"Morena, Linda, Sensual, de Olhos Verdes" = Capítulo 53= =Romance=

Tudo que Eliane e Romero mais desejavam na vida era o casamento, mas um casamento com Romero adentrando a igreja com suas próprias pernas, sem auxílio de cadeira de rodas, bengala ou andador. Imaginar o momento em que chegasse ao altar dando passos normais, sem vacilações, sem dificuldades, era o que o animava a agüentar calado as verdadeiras torturas que eram as sessões de fisioterapia. Quando a dor era muita ele pensava em Eliane vestida de noiva e isso lhe servia como uma anestesia. Parcial, pelo menos. Eliane, por sua vez, sonhava com o momento em que isso aconteceria. Sonhava todas as noites e mesmo acordada. Contava os minutos para o que chamava de reinício de sua vida.

Uma vez Romero fez com que ela aproximasse o rosto da boca dele e segredou:

- Olha, amor, acho que está na hora de te contar um segredo: já estou andando tão bem que de vez em quando dou uma corridinha pela quadra, pela madrugada, só pra esquentar o motor.

- É mesmo? E porque não me contou antes?

- Medo. Pura e simplesmente medo, amor.

- Medo de que, meu crápula preferido?

- De ter que arranjar logo um emprego pra te pagar o que te devo. Devolver tudo que está gastando comigo esse tempo todo.

Eliane deu-lhe um carinhoso tapa na cabeça e exigiu:

- Saia correndo dessa cadeira, seu vagabundo, e vá pegar pra mim um guaraná gelado na padaria. Vamos, anda...

Os dois riram e Romero prometeu que logo estaria em condições de fazê-lo. Ela que esperasse mais um pouco. Um pouquinho só.

Eliane tinha absoluta certeza de que isso aconteceria em breve.

Wilson voltou dos Estados Unidos com a tia. Havia permanecido por lá durante quatro anos, durante os quais se encontrara com Eliane pelo menos umas dez vezes. Em duas ocasiões passara as férias no Brasil, nas outras a mãe fora visitá-lo e passear por Nova York e adjacências.

Ele era agora um rapaz alto, forte, vistoso, com maneiras discretas e elegantes. Refinado nos modos e extremamente bem informado sobre tudo. Pensava em fazer o que muito americano já havia descoberto que valia a pena: investir no Brasil. Receava apenas não se adaptar logo ao modo de vida de seu país de origem. Em Nova York, apesar dos riscos e da violência, tudo era previsível, mais organizado, mais de acordo com a nova pessoa em que se transformara o antigo delinqüente juvenil. Passaria, no entanto, pelo menos seis meses com a mãe e decidiria seu futuro durante esse prazo. Se julgasse que valia a pena, faria o sacrifício e ficaria por aqui mesmo. Em São Paulo ou no Rio de Janeiro. Em Santos, de maneira alguma. Julgava a cidade parada demais, com velhos demais morando nela.

Seis meses e duas semanas depois Wilson retornou aos Estados Unidos. Sozinho. A tia não queria mais sair de perto de Eliane e despediu-se chorosa do sobrinho, a quem se apegara como a um filho querido e ao qual ajudara a criar com muito carinho.

Na mesma noite em que Wilson embarcara de volta ao estrangeiro, Eliane recebeu um telefonema às quatro horas da madrugada:

- Alô. É dona Eliane quem fala?

Não reconheceu a voz, evidentemente disfarçada, e ficou apreensiva. Seria alguma notícia ruim sobre Wilsinho, meu Deus?

- É dona Eliane quem fala?

- É sim. Por favor, diga logo o que tem a dizer.

- Aqui é um de seus muitos apaixonados, um tal de Romero, que quer que a senhora venha correndo pra São Paulo. Venha voando baixo, batendo recordes, mas com segurança. Venha, Eliane, venha logo, pelo amor de Deus, amor. Estou andando! Estou andando! Andando feito gente grande e sem dor alguma, paixão de minha vida!! Venha depressa para me ver de perto...

Eliane achou que morreria de alegria. Desesperadamente ansiosa, saiu correndo para vestir-se e levou com ela o telefone que não se lembrara de soltar, arrancando-o da parede. Sem perceber, continuou com o aparelho na mão enquanto vasculhava doidamente as gavetas à procura da roupa mais fácil de vestir.

Quando percebeu o que fazia, riu muito, jogou o aparelho de qualquer maneira, e vestiu-se às pressas como nunca o fizera antes. Acordou a irmã, avisou que estava indo para São Paulo, para a casa de Romero e em pouquíssimo tempo saía celeremente da garagem do edifício.

A estrada vazia àquela hora da madrugada permitiu-lhe bater um recorde e em muito menos de uma hora de viagem parou à porta da casa do amado e o encontrou no portão à sua espera, chorando como criança, sem tentar disfarçar a emoção.

Abraçaram-se chorando muito. De felicidade, de alegria, de alívio, de gratidão a Deus pelo milagre custosamente alcançado. Só depois de muitos beijos e abraços entraram na casa e comunicaram ao resto da família. Escandalosamente, de acordo com o feitio de Romero.

- Ninguém acreditaria, amor, mas acordei sentindo sede, joguei as cobertas para o lado, fui até a cozinha, abri a geladeira e só aí percebi que não estava usando nada mais que as pernas até aquele momento. Quase caí sentado de tanto susto...

Romero pai chorou muito, dona Laura não largava o filho, e os irmãos pareciam doidos de tanta alegria. O dia seria todo de festa, mas as despesas correriam por conta dos Romero. Eliana já gastara demais com o filho deles e eles se sentiam cada vez mais constrangidos por isso.

Fernando Brandi
Enviado por Fernando Brandi em 12/06/2008
Código do texto: T1031016
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