A janela

A janela está aberta. Toco a cortina com um movimento leve, porém firme para ver melhor. Não consigo enxergar direito o que está a minha frente. Só vejo um estranho rascunho das coisas, como aqueles que eu fazia na escola com a folha toda marcada de tanto apagar o que eu escrevia a lápis.

Uma hora vejo duas senhoras conversando ao estender a roupa, outra vejo um garoto empinando pipa. Mas logo tudo escurece e uma dor muito aguda toma conta de tudo. É um silêncio de navalha que vai cortando a minha carne lentamente...

Quando percebo, a rua perto da minha casa está vazia e só vejo a luz do poste iluminando algumas moscas ao seu redor. Aquela luz é fria e arde muito e quando a noite cai tudo é esmagado. Sou esquartejado pelo amargor da visão daquela luz, justamente por ela estar acesa e iluminando. Tudo tinha que estar no escuro agora. Mas o escuro é um saco fechado que me colocaram na cabeça há algum tempo atrás.

O trauma de sempre olhar para frente, ao mesmo tempo em que se cai no poço podre do incerto me faz ver o que quero há muito tempo, de uma época que vivo mas que não é minha. Este querer olhar pela janela é a faca que corta minha retina e o que vejo é a paisagem lá fora pintada com o sangue do olho da minha incerteza.

Embora eu queira sair para caminhar por aquela rua, sei que não posso. Na verdade, talvez eu não queira, ou me fizeram não querer. Mas meu olho observa tudo, e aquela estranha escuridão silenciosa que vem daquela luz gelada esquarteja toda a minha coragem, que sangra intensamente, misturada às lágrimas de um passado remoto, um tanto uterino, ou aquele das velhas crenças da reencarnação.

Sei que sigo parado, olhando um mundo que se escancara escandalosamente para mim, mostrando toda a sua obscura liberdade, e, por eu ser livre é que fico preso e não ouso sair da minha janela.

Daniel Tomaz Wachowicz
Enviado por Daniel Tomaz Wachowicz em 12/06/2013
Código do texto: T4337906
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