Odisséia-mirim

Há anos não nos víamos. No segundo grau estudamos na mesma escola técnica. Não fazíamos o mesmo curso e ingressamos em anos diferentes, mas nos conhecemos numa das turmas em que eu adiantava umas matérias.

Eis que o encontro num churrasco de campanha. Sempre vou a esses churrascos, gosto de reaver um pouco do dinheiro que pago em impostos, ainda que seja em lingüiça semicrua e refrigerante quente.

Nos cumprimentamos e ele perguntou o que eu andava fazendo, contei-lhe e ele me perguntou onde eu trabalhava, disse-lho e ele perguntou quanto eu estava ganhando, mais uma vez dei-lhe a informação, já acostumado ao tipo de interrogatório que se faz nesta cidade sem tato.

Mas ele em seguida disse que estava me perguntando todas essa coisas porque:

"Terminei o curso técnico, mas não peguei o diploma porque não levei o comprovante do estágio obrigatório, embora eu tivesse feito o estágio. Depois fui fazer agronomia, mas o curso era integral e não tinha tempo pra trabalhar, abandonei no segundo ano. Depois fui traficante por cinco anos e em seguida fotógrafo por três anos. Agora sou agente da polícia federal e ironicamente trabalho no combate ao tráfico."

Assim, sem pausas, me resumiu em menos de um minuto o que acontecera na sua vida nos últimos 15 anos, trocamos mais umas palavras e ele sumiu no meio do povo, provavelmente atrás de mais um copo de refrigerante quente com lingüiça.