MEGERA INDOMADA

Enquanto arrumava minha mala, meus pensamentos começaram uma corrida regressiva no tempo.

Tudo aconteceu no clube daquela pequena cidade do interior, quando a vi pela primeira vez. Foi como se um carrilhão executasse musicas angelicais. Ali estava a mulher que me acompanharia para todo o sempre. Apostei nisso.

O garçom, velho conhecido, que tantas e tantas histórias de amor já tinha ouvido de mim, e que certamente me vira de boca aberta na entrada do salão, já colocou em minha mesa favorita meu uísque preferido. Assentei-me, ajeitei a gravata italiana comprada em Ciudad del Leste,no país vizinho: Meus olhos não tiveram outro foco. Estavam ousadamente direcionados para aquela bela alemã com quase 1,85m, um porte atlético digna de nossas campeãs do basquete.

Por várias vezes enxuguei a baba e promovi o fechamento da bocarra. Em uma dessas ocasiões, penso tê-la visto sorrir. A quinta dose acabou bem no início de Al di Lá, com Connie Francis. Com gestos extensos, com todas as pontas dos dedos da mão direita, bem no estilo dos bandidos que bebem em pé em tabernas esfumaçadas de faroestes italianos, ajeitei o longo bigode negro. Levantei-me com a máscula fisionomia tipo Marlon Brando em “O Chefão”, prestes a mandar executar uns concorrentes da máfia italiana. Meu amigo garçom, apostou que a caixinha de hoje seria super gorda. Quando viu meu braço direito subir sinalizando uma dose dupla, saiu lépido em busca do líquido precioso. Atravessei o salão e aproximei-me da graciosa germânica. Mantive o rosto tipo bandidão da pesada quando a convidei para dançar com um levíssimo gesto de cabeça, apontando a pista de dança. Ela entendeu a mensagem e com um largo sorriso dirigiu-se a mim. O decote da jovem era bem generoso, e pude sentir aquele enorme par de seios, que mais pareciam bolas de basquete, esmagar meu nariz. Os maus pensamentos batucaram em minha mente mais que escola de samba. O que me acalmou, foi a sensata conclusão de que leite com uísque, não casam muito bem. Sábia conclusão.

Agora era só enxugar o abundante suor da testa. Enquanto isso ela estudava o cimo da minha cabeça e chegava a conclusão de que eu iria ficar careca, logo.

Mesmo sendo bem mais baixo que Elga, consegui levá-la ao altar. Mas os anos de doce fase passaram. De repente fiquei desempregado e Elga, que trabalhava numa companhia de segurança e mantinha a casa, resolveu mostrar as unhas. Por força das circunstâncias, virei dona de casa.

À noite, ouvia as reclamações sobre a limpeza da casa, sobre a lavagens das roupas, etc. Por várias vezes apanhei feio de Elga. Procurava fazer minhas tarefas da melhor forma possível. Em vão. Ela exigia perfeição. Comecei a ter medo da minha própria esposa, que começou um sádico rosário de castigos.

Meu primeiro castigo foi ficar um mês sem poder ir ao bar da esquina tomar aquela cachacinha com meus amigos. Fui agüentando. Ainda a amava muito. Mas, outros castigos começaram a surgir. Proibiu-me de participar das peladas de final de semana. Fui agüentando. Obrigou-me a assistir ao Big Brother durante três meses. Fui agüentando. Fui obrigado a ver, durante um bom tempo, o Programa da Márcia, a Praça da Alegria e a MTV. Ainda assim consegui a agüentar. Ontem, ao acordar, quase tive um enfarte. Ou melhorava minhas prendas domésticas ou teria que assistir durante um mês ao Zorra Total. Confesso, não deu para segurar. O volume escrotal já não me permitia eu fechar as pernas. Seria suicídio. Arrumei a mala e saí de casa na surdina, sereno, feliz e com uma resolução irredutível tomada. Decidi, urgentemente, alistar-me na Legião Estrangeira.

domingo, 4 de maio de 2008

Luiz Celso de Matos
Enviado por Luiz Celso de Matos em 31/05/2008
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