Meias Furadas

_Ei mãe, você lavou de novo minhas meias? Gritou Joãozinho com as bochechas estufadas e avermelhadas de raiva pra sua mãe.

_Já disse não precisa lavar quanto mais lavar mais abre o buraco onde fica o dedão e o rasgo que tem no calcanhar, lave as outras, essas não. Joãozinho muito indignado correu no cesto para procurar suas meias furadas, eram mais velhas que a irmã mais nova dele, brancas com umas bolinhas coloridas que ele ganhara do seu avô quando tinha dois anos de idade, o ciúmes era tanto que quando usava aquelas meias, chegava em casa corria pro quarto, tirava elas e guardava debaixo do colchão de sua cama pra sua mãe não pegar para lavar, se ela descobrisse o esconderijo adeus a sujeira e o chulé nas meias de bolinhas coloridas que de tanta catinga já estava marrom, se tivesse ratos no forro de casa era só colocá-las lá dentro que eles morriam sufocados com o fedor . Joãozinho correu no corredor da lavanderia fuçou todo o cesto bagunçou as roupas sujas e catinguentas, espalhou tudo no chão e para o seu alívio, ufa, lá estava elas no fundo do cesto revirado. Enfim o par de meias de Joãozinho, ele arregalou os olhos mordeu a língua e ficou na ponta dos pés, esticou o máximo que pôde para pegá-las, elas mais pareciam uns trapos velhos, e de repente “pufe” de tanto se esticar caiu o Joãozinho dentro do cesto que tombou e saiu rolando pelo corredor da lavanderia bateu na parede e parou com ele sentando e o cesto na sua cabeça.

_ Joãozinho o que é que tu fez menino levado, olha só isso ai, por acaso o cesto virou chapéu pra colocar na cabeça?

_Olha só as roupas vão ficar encardidas jogadas ai no chão!

_ Ah mãe já estão sujas, só estava procurando minhas meias de bolinhas, vou precisar delas hoje!

2.

_Estão sujas guri, onde você pensa que vai com esse bicho morto no pé?

_Eu tenho que construir um túnel de terra no fundo do quintal pra que meus carrinhos passem por dentro e não quero sujar os meus pés, por isso vou usar as meias junto com o sapato que ganhei da tia Eulália!

Aquelas meias sim é que iriam sujar os pés de Joãozinho, melhor seria é se ele calçasse os sapatos sem elas, o chulé saia depois era só colocar eles no sol que logo resolvia, e o pé se lavasse com bastante sabão na hora do banho deveria resolver, mas talvez a esponja não iria querer ser castigada a esfregar aquela catinga que mais parecia queijo estragado mofando dentro de um pote no fundo do forno do fogão, credo que nojo. Joãozinho gostava de brincar, mas não gostava nenhum pouco de tomar banho ele queria mesmo era passar o dia brincando com as meias de bolinhas, furadas no dedão do pé e rasgada atrás no calcanhar e quando percebia que era hora de tirar a catinga do pé corria pro seu quarto pra escondê-las no esconderijo secreto que só ele, eu e vocês é que sabemos, pois a mãe dele nem sonhava onde é que ele escondia. Aquelas meias fedidas se eu pudesse pegava e enterrava no meio do meu quintal, mas afinal vocês também não tem uma meia rasgada, um boné com a aba quebrada, uma camiseta velha rasgada, uma cueca furada, uma boneca faltando um braço, um caminhãozinho faltando uma rodinha por algum canto de sua casa escondido? Bem depois eu descubro e como eu ia dizendo, onde eu parei?...Ah, bem se dona Joana sua mãe soubesse onde é que Joãozinho escondia suas meias, nem colocava mais para lavar iria direto pro lixo. Mas me lembro de uma vez que Joãozinho foi ao posto de saúde pra pesar e medir sua altura, quando e enfermeira pediu pra tirar os calçados, ela logo gritou desesperada.

3.

_Santo Deus, chama o doutor, o pé desse guri tem tanto chulé que mal dá pra respirar, parece que veio com um bicho morto junto, eu heim!

Dona Joana ficou toda vermelha, tampou o nariz saiu de fininho de dentro da sala que estava toda lascada com aquele fedor, aquela flor que estava em cima da mesa da consulta, nem tinha mais vida, a coitada murchou e perdeu até as folhas. Joãozinho indignado foi logo falando.

_Mãeeee, já posso tirar o outro sapato, aquele enfermeira é maluca saiu correndo e me deixou aqui sozinho, se bem que... espera ai, quem deu no pé foi minha mãe que saiu de fininho.

_Até você Mãeeee?

_Joãozinho fica lá dentro da sala, o doutor já vem!

Veio o doutor assustado, atrás dele a enfermeira toda redondinha baixinha e desajeitada ajeitando os óculos redondos em cima do nariz, fazendo uma cara de pano de chão torcido por causa da catinga do pé do moleque.

_Meu pai do céu alguém dê banho nesse guri, isso ai não é pé normal não gente, esse é um chulé dos piores, dona Joana leva o Joãozinho pra casa tira essas meias dele joga fora, ah dá um bom banho nele e esfregue seus pés.

_Ah minha meia não eu ganhei do avô, nem pense doutor!

_bem se caso ele não quiser dona Joana, terei que receitar uma bela de uma injeção contra chulé, mas o problema é que ela fica doendo por uma semana, e o pior, ele não vai poder nem brincar!

_Mãe me leva pra quero tomar banho!

Joãozinho agarrou na mão de sua mãe os dois foram pra casa chegou lá tirou suas meias do pé esqueceu-se de guardar de tanto pavor daquela injeção de chulé, correu foi é pro banheiro e tomou um belo banho.

E dona Joana pegou aquela meia e me disse: _ filho já volto, vou atrás do quintal da casa de alguém.

Bem, na verdade até hoje não sei onde a minha mãe enterrou aquelas meias e nunca quis saber, não quero correr o risco de levar uma injeção pra chulé, afinal não preciso mais, agora eu tomo banho todos os dias bem direitinho e lavo os meus pés, minhas orelhas e depois me enxugo bem, bom agora que já cresci sempre compro meias novas , mas sem bolinhas vai que eu fico com vontade de usar elas todos os dias, mas afinal será que algum de vocês ai não achou enterradas por acaso brincando no fundo de suas casas algum par de meia furada por aí?

Raní de Souza
Enviado por Raní de Souza em 24/06/2014
Reeditado em 19/09/2014
Código do texto: T4856536
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