Memórias da minha infância

É fundamentalmente imprescindível que se faça a correção de minha crônica anterior: Quando falei que nos mudamos da Rua Maria Vicentina para a Rua Engenho Bom Recreio, tive um lapso de memória e pulei uma etapa também importante das nossas vidas que foi quando nos mudamos para a vila dos sargentos, não lembro agora o nome, mas era a primeira rua depois da linha do trem (hoje metrô) que cruza a Barão de Souza Leão. Lembro que era uma casa enorme, com janelões de madeira pintados de azul, era uma casa de esquina e tinha um portão lateral onde era a entrada para carros, mas meus pais nunca tiveram carro, então não tinha muita serventia, vivia sempre fechado com cadeado. O quintal era bastante arborizado, tinha uma mangueira enorme que fazia uma sombra muito boa, de um lado o oitão era estreitinho, porém do outro era espaçoso, mas não tinha muitas árvores, na frente havia um pé de abacate que eu costumava brincar junto dele com pequenos brinquedos que eu mesmo inventava tipo caixa de fósforos e latas de sardinha que viravam carrinhos ou mesmo latas de leite vazias que juntas se transformavam num trenzinho. Brincava sozinho, pois naquele tempo as meninas (Nice e Gêna) eram maiores que eu e sempre foram muito estudiosas, por isso me deixavam um pouco de lado. A Mônica que era recém-nascida vivia sob os cuidados constantes de minha mãe, então por isso eu ficava muito só e a imaginação ficava solta para poder brincar com areia molhada e fazer pistas, castelos, túneis e outras coisas mais que a mente pudesse proporcionar. Uma vez estávamos todos lá no quintal entretidos com não sei o que, quando de repente minha mãe escuta o choro de Mônica, ela vai verificar e percebe que havia um ladrão dentro de casa, o cara tinha entrado e parece que só deu tempo de roubar uma pulseirinha de ouro que estava no braço da Mônica, por isso ela chorou, então ele pulou a janela e saiu correndo, foi o maior alvoroço na redondeza e eu tenho a impressão de que prenderam o marginal, pois naquele tempo essa vila era bem policiada. Tínhamos uns vizinhos do lado, lógico que também eram militares da Aeronáutica, ele era o também Sargento da Base Aérea Possidônio, que nós o chamávamos de Seu Possi, era um senhor robusto de um riso estrondoso e amigável, comia feito um bicho. Era conhecido na aeronáutica por suas façanhas de comilança. Tinha sua esposa que se chamava Socorro, era muito amiga de minha mãe e tinham três filhos que às vezes brincávamos juntos. Muitas vezes à tarde ficávamos na frente das casas a conversar esperando o homem do algodão doce, do japonês (espécie de doce) ou da pipoca que sempre passavam por lá e a olhar o céu onde ele mostrava criaturas fantásticas que as nuvens lá do céu formavam. Era um cara muito bom. Um dia eu soube que ele faleceu e fiquei bastante triste, pois com ele aprendi a ver desenhos nas nuvens. Pois bem, depois da vila dos sargentos foi que nos mudamos para a Imbiribeira de novo e foi lá que descobri que sabia andar de bicicleta. Tinha uma menina chamada Ana, era bem magrinha, e ela tinha uma caloi dobrável (muito famosa na época) eu vivia pedindo pra ela me dar uma voltinha na bicicleta dela, mas ela achava que eu era muito pequeno e não sabia andar. Uma vez ela deu um voto de confiança, mas disse que iria ficar segurando. Eu feliz da vida, peguei a bike e comecei a pedalar, tome pé... Não deu tempo nem dela pensar em segurar, eu já estava no maior pique... Então eu disse pode soltar pode soltar... A bicicleta continuava na maior carreira, então eu fui olhar para trás, pra ver se ela já havia soltado... Bum!!! Bati de frente a uma parede que ficava próxima a casa de voinha. A menina veio feito uma fera pra cima de mim: - eu não disse que você não sabia andar de bicicleta? E eu na maior inocência: - mas eu andei, eu andei! Ninguém precisou me segurar, só não tive tempo de usar os freios. Nunca mais ela me emprestou sua bicicleta. Então começamos a aperrear mainha e painho para comprar uma bicicleta. Aperreamos tanto que um dia estava lá: uma Pimont, nunca tinha visto esta marca, mas era uma bicicleta forte um quadro mais grosso que a caloi ou a monark. Os pneus reforçados que deixavam um desenho belíssimo na areia era o máximo, só o freio que era duro demais! Tínhamos cada um, o dia de andar, mas tanto Nice quanto Gêna, só fizeram à festa nos primeiros dias, depois quem andava mais mesmo era eu. Era uma secura danada pra andar e ganhar o mundo... Eu queria ir pra todos os lugares, até mesmo andar na pista (Mascarenhas de Moraes). Uma vez fui como carona com Missinho até a Isonor jogar bola, quando vínhamos voltando, que já estávamos dobrando a rua pra entrar na vila, o pneu derrapou naquela areinha e caímos na pista. Meu pai estava na parada do ônibus e viu, disse pra minha mãe e adeus bicicleta. Ela foi confiscada por não sei quanto tempo. Até eu convencer minha mãe a liberar foi um problema. Nessa mesma época, com a Mônica já maiorzinha nós (Eu e Nice) pegávamos ela pelos braços e saíamos a correr com ela voando feito um aviãozinho... Todos morríamos de rir, numa dessas vezes quando chegamos em casa, ela estava completamente nua, pois a fralda que ela usava tinha caído lá no meio da rua. Foi a maior gozação e a maior bronca de mainha. Nunca mais fizemos isso, porque ela dizia que ia terminar dando um jeito nos bracinhos dela.

Teve outra vez que eu tive a maior pena da Mônica, foi quando a bichinha pisou numa fogueira que parecia apagada no dia de São João. Seus pezinhos ficaram cheios de bolhas ela ficou sendo carregada para tudo quanto é lado... São memórias que vem e que vão e que se não são passadas para o papel, desaparecerão com o tempo.

Olinda, 11 de maio de 2008.

Dia das Mães

Gusto.