Palavras que já eram suas

Descia a escada vagarosamente, era terça-feira e ali se tinha o inicio de alguma coisa. Poderia ser qualquer coisa, até mesmo o início do fim.

As pernas magrelas, extremamente esqueléticas da garota, levavam a passo a passo pela descida que chegaria ao início, ou ao fim. Do que? De alguma coisa.

Ao chegar ao início (ou fim) da escada, respirou fundo com a ajuda de seus minúsculos pulmões para retomar todo o ar que, ela sem se cansar deixou no decorrer de seu trajeto, trajeto esse que era indefinível. Mas será que ela retoma o ar? Ou ele já pertence à respiração de outra pessoa? Ela pensou que: cada partícula de ar que um dia fora dela, hoje pertence à alguém que carrega consigo, ela, sem ao menos saber dela lá, sem se quer senti-la. Sentiu-se importante, afinal, poderia uma minúscula partícula que um dia habitou ela estar em qualquer pessoa do mundo, em todas as pessoas do mundo. Mas o mundo é muito grande, e ela sabia.

Ela sabia sobre muitas coisas, afinal, já tinha 7 anos de idade. Sua mãe sempre dizia isso, ela se recordava de um dia fazer uma pergunta e a progenitora respondê-la dizendo que a resposta já era sua. O que era incrível, pois para ela, uma das maiores riquezas do mundo era essa: ter a resposta como sua sem ao menos sabe-lá na ponta da língua. Elas todas, as palavras, estavam escondidas no céu da boca, onde se há inúmeras constelações de consoantes e vogais que esperam todos os dias para brilharem na nossa voz. Ela sabia.

Sua caminhada agora era envolta por diversas pessoas, várias delas, caminhando depressa nas ruas ou devagar com pressa, como ela preferiu pensar. Seria uma caminhada bem árdua, seu destino era muito, muito distante, e ainda tinha muito para ser revelado a ela no entrelaçar das pessoas, que caminham devagar com muita pressa na vida.

Cinco casas, eram exatamente cinco casas que distanciaram a sua morada do destino final, que já estava mais do que predestinado. Sua mãe disse-lhe que era um trajeto que requer muita responsabilidade e habilidade, e ela sabia, mas agora tinha de concordar e poderia ver o mundo todo nas suas idas e voltas.

Parou em frente ao prédio muito colorido, e que era enfeitado com desenhos e objetos que nesse mundo ela nunca vira antes, talvez em outro fosse mais comum, pensou...

O sol baixo que brilhava muito e refletia grandiosamente o tom de sua pele, na sombra seu cabelo black refletia uma coroa. Ela continuou parada, será que ousaria entrar naquele lugar desse mundo? Tinha quase certeza que iria gostar mais de um lugar que estivesse em algum outro mundo, algum daqueles que estão no mundo apresentado nas histórias contadas por sua mãe algumas vezes durante a semana e que parecem interessar muito mais, afinal, eram frequentados por fadas e claro os piratas, eles também tinham sua participação no mundo.

Pensou em voltar, pensou na mãe. O que ela diria? Certamente ficaria muito zangada já que todos os dias ela dizia para ter coragem de trilhar seu próprio caminho, conquistar alguma coisa (à qual ela não podia se lembrar das palavras) e ser alguém. Mas ela já não era? Era. Ela sabia que era alguma coisa, o que era? Isso as palavras ainda não tinham revelado, ainda estavam no céu da boca, certamente esperando a noite chegar, para que elas pudessem surpreendê-la com algum brilho na voz completamente novo. Ser alguém claramente era se tornar parte de um mundo, como o dos livros, afinal, as princesas só se tornam alguém porque estão no mundo delas, e ela com certeza sabia.

Ela não voltou para casa, mas quis. Entrou naquela sala rodeada de outras pessoas, agora menores, muito parecidas com ela, mas tão diferentes. De que mundo eles vieram? Todo dia ela se perguntava, mas já sabia, pois assim como as palavras, as respostas já eram suas.

sarovisk
Enviado por sarovisk em 01/08/2022
Código do texto: T7572825
Classificação de conteúdo: seguro