Meu Milagre de Natal


Até os 12 anos de idade fui perseguido por um medo irracional da morte, alimentado por um estranho e atroz pressentimento de que teria morte prematura, de que jamais atingiria a idade adulta. Por causa disso, eu era muito impressionável com coisas que se referiam à fatalidade da morte.

Certa vez, ouvi o meu irmão mais velho, o José, contar uma história estranha e sobrenatural para a minha mãe. Disse ele que uma menina, olhando para o céu, tinha visto uma porta e que morrera misteriosamente quando completaram exatos 7 dias da visão. Sempre impressionável, gravei a história no meu subconsciente e evitava a todo custo olhar para o céu, com medo de avistar a porta fatídica. Mas existe uma espécie de mórbido masoquismo no medo e eu, contra a vontade, muitas vezes olhava demoradamente para o céu. Em certas ocasiões, eu via, - oh, temível descoberta! – uma abertura entre as nuvens, parecendo uma porta. Seria a porta do céu? Se fosse, a minha sorte estaria selada!...Voltava para a casa triste, sentindo-me como um condenado à morte. Quase não comia nem dormia direito até completar 7 dias da suposta visão da porta do céu. Como não morria no sétimo dia, ficava aliviado e feliz. Até o próximo alarme falso.

Mas não parecia alarme falso uma abertura brilhante que eu, menino de 9 anos, vi no céu de São Luís do Maranhão, perto das festas de Natal e Ano-Novo. Aquilo, sim, com certeza era uma porta! Baixei a cabeça e caminhei tristemente para casa. Dessa vez eu estava mesmo condenado... Minha mãe viu-me entrar assim e perguntou:

- Que foi, Tonico, que aconteceu? Brigaste?

- Não, senhora...

- Então, por que estás assim tão triste, menino?

Não respondi e comecei a chorar copiosamente. Minha mãe alarmou-se mais:

- Meu Deus, o que te aconteceu, fala!

- Mamãe, eu vi a porta!

- Que porta, menino, que porta? - claro, a minha mãe já estava completamente esquecida daquela conversa do José sobre fatídicas visões de portas no céu.

- Nada, nada, mãe, na verdade estou com dor de barriga.

- Então, te deita e espera aí que vou lá na casa da tua avó, buscar umas folhas de boldo para te fazer um chá. Além do mais, preciso ajudar na arrumação do presépio. Daqui a 7 dias será Natal.

- O que a senhora disse? Quando é Natal?

- Daqui a 7 dias.

- Mamãe, a senhora acredita em milagre de Natal?

- Claro que sim! Quem pedir com fé, alcançará a graça.

- Mesmo que seja para que alguém não morra no dia de Natal?

- Que história é essa, menino? Quem vai morrer no dia de Natal?

- Responda, mãe, responda, por favor...

- Hum, estás muito estranho, mas, vou te responder: estando a vida e a morte nas mãos de Deus, a vida e a morte no dia de Natal também dependerá da vontade do Senhor, e mesmo para os condenados à morte, poderá se realizar um milagre.

- Obrigado, mãe, obrigado! - no outro dia, depois das aulas, fui à Igreja da Sé, e fiz o meu pedido:

- Senhor, eu vi a porta no céu e sei que vou morrer daqui a 7 dias, exatamente no Natal. Mas eu não quero morrer, Senhor, estou muito novinho para isso, só tenho 9 anos! Me dá um milagre de Natal, Senhor, me deixa vivo, por favor!

Para comprovar que não minto quando digo que milagre de Natal existe, saibam todos que já passei dos 60.





Foi muito bom compartilhar com todos vocês que passaram aqui pelo meu cantinho, o inefável prazer da criação literária. Que continuemos juntos em 2012 e que desfrutemos todos -  com paz, saúde e alegria - dos festivos momentos do Natal e Ano Novo, são os meus melhores desejos.

Antonio Maria Santiago Cabral








Santiago Cabral
Enviado por Santiago Cabral em 14/12/2011
Reeditado em 15/12/2011
Código do texto: T3388600
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.