão com sonhos e realizações no cotidiano caótico. Porém, aquele programa de rádio transmitido pela Rádio Globo alimentava com júbilos as almas e vidas que ficam ansiosos para a entrada do programa no ar durante a semana. Sim, é momentos aplausíveis que fazem da monotonia sertaneja, o maior celeiro de regozijos, nem mesmo a dor, a tristeza e a fome são capazes de enfrentar a voz serena de Marcus Aurélio de Carvalho quando ecoa no rádio da casa do menino Pedin e demais pessoas espalhadas pelo Brasil. Na verdade, é um sinal de paz, conforto, lembranças, notícias do dia, são elementos basilares daquela convivência noturna distante dos grandes centros e cidades, e que são capazes de deflagrar nas montanhas de emoções o entendimento de que a existência e a amizade ainda são os melhores cartazes entre os seres humanos.

É ainda o rádio um dos maiores veículos de comunicação de massa. Pois, o tempo passa entre o céu e a terra e o rádio ainda continua como um grande vulcão em pleno século vinte e um. Nem mesmo a internet e as rádiowebs não retiraram o prestígio do rádio e seus programas que vem avolumando no cotidiano os avanços tecnológicos.

Todavia, as incertezas e o dia-a-dia que repassava nas manhãs, eram hábeis de confortar o menino Pedin com o Programa Quintal da Globo realizado pelo grande radialista brasileiro Marcus Aurélio. Mas, a ansiedade ganhava terreno no pensamento do garoto e todas as noites juntamente com sua mãe ficavam ligados no Programa da Radio Globo AM. E naquele dia era um belo domingo, e marcava na folhinha dependurada na parede o dia vinte e dois do mês de agosto. Ao lado, a luz da lamparina dançava com a ventilação que adentrava pela porta e janelas do pequeno casebre, e no centro da mesa, se encontrava posicionado o radio de Pedin, onde os olhares permaneciam fixos na voz do comentarista de um jogo de futebol. Irrequieto, o guri comenta com sua mãe:

-Será que este comentarista não vai acabar de falar não. Mãe será que a minha carta já chegou nas mãos do locutor?. Tô doidinho pra ouvir ele falar no meu pai.

-Que nada menino. Eu não acredito que a tua carta vá até onde ele.
Disse o menino um pouco irritado.

-Como não vai chegar lá? Que estória é essa mãe? A senhora não acredita em mim?

-Sei não. Vou dormir que tô cansada. E quando acabar o programa desligue o rádio pra você acordar cedo e ir pro colégio.

-Tá bom mãe. Poxa! O programa já começou e até agora não saiu nada. Mãe! Mãe! Ele não falou nada e o programa já terminou. Eu queria saber notícias do pai.

-Vai dormir teimoso, que o teu pai não está nem aí pra nós. Quem sabe ele não arranjou outra mulher?

-A senhora só pensa besteira, mãe? Tá vendo que o meu pai pode está pensando em mim neste momento. Talvez ele tenha dito assim: Amanhã vou comprar a bicicleta do Pedin e a fita da Tribo com o Reggae na Estrada.

-Tu vai rodar essa fita aonde, se tu não tem gravador?

-Vou rodar na casa do João, filho da Dona das Neves.

-Deixa de ser besta! Vai dormir e apaga a lamparina. Menino.


SAMBAÍBA – NOITE – SEGUNDA-FEIRA


A lua toda despida, marcava as escadarias do tempo naquela caatinga, respingando o seu brilho nas sombras das enormes palmeiras de babaçu, com o céu aberto e sem nuvens, as estrelas piscavam no infinito do universo, caminhando sozinha naquela imensidão perdida. Naquele momento, Pedin se encontrava deitado na areia branca do terreiro de casa, observando a cadência da lua que intimidava com seus encantos. Mais uma noite andava, e acompanhando o astro lunar, e as aspirações do pequenino do capoeirão se perdiam entre as profundezas celestiais onde os olhares verticalizavam a essência da única esperança que doravante poderia ser o cavalo de São Jorge e a serpente num duelo interminável, demonstrando que a força e a intrepidez serão sempre o elo da valentia em alcançar os possíveis objetivos.

Não fora dessa vez, onde o mar de angustia e tristeza fazia ondas no coração do meninote e lançava ardentemente nos reflexos da mente, a arte de sonhar com o seu pai e a coragem em meditar diversas situações desprezíveis que somente a mente humana é capaz de colocar empecilhos. O programa Quintal da Globo levanta poeira no sertão maranhense, proporcionando um equilíbrio aos ouvintes nos mais distantes lugarejos e sem qualquer sombra de dúvidas, desassistidos pela rede governamental, é ele, o agricultor sertanejo o máster dessa coalizão de informação. Mesmo desagregado das inovações do progresso das gerações da contemporaneidade, o sertanejo continua ativo, trabalhador, forte e musculoso com as notícias e alegrias proporcionadas pelo requinte da voz plácida do radialista mais querido do Brasil – Marcus Aurélio.

Assim, a noite vai atravessando com a posição da lua, os minutos e segundos incontáveis em que o menino Pedin mergulha na esperança que não se perde, porém, não desiste de que a sua cartinha um dia será lida pela primeira vez de sua vida pelo homem mais honroso da comunicação, a voz possante que transmite grandes relevos de admirações. E neste entrave, com tantos desânimos, mais um entardecer vai perdurar na imaginação do menino homem do sertão, mergulhado na rede velha estendida no meio da sala, onde a respiração flutua e os olhinhos fechados fazem a mente navegar em vários lugares sem fronteiras. Tudo é efêmero na existência em que brilha o sol e a lua na movimentação constante do planeta terra. Todavia, naquela boca da noite, não ouve comentários com sua mãe sobre a carta remetida ao programa Quintal da Globo, entristecido, nada mais falou e dormiu.

Era sexta-feira, dia vinte e quatro de agosto do ano de 2007. O dia amanhece na Sambaíba com o galo cantando a sua melodia, e descendo do poleiro as galinhas. Bem ali, ao lado do pé de caraíba, o bem-te-vi do alto da palmeira mergulha em vôos rasantes com belíssimas acrobacias marcando o seu território com o seu cântico. As rolinhas fogo - apagou revoavam de um local para outro sem endereço, E Dona Sebastiana e seu filho acordam às 05 horas daquela bela manhã, instantes em que Pedin se dirige para ficar de cócoras ao lado de um pau pombo, logo a mãe indaga:

-Que você tem Pedin que tá triste?

-A senhora ainda pergunta mãe?

-É proibido perguntar agora?

-A senhora sabe. Papai nunca deu notícias e minha carta nunca foi lida no Quintal da Globo. Talvez alguém abriu pensando que tinha dinheiro dentro dela.

-Que nada menino, deixa de tolice. O que é pra ser será. Deixa de inventar moda nas coisas. Carta pelo correio demora mesmo.

-Mãe! O homem do correio disse que chegava lá com cinco dias e até agora não vejo nem um buraco de uma agulha quanto mais um alô, já tá com sete dias e nada. Se eu tivesse condições eu mesmo levava a minha carta até ele.

-Rapaz tu é apressado demais. Feijão não se cozinha num minuto não. E nem mulher pari fazendo filho em três meses. Tudo tem que ter o seu tempo.

O crepúsculo vai envolvendo numa escalada do mesmo cotidiano, e sem demora, dona Sebastiana e seu filho estão sentados à mesa, aguardando a entrada do Programa Quintal da Globo. Ainda com o semblante deprimido, o guri se levanta e vai se deitar na rede na agonia de meditar milhões de coisas ao mesmo tempo, gerando incerteza e insegurança. De repente, a Radio Globo AM 1220, abre com sua gigantesca potência, o som brasileiríssimo que remexe a alma de cada ouvinte, e naquele trabalho noturno com bastante profissionalismo, Marcus Aurélio cria uma novidade no programa, dando abertura com uma música. Ao sobressair os primeiros toques do balanço, dona Sebastiana grita e chora:

-Acorda Pedin! Acorda menino! Ouve a tua música, é o Reggae na Estrada. É a tua música no Quintal da Globo!

O garoto deu um grande pulo da rede e disse em bom tom:

-Mãe!, É a minha música. É o reggae na Estrada. Mãe! Eu não acredito.

-Ouça filho, é mesmo.

Intranquilo, o menino pergunta:

-Tem certeza que é no Quintal da Globo, a senhora não mudou de estação não?

-Não filho, é no teu programa, tá do jeito que você deixou e foi deitar. Cadê as pilhas novas, o rádio tá falhando parece que as pilhas estão fracas.

-Tem duas pilhas detrás do pote. Então a minha carta chegou lá, graças à Deus.

Dona Sebastiana tenta acalmar o filho, dizendo:

-Vamos aguardar o locutor falar, é só esperar o que vai acontecer.

Eles aguardam com os olhos fixos no radinho de pilha sem piscar, porém, a programação continua com o tema do dia, relatando casos com a participação de vários ouvintes do país inteiro. Em cada intervalo, o radialista lança como vinheta a música Reggae na Estrada que sacode e balança o coração do menino do capoeirão.

-Mãe! Novamente a minha música, ele tá tocando de novo, então ele recebeu a minha carta.

-Sim meu filho, está tocando de novo.

E assim, continuou durante toda a programação do Quintal da Globo, tocando a melodia nos intervalos com o reggae maranhense, iluminando naquele espaço a flor que brota em felicidades. E por trás do microfone, o jovem radialista Marcus Aurélio mergulha os seus olhos nas esperanças de um pobre menino do sertão maranhense que procura por seu pai. Assistido por uma competente equipe, Marcus observa a grande emoção bater dentro do seu coração que chameja nas letras azuis da cor do céu escritas – RADIO GLOBO, perfazendo a moldura de um grande quadro branco, onde se lê abaixo – 1220 AM - escrita na cor branca da paz, e mergulhada na coloração vermelha do sangue brasileiro.

Sem mais intervalo, novamente toca a música reggae na Estrada da Tribo de Jah, e o menino, então fala para a sua mãe.

-Está tocando novamente mãe!

-Sim, parece que ele gostou da música.

-Mais até agora ele não falou nada. Será que é outra pessoa que escreveu pedindo a minha música? Será que o papai tá ouvindo o meu reggae?

-Que nada Pedin. Acredite em Deus e Nossa Senhora que tudo vai se resolver. Deus abriu um caminho para você e sempre iluminou os olhos e abriu espaços na vida do locutor Marcus Aurélio pelo homem que ele é, somente assim pude conhecer o valor que ele tem no Brasil.

Sem delongas, a suave e segura voz branda nos hemisférios de todos os rádios espalhados pelo Brasil com a música de fundo. Mais uma vez o reggae da tribo de Jah ecoa como uma vinheta, e uma voz branda dizendo:

-Alô, Pedin do povoado Sambaíba, em Caxias, Estado do Maranhão. Nosso querido ouvinte que está em nossa escuta todos os dias ao lado de sua querida mãe. Boa noite garoto! Tudo bem com você? Obrigado pela companhia e também pelo envio de sua amável cartinha que me enriqueceu de alegrias em saber que sou o seu fã número um.

Interrompendo a audição, Pedin grita:

-Ele tá lendo a minha carta, mãe! Ele recebeu a minha carta. Legal à bessa. Que maravilha mãe. Agora ele vai encontrar o meu pai, tenho certeza disso. Ouça mãe, ele tá falando no meu nome. Viu como o rádio ainda tem força no mundo?

Novamente, naquele recinto de radiocomunicação, o jovem radialista Marcus diz:

-Pedin, sua carta me emocionou demais. E saiba que o Quintal da Globo é uma família unida. Hoje é uma noite especial dedicado a você Pedin que mora na Sambaíba no interior de Caxias, no Maranhão. Boa terra, Caxias a terra do grande poeta Gonçalves Dias. Alô Pedin! Alô amigos do Quintal da Globo! Peço aos amigos ouvintes que se conhecerem ou souberem do paradeiro de Severino da Sambaíba, de Caxias no Maranhão, pai do garoto Pedin e esposo da dona Sebastiana que entrem em contato com a nossa equipe. Seu filho e sua esposa estão preocupados com a ausência desmotivada de Severino. Atenção meus queridos ouvintes do Quintal da Globo, aonde estiver Severino entrem em contato com a nossa equipe por favor. Eu preciso dá este presente para um menino lá do sertão maranhense. Alô Severino, se você estiver ouvindo o Quintal da Globo, fale conosco, estamos aguardando notícias suas. Amigos ouvintes do Estado do Pará, Severino da Sambaíba que mora em Caxias, no Estado do Maranhão se encontra nas terras paraenses há dois meses sem dá notícias à família. Quem souber o seu paradeiro, favor entrar em contato, por gentileza. Alô Pedin no povoado Sambaíba em Caxias, Maranhão, o seu recado está dado e durante a semana, iremos renovar seus pedidos e apelos. E pra finalizar a nossa programação do Quintal da Globo, nada melhor do que ouvir a música que mexe com a cabeça do menino que é o Pedin, Reggae na Estrada com a banda maranhense Tribo de Jah, acentuamos aos queridos ouvintes desse Brasil grande que a nossa missão é juntar corações, unir e fazer as melhores alegrias, eu e nossa equipe do Quintal da Globo teremos o compromisso de encontrar o pai do menino Pedin, que anda triste, e que todos tenham uma boa noite com a paz de Deus.

Naquele momento, os dois abraçados choravam, lágrimas se desfaziam nos rostos, momento em que um rapaz que mora na Lagoa do Porto, desceu do cavalo e bateu palma.

-Ô de casa! Ô de casa!

-Fala seu João!

-Dona Sebastiana! Nós ouvimos o locutor falando o nome do Pedin. Por isso estou aqui pra lhe dizer. Ele pediu aos amigos para dá notícias do Severino da Sambaíba. Poxa vida! Eu fico feliz em saber que o nosso povoado saiu no Quintal da Globo. E veja que o tempo todo tocando a música do Pedin, só reggae.

-É verdade João. Tudo é verdade. Eu disse pra mãe e ela nunca acreditou em mim. Disse o menino.

-Agora Pedin cê tá com a bola toda, hein? O cara gostou de cê. Olha. Só em falar no seu nome pra todo o Brasil já é muita coisa. Lá em casa, a mãe chorou demais junto com as meninas. Se Deus quiser o Marcus Aurélio vai trazer o Severino de volta pro cê. Olha dona Sebastiana, a notícia correu como fogo no capim, todo mundo amanhã vai tá falando do Pedin no Quintal da Globo. Esse locutor é demais, nasceu mesmo pro rádio. O homem é bom demais e fala bonito que a gente pensa que ele tá bem pertinho.

-Deus te ouça meu filho, e obrigado. Eu tô sem saber o que falar. Rogo a Deus para dá vida longa e bastante sucesso a esse filho de Deus. Agora não tem jeito, sou fã do locutor Marcus Aurélio.Viu? Sem me conhecer mandou um abraço. João, a gente vive aqui sofrendo e ao ouvir uma frase dessas que mexe com a gente, Não sei não. Mexe demais lá dentro e a gente termina ficando feliz..

Depois de ano de ausência, o menino consegue comprar uma bicicleta com a venda de coco babaçu. E nas melhores horas, envia cartas ao programa Quintal da Globo, pedindo notícias do seu pai, e que ele gosta de reggae, e pede para rodar a música Reggae na Estrada da Tribo de Jah. O locutor atende e manda um alô para o Pedin na Sambaíba. E manda um alô pro seu pai que saiu do Maranhão da localidade Sambaíba, onde você esteja seu filho Pedin aguarda notícias.

Certo dia, o menino escreve outra carta endereçada ao radialista, alegando que tinha um sonho para realizar, e que seu coração aguardava o pai que ainda não havia dado notícias.

“Ao Programa Quintal da Globo”
Para o querido amigo Locutor da Radio Globo

Senhor Marcus Aurélio
Meu único amigo

Sou o Pedin da Sambaíba, o mesmo da cartinha que lhe enviou. Aqui em casa a minha mãe é sua ouvinte número um e todo o povoado também. Quero saber notícias do meu pai e se você já achou ele. O meu coração fica muito apertado sem saber noticias. Quero lhe fazer um pedido pra resolver o meu sonho. Se você puder me arranjar um toca cd usado com duas caixinhas de som. E se eu não pedir muito, tô precisando de uma bateria de carro usada. Você sabe que o pai não tá aqui e minha mãe tá adoentada. Também fui cortado do bolsa escola. Eu só tô pedindo porque não posso mais quebrar o coco babaçu. Eu me machuquei com a minha mão esquerda no machado. E preciso desse presente pra mim fazer um negocinho por aqui. Amigo Marcus, já comprei a minha bicicleta, ela é toda azul, linda toda, paguei à vista com a quebra e venda do coco.
Quero que rode no programa a minha música com a Tribo de Jah - Reggae na Estrada. Ofereço ao meu pai por onde ele andar vai ouvir. Se você puder me mande duas fotos suas bem grandes pra mim colocar uma na sala e a outra no meu quarto. Quando você estiver no ar, fale que eu mando um beijo pra minha mãe Sebastiana e meu pai Severino da Sambaíba, aos amigos João, o Luiz, Dona das Neves, e todos vão está na sua escuta.
Olha amigo! Tô direto na sua escuta, e que você seja feliz e não esqueça de procurar pelo meu pai, viu?
Boa noite.

Abraço do amigo
Assina: Pedin da Sambaíba


Após seis dias, o bravo locutor Marcus Aurélio recebe a cartinha do pequeno ouvinte do Maranhão, emocionado com os dizeres, imediatamente ordena a equipe do Quintal da Globo para solucionar o pedido do garoto. Não demora muito, o radiante locutor entra em contato com a empresa Lemos Equipamentos Eletrônicos, localizada na cidade de Caxias (MA), e com reverência a empresa atende a solicitação, fazendo a devida entrega na localidade de Sambaíba ao destinatário, inclusive com as fotos do radialista.

A alegria se prontificava entre os palmeirais, e o menino chorou no dia que recebeu os presentes. Logo, pediu ao amigo João para adaptar a bicicleta com as duas caixas de som, e na parte traseira a bateria nova com um refinado toca cd player mp 8, e a partir desse dia, com um pequeno microfone na mão, e a outra segurando o guidon, os pés minúsculo daquela criança, pedalavam mato à dentro do sertão. A bicicleta com um cartaz na lateral levava o retrato do amigo locutor Marcus Aurélio da Rede Globo que empolgava os moradores da pequena localidade por onde o menino passava. Não lhes faltava pedidos para que o menino não fizesse comercial dos pontos de vendas, pois todos queriam ouvir o tino onipontente da voz gritante com o fundo musical da Tribo de Jah. Além de que cobrava um preço por cada comercial nos arredores.

O garoto descia e subia morros, rasgando os matos, atravessava riachos e não se cansava. Todo mundo já conhecia a voz do menino locutor da bicicleta que em longas distância se ouvia com o comercial.

“Vamos lá minha gente do Baixão Grande, hoje tem carne de porco na vendinha do Zé Ramundo. O quilo é baratinho, pague só dez realzinho. Vamos lá. Olha que tem novidades no comercio da Tia Nega na Vaca Morta, camisas e calção pra crianças a preço de banana. E não se esqueçam que as 20 horas Marcus Aurélio tem um encontro especial com você caro ouvinte. Ouça o maior locutor do Brasil em linha direta com a Sambaíba. Vamos lá moçada! É no Quintal da Globo das 08 da noite às dez, não percam”.

Na bicicleta tinha os seguintes dizeres: OUÇA O PROGRAMA – QUINTAL DA GLOBO, com o maior locutor do Brasil – Marcus Aurélio – das 20:00 às 22:00 horas – todas as noites. Não percam!
O menino anunciava os comerciais e também do programa do Quintal da Globo por todos os lugares daquela adjacência. Sabe-se que à noite, as horas já ultrapassam as labutas do menino do sertão, e não passava das 19 horas quando retornava da grande trabalho com uns trocados no bolso. As meninas que residem na Lagoa Preta, distante aproximadamente uns vinte quilometros kilometroz s da Sambaíba, comentava com uma amiga.

-Tá ouvindo Girlene, aquilo é o Pedin andando pelos matos essa hora da noite. Tá ouvindo ele anunciar a festa no Boqueirão domingo. Huum não vou perder.

-Maura, quem é esse locutor Marcus Aurélio que tanto esse menino fala.

-Tá vendo que tu não sabe de nada. É o locutor do Quintal da Globo. Tu precisa vê ele na bicicleta do Pedin, ele é massa. Um gato. Toda noite eu ouço o programa dele. Menina, é dez. A voz dele é linda.

-Gir, quando eu chegar em casa vou sintonizar na Globo. Olha domingo a gente se encontra na festa.

E desse dia em diante, com o dinheiro arrecadado dos comerciais, Pedin construiu a casa da mãe de alvenaria e colocou luz elétrica, comprou um televisor para a sua mãe, roupas e uma geladeira. Todos os dias Pedin trazia a carne e dinheiro. Certo dia, Pedin escreveu novamente para o radialista da Globo, pedindo notícias de seu pai e a música da tribo.

E para surpresa, um rapaz que estava ouvindo o programa Quintal da Globo na cidade conhecida como Palestina do Pará, falou para a sua mãe:

-Mãe, a senhora tá ouvindo o radialista procurando por um homem chamado Severino da Sambaíba do Maranhão que veio para o Pará?

-Sim, tô ouvindo.

-Será que é o homem que saiu da prisão, Ele também é Severino.

-Não sei filho. Se não me engano, ele saiu da prisão sem ter culpa alguma acusaram de ter matado um homem.

-Sim mãe, o verdadeiro assassino foi preso no Brejo Grande do Araguaia. Olha! Todo dia eu ouço o programa do Marcus Aurélio e ele pede informações sobre o paradeiro desse homem vindo do Maranhão. Será que é ele mãe? Amanhã eu vou ao centro na casa da tia Zilda e vou ligar da casa dela para o programa da rádio Globo pra saber mais detalhes.

O rapaz ligou no horário do programa e o locutor Marcus Aurélio atendeu no ar o cidadão da cidade de Palestina do Pará. Enquanto isso, Pedin ouvia no seu rádio o rapaz dando notícias e que iria procurar para ter certeza quanto a pessoa de Severino da Sambaíba. Tendo o mesmo afirmado que uma pessoa do mesmo nome havia saído da prisão.

Enquanto isso Pedin fala pra sua mãe.

-Mãe, tem uma pessoa que disse ter visto o pai, não tem certeza.

O menino começa a lacrimejar.

-Filho! Não chore.

- Mãe o pai saiu da prisão. Ele tava preso, assim disse o rapaz no ar do programa. Por que mãe prenderam o meu pai. O que terá acontecido com ele. Eu preciso saber.

-Filho, não diga uma coisa dessas. Que mal aconteceu?. Ó meu Deus tenha pena de nós. Por isso que ele nunca mandou notícias, até pensei que ele tivesse arranjado outra mulher.

Os dois choraram abraçados no centro da casa. Não demorou, várias pessoas de lugares distantes, chegavam em animais e outros à pé, eram mais de vinte pessoas que vieram até a casa do Pedin para abreviar a dor e confortar com as visitas. Dona Dominga logo disse:

-Ei mulher! Teu marido parece que foi encontrado na cidade de Palestina do Pará. Se não me engano ele estava preso por ter matado um homem.

Assim, disse o rapaz que falou no ar no programa do Quintal da Globo.

-Comadre, eu não ouvir nada disso. O Pedin que ouviu o rapaz falando no rádio.

Passados alguns dias, o rapaz teve notícias que o homem que saiu da prisão, estava alojado numa Fazenda pertinho da cidade há mais de 140 quilômetros. Chegando lá, procurou pelo Severino, e o gerente levou até lá onde se encontrava cortando juquira. Momento em que o rapaz se apresentou ao Severino, de imediato este disse:

-O senhor é o Severino da Sambaíba do Maranhão?

O homem logo disse:

-Moço, eu não devo nada à Justiça. E o Juiz me liberou depois de eu passar um ano e dez meses preso sem comunicação com minha família, passando fome e sede. Sou inocente por favor!

-Olha moço, não quero lhe fazer mal algum. Fique calmo. Saiba que todos dias eu ouço o programa do Marcus Aurélio – Quintal da Globo, e o radialista pede informações a seu respeito para aliviar a dor do seu filhop e esposa. E tenho ouvido as inúmeras cartas que o seu filho escreve para o programa. Eu e minha mãe ficamos comovido com a sua história. E quero levar o senhor até a casa de minha tia na cidade para falarmos no ar com o Marcus Aurélio.

À noite, o rapaz ligou para o programa e se apresentou ao radialista Marcus Aurélio. Em seguida, Marcus Aurélio ouviu por telefone o pai do Pedin, dizendo:

-Olha, eu fui preso pela polícia acusado de ter matado um homem. Falei a verdade mais ninguém acreditou em mim. Apanhei muito, fiquei muito machucado, passei dois meses no hospital adoentado por essas pancadas. E nunca tive condições de falar com a minha família. Até pensei que eu não nunca iria sair da prisão. Sabe Marcus! Apanhei muito pra confessar um crime que eu nunca cometi. A minha ficha é limpa. E só sair da prisão quando pegaram o verdadeiro assassino. Eu estou louco pra voltar pra minha terra. Aqui não tem condições de trabalhar cortando juquira. Pois tô sofrendo da coluna devido aos espancamentos e não sou mais um homem como antes. Tenho problemas sérios de pulmão devido a serviço de carvoaria na qual eu trabalhava. Nunca recebi o que me prometeram e o meu dinheiro não dava nem pra pagar as comida lá do ranho. Quero ir embora, me ajude pelo amor de Deus.

O radialista disse:

-Fique tranqüilo que vamos resolver o seu problema. Olha, você tem um filho muito querido e que lhe ama demais. Um rapaz trabalhador e que merece total atenção de você. Um menino de ouro, educado e gentil, futuro radialista também. Desde o dia que você viajou, ele nunca esqueceu você, sempre pedindo para que eu localizasse a sua pessoa. Fico feliz em ter encontrado você. Agora vou dar um alô ao Pedin que está ao lado de sua mãe

-Olá Pedin e Dona Sebastiana, lá em Caxias no Estado do Maranhão, na localidade Sambaíba. Um abraço a todos que estão na minha escuta. Seu pai foi encontrado. Fico feliz em passar essa notícia pra você. Sei que você está na escutada do Programa Quintal da Globo. Iremos providenciar o seu retorno para a sua cidade natal o mais rápido possível.

Após isso, ainda falando no ar com Severino, Marcus Aurélio disse:

-Severino, meu amigo do Maranhão fique certo que vamos providenciar suas despesas de viagem para Caxias e tão logo ao lado da família que tanto o espera.

-Olha seu Severino, escute a música que seu filho sempre lhe oferece, pois ele imagina e diz que não consegue parar de pensar na hora de lhe ver, na hora de chegar.Por isso vou rodar a música do nosso querido Pedin. – Regue na Estrada da Tribo De Jha.

Severino recebeu as passagens e a Radio Globo hospedou num hotel da cidade de Palestina do Pará, sendo que Severino telefonou para o programa à noite, dizendo que já havia recebido as passagens e disse:

-Olha Marcus. Eu nunca pensei que pudesse existir uma pessoa como você no mundo. Eu não sei como lhe agradecer. Foi uma luz de Deus que brilhou nos seus olhos para que me localizasse perdido nas matas do Pará. Pois essa claridade incendiou o meu coração e me deu nova vida, uma nova esperança. Você é o maior comunicador do Brasil, um jovem idealista e voltado a ajudar as pessoas aonde quer que esteja.

Marcus agradece:

-Fico feliz em retribuir tudo isso. Mais faz parte do nosso trabalho ajudar e encorajar as pessoas nos novos caminhos. Toda a Rede Globo no ar representa as nossas aspirações, mantendo sempre o equilíbrio da paz e redenção no Senhor.

E aí, Severino chega ao Maranhão e o menino Pedin sai pelas matas, veredas e demais lugarejos avisando com sua bicicleta que o seu pai vai chegar. Rodando sem parar, o menino fica feliz junto com sua mãe.

E no dia de 23 de dezembro de 2009, véspera de natal, Severino chega à cidade de Caxias, e pega uma van fretada pelo programa Quintal da Globo que já se encontrava no local, realizando o trajeto até o lugarejo Sambaíba. Ao chegar à noitinha, a van aparece entre os ramais poeirentos das trilhas esburacadas pela erosão e inverno. Uma multidão de amigos e vizinhos aguardavam sentados na porta da casa de Pedin. Ali se encontravam mais de sessenta pessoas. Sabe-se que um vizinho mandou matar um boi, outros levaram bolos para comemorar a chegada de Severino e a Noite de Natal mais Feliz do Maranhão em pleno sertão.

Após descer do carro, e ser aplaudido pela multidão. Naquele momento, o motorista da Van do Quintal da Globo, avisa que deseja entregar um envelope para o menino chamado Pedin. Imediatamente se apresenta o garoto que recebe o envelope lacrado contendo vários livros sobre a profissão de radialista, oferecidos pelo Marcus Aurélio, além de um cheque no valor de setenta mil reais, um notebook, uma bolsa de estudos para conclusão do curso secundário na melhor escola de Caxias, no Colégio São José. Tendo o menino dito que iria fazer a faculdade de comunicação assim que terminasse e que iria trabalhar como radialista, e que iria ser igual o Marcus Aurélio da Rádio Globo.

Assim, o radialista cumpriu mais uma missão de levar sua voz pelo sertão do nordeste e por toda a região dos cocais, e por toda a cidade havia até outdoor em homenagem a Marcus Aurélio do Programa Quintal da Globo. Por isso, uma semente de amor é sempre assim, enraíza suas bases em qualquer lugar e sua voz é um timbre de amizade e companheirismo, realizando as mais ousadas ações de cordialidades. Somente assim, o Natal brilhou profundamente em todos os que ouviram o Programa Quintal da Globo e se estendendo nos mais variados corações dos amigos ausentes.

Viva o Natal!







 
ERASMO SHALLKYTTON
Enviado por ERASMO SHALLKYTTON em 25/11/2010
Reeditado em 20/12/2016
Código do texto: T2635360
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