O Voo.

Sentiu seu cheiro doce de longe.

Saltou em direção a avenida, desviou-se de pessoas apressadas

Ziguezagueou entre os carros, esbarrou nas brasas de cigarro enquanto ainda não podia vê-la, só senti-la, seguia pelas esquinas,

Um rasante à direita, mas agora outros cheiros misturavam-se e confundiam-no, tivera que conter-se para não perder o rumo, resistiu a máquina de sorvetes que pingava suculenta, sabia que era doce, mas também sabia que não era a única, e foi em frente, esquivando-se como podia do obstáculos impostos pelo caminho, seu instinto tão certo como a mais feliz das previsões o indicava o caminho correto.

Ao vê-la pela primeira vez, pôde reconhece-la como a única. O motivo de ter deixado tudo parar trás, a razão de ter contrariado sua natureza, estava ali, a alguns metros de distância. Agora não havia porquês, apenas seu cheiro, doce, doce de morrer, e o calor que parecia aumentar a medida que se aproximava; e ela, como se captasse, como se sentisse seu desejo impetuoso, transcedental, parou no ponto de ônibus e deslizou sua mão pela nuca desnuda sentindo a umidade de sua pele, tirando o excesso de suor, ele agora bem perto pôde vislumbrar o escarlate de suas unhas, que de certa forma foi o sinal de que ela o aguardava, estava pronta para recebê-lo.

Inebriado por aquele cheiro inexplicável, que representava o mais próximo que poderia chegar do amor, pousou na gola de sua camisa listrada e sentiu vontade de morrer.

Melissa sentiu a picada e passou a mão novamente pelo pescoço, recolhendo o inseto que contorceu-se na palma de sua mão, "combina comigo", pensou ao notar as listras pretas e amarelas do moribundo.

De alguma forma, ele pôde entendê-la, também quando sentenciou "pena que vai morrer", desfecho que ele próprio já desconfiava, mas já não importava, havia deixado sua marca, fora seu primeiro, ela seria sua única.

Então, num último esforço, bateu asas e tocou seus lábios, doces, doces, e numa queda livre caiu, quicou na guia quente e morreu feliz na poça suja, suja.

*Para Mel, para quando puderes rimar amor com dor, sabendo que vai além de uma rima ingênua.

Com amor, tio Má.