Garganta
Aquilo já me enchia. Encostado na cama e passando despercebido por canais abertos e fechados da televisão, uma dor de cabeça fraca me atormentava, mas esse não era o problema.
O problema era a dor de garganta.
Qualquer movimento brusco com os músculos do pescoço era semelhante à uma garrafa quebrada tentando passar com força por ali.
Mesmo uma gota de cuspe que tentasse descer pra tentar lubrificar o cú que virou minha faringe, parecia que tinham insetos me comendo.
Cansado de doer-me com cada tragada de cuspe, deixei três copos ao lado, na escrivaninha. O primeiro, para eu poder cuspir quando não mais coubesse na boca, tudo pra escapar de engolir qualquer coisa.
Estava na metade aquela nojeira e o quarto recendia àquele cheiro bocal horrível. Não era mau hálito, precisamente, mas um tipo de cheiro absurdo que se desprega do cuspe quando em contato com o oxigênio.
E ele só se mostrou terrível quando minha irmã entrou no quarto, graciosa e atenciosa, com meu remédio a tomar. O cheiro era porco e pútrido e ela, chegando mais perto de mim - e por consequência do copo e do cheiro - já ia vomitando em cima do meu peito. Fui mais rápido e antecedi seu gorfo com o segundo copo, vazio e justamente pra isso.
Até a metade e ela saiu correndo, tadinha.
Deixei o copo e peguei o terceiro, de água limpa mas não menos dolorosa do que o cuspe nojento. Botei o comprimido na língua, perto do abismo da garganta e dosei a água na boca. Engoli tudo junto, num esforço desumano e terrível. Arfei e guardei o copo.
Agora eu to aqui, sentado na cama com a boca extremamente seca e o olho pregado na tevê. Nada passa de interessante. Tenho que me distrair; minha garganta precisa de algo pra não virar pó, mas a dor me impedia de beber a água ou engolir meu próprio cuspe.
Visto o cheiro do quarto, desisti do cuspe e peguei o copo. Bebi.
Grosso demais, afinal.