Uma hora tudo se resolve

- Você sabe muito bem que eu não posso fazer isso! (levanta as mãos para o céu)

- Só por que você não quer! Era mais fácil...( braços cruzados, expressão indefinível)

- Tudo é fácil falando. Como dizia minha avó, conversa é bafo de boca, mas ali na hora, na bucha, na hora do apavoramento eu quero é ver. (gesticulação intensa, as mãos vagam no espaço entre os dois)

- Mas, veja só, na prática você já está fazendo... (balança a cabeça)

- É, só que ninguém sabe, a não ser você. E você não está ajudando nada, sabia? Fica só falando, faça, faça...como se fosse fácil, como se eu pudesse. (chora)

- Ah! Não chora.(expressão de condoída ironia)

- Choro, choro e choro! Pronto, não posso mais chorar é? (raiva, mal expressa nos olhos molhados)

- E de que adianta? (as mãos pendem)

- Não adianta! Ai é que está, não adianta nada, mas é só isso que tenho feito nos últimos dois anos. (a face molhada agora escondida)

- Tá bom, tá bom! Liga não, uma hora tudo se resolve.

(os braços enlaçam o corpo que treme entre soluços, a cabeça baixa no peito e há um caminho de pelos louros que a luz difusa do quarto reflete, deixando que a imaginação vagueie até o profundo poço do umbigo e o mais além.)