Pobre: o Cãozinho Amarelo

Era uma vez um cãozinho amarelo que nasceu de uma ninhada de seis cães, mas a cadela mãe dele estava doente, pois os comerciantes haviam espancado-a enquanto tentava revirar o lixo a procura de alguma comida.

De todos os seis filhotinhos que teve, somente um magrelinho conseguiu sobreviver. Ele andava tímido. Latia baixinho e com os olhinhos cheios de remela...

Um dia, um professor encontrou o cãozinho amarelo dentro de uma caixa de papelão, ao lado da mãe dele, num fosso de padrão de luz. O homem piedoso viu o cãozinho amarelo chorando e pegou-o para si. A cadela mãe do cãozinho estava morta, muito magra e machucada. O professor levou o filhote para casa e deu-lhe o nome de Pobre.

Pobre recebeu cuidados, ração e leite naquela noite. Chorou de madrugada com saudades da mãe. Os outros moradores do prédio ficaram incomodados. E o professor teve uma discussão com o dono do apartamento onde morava sobre a quantidade de cães que ele adotava. O professor ficou muito triste e teve que levar Pobre ao veterinário na tentativa de que fosse adotado.

O veterinário analisou o cãozinho e por ele não ser de raça disse que não podia ficar com ele. "Cães sem raça não dão lucro, e não teria nem o retorno do que gastei com vacina e ração nele" disse o veterinário.

O professor ficou muito triste com isso e levou Pobre ao comerciante ruralista pensando que o comerciante ficaria com ele. O ruralista vendia e entregava ração toda semana para o professor. Chegando lá no comércio ruralista, o professor propôs ao comerciante que cuidasse e dispusesse Pobre para adoção. O ruralista olhou meio sem graça, e disse que "não poderia ficar com Pobre, pois o cão não era de raça, e daria muita despesa por nada.". O professor insistiu e deixou pago um saco inteiro de ração para que o ruralista mantivesse Pobre dentro do comércio, na esperança de que o cão encontrasse um novo dono. O ruralista concordou.

Pobre latia baixinho e tinha um olhar tristonho. O cocô era pequeno. Após uns dias, o Nhô Burguês foi ao comércio do ruralista comprar ração pras suas galinhas e viu pobre cãozinho na gaiola de animais para adoção. Pegou nele e disse:

- Vou adotar esse.

O comerciante, rindo disse:

- Esse era de um professor que o batizou de Pobre.

Rindo o Nhô Burguês disse:

- Pobre? Isso é nome? Não importa... vou levar esse pobre Pobre pra trabalhar para mim lá na roça.

- E vai pagar umas vacinas antes de deixar ele lá? - Indagou o comerciante ruralista.

- Hum... Isso custa quanto?

- Setenta reais. Leve uns remédios pra verme também e faço um preço especial com desconto pro senhor...

- Ah não. Só as vacinas... Remédio pra verme não! Muito gasto pra um bicho da rua... Ele que aprenda a se virar! - reclamou Nhô Burguês.

E saiu dali levando Pobre na caixa de papelão que ganhou após vacinar o bicho com o comerciante ruralista.

Chegando na roça, Nhô Burguês tirou Pobre da caixa e pôs ele pra fora. Pobre, tímido, olhava ao redor o grande quintal com varanda de secar café e engenho de moer. Nhô Burguês deixou uma vasilha com restos de comida só almoço e uma lata com água e disse:

- Sai cachorro! Vá trabalhar e vigiar a casa pra mim!

A noite caia e o frio de junho estava muito forte. Pobre começou a chorar do lado de fora da casa e arranhar a porta. Nhô Burguês não gostou e acordou com o barulho. Passou a mão em uma vassoura e foi até o cão. Abriu a porta pra bater nele mas o bicho deitou-se diante dele, perto dos seus pés, rendido.

- Quieto Pobre! Vai deitar! Pode parar de arranhar a porta!

O cão abana o rabo e deita com semblante de tristeza e vergonha. Nhô Burguês vira as costas e bate a porta. O cão repete o arranhar e o choro. Ele sente frio. O homem cheio de fúria volta e bate no cão.

- Vai dormir Pobre! Cachorro maldito!

- Caim! Caim! Caim!

Pobre se afasta chorando. O frio não passa.

- Cala boca Pobre!

- Caim! Caim...

O cão ladra longe da porta mas deita junto a um abacateiro. Chora mais um pouco mas dorme.

O dia vem. O cão espancado fica de longe com medo de Nhô Burguês, mas seu dono agora procura por ele.

- Cadê àquele cachorro enjoado?

O cão foge do dono temendo. O dono corre atrás dele aos berros:

- Pobre ! Vem cá Pobre!

Pobre foge pra fora do domínio de seu senhor. O dono corre atrás do cão com medo.

- Volta Pobre! Pra dentro!

Nhô Burguês insiste em fazer o cão obedecer e corre. Pobre se rende novamente e deita no chão com o rabo entre as pernas. Nhô Burguês grita:

- Passa pra dentro Pobre!

O cão fica imóvel. Nhô Burguês chuta ele. O cão corre. O dono fecha a porteira.

Ao meio-dia, o almoço é posto sobre a mesa. Pobre chega pelo cheiro. Senta de barriga vazia a espera de alguma migalha. Nhô Burguês come e olha irritado pro cão. O cão nem pisca. Nhô Burguês grita contra ele.

- Saí pra lá, Pobre!

O cão tenta murchar as orelhas mas o cheiro o imobiliza. Seu estômago vazio aguça sua resistência. Pobre está ansioso por alguma migalha e olha fixamente para a boca de Nhô Burguês. O dono ignora.

Ao final da refeição, ele dispensa um osso de coxa de frango. Pobre come tão rápido que nem sente o gosto direito. A fome do cão continua. O cão chora...

Nhô Burguês ouve e briga:

- Sai pra lá cachorro chato!

A esposa de Nhô Burguês opina:

- Mas você precisa comprar ração pra ele, homem!

- Ah que saco! Cachorro tem que caçar rato, tatu, gato e gambá pra se virar! Acha que eu vou gastar do meu dinheiro pra comprar ração pra esse Pobre? Eu não! Azar é dele! Que ele se vire! - bradou Nhô Burguês com raiva.

Ao virar as costas, a mulher dele foi a cozinha preparar um fubá com água e sal, sem que o marido soubesse. Ela põe numa vasilha no chão pro cão comer. Pobre comeu desesperadamente.

- Pobrezinho... Come... - olha com piedade a mulher.

Depois de limpar a vasilha, o cão deita junto a porta da cozinha, agradecido. Nhô Burguês, ao ver o cão deitado, implica com ele:

- Sai pra lá Pobre! Não quero cachorro aqui perto da cozinha, não!

Pobre sai. O homem olha com desprezo. A mulher pergunta:

- Por que trata Pobre tão mal?

- Porque ele tem essa cara de pidão!

Ela balança a cabeça em reprovação.

A noite cai e uns homens encapuzados tentam roubar os botijões de gás. Pobre vê e começa a latir. Os homens tentam bater nele. Pobre espanta um dos homens, mas o outro acerta o cão com uma paulada. O cachorro grita mas mantém firme latindo. Nhô Burguês ouve tudo e sai pra fora de casa. O homem assustado, cai, rola e arrasta. Depois sai correndo abandonando o botijão. Eles fogem pelo mato. Nhô Burguês olha pro cão e agradece:

- Muito bem Pobre! Gostei de ver! Arriscou sua vida pela comida que recebe. Muito bom!

Pobre abana o rabo. Ele pensa que Nhô Burguês agora gosta dele. O dono da casa guarda os botijões e volta pra dentro de casa, batendo a porta na cara do cachorro.

A noite fria passa e Pobre fica de fora da casa, pois além de nascer pobre, nunca estará em vantagem com o Nhô Burguês...

Glaussim
Enviado por Glaussim em 09/06/2020
Reeditado em 12/09/2022
Código do texto: T6972678
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2020. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.