Minutos

Não sabia, mas aquela era a última vez que lia para ela. Quase todas as tardes, sentava-se em sua poltrona predileta, envolta em muitas mantas, pois o frio, nos últimos tempos, resolvera fazer-lhe companhia. Sentava-se e esperava que lhe lesse mais um capítulo do livro que escolhera. Seguia a história com interesse, rindo e chorando conforme a narrativa lhe chegava. Naquela tarde, porém, dormira. Quando interrompi a leitura, para virar a página que acabara de ler, vi sua cabecinha, branca e bela, curvada para o lado. O sono lhe abatera. Por alguns instantes, fiquei paralisada, encantada pela visão daquela que me dera a vida e muito mais. Tão pequenina, tão delicada. O cabelo rebelde, contra o qual lutara a vida toda, caíra-lhe na fronte, prateando seu rosto. Seus olhos tremeram levemente, como se sentissem a intensidade de meu olhar. Abriu-os e perguntou-me:

_ Por que parou a leitura? Gosto tanto! Continue, por favor, minha filha.

Os minutos mágicos daquela tarde guardo-os como uma leitura inacabada.