CAMPINAS E O OUTRO LADO

Ao voltar para casa, antes de passar pelo Túnel da Fepasa, teve um pressentimento. Alguma coisa não estava bem. A sua cabeça latejava e, no peito, sentia uma dor. Era uma dor que não doía – oprimia. Ele não conseguia decifrar a sensação, mas sabia que não nada boa. Alguns metros atrás - cem, talvez -, tudo começara. Estava com medo e, agora, chegava à boca do túnel, uma passagem que lhe encurtaria o caminho.Mas seus passos estavam arrastados, as pernas pesavam, os pés pareciam de chumbo. Tentou lembrar o próprio nome, e não conseguiu. O que, meu Deus, estaria acontecendo?

Andara a manhã inteira procurando trabalho. Uma ou outra empresa recebera o seu currículo e, na maioria, ouvia dos porteiros: “não estamos fazendo ficha.” Teve fome e sede. Esta, nas torneiras das praças, saciara. O sol e a poeira transformaram o seu rosto numa máscara disforme e imunda, de olhos desalentados...

À entrada do túnel, a escadaria descendente parecia que o levaria a mundos estranhos - já não era o caminho de casa? A mente, confusa; o corpo, trêmulo; o suor, gelado. A dor que o oprimia, agora doía de verdade. A visão turvou-se. Procurou apoio nas paredes, tentou balbuciar um pedido de socorro às sombras que se desviavam dele - em vão.

Mal, muito mal, estava muito mal mesmo. Errou o primeiro degrau, escorregou, rolou escada abaixo...

Morreu.

Do outro lado do túnel, passantes deram meia-volta. Não iriam se arriscar. Optaram pelo Viaduto Cury, apesar dos riscos.