O catador de papelão ( parte l )


Sob a promessa de fazer fortuna na cidade grande, João, um menino franzino, de olhar vazio, fugiu de casa antes mesmo de completar os seus dez anos de idade. Ele fora convencido por um estranho, que estava de passagem em sua cidade, a deixar a sua mãe e mais quatro irmãos para realizar o seu grande sonho: o de sair do interior que nada lhe prometia, para trabalhar até formar um montante, o suficiente para assegurá-los. Ele estava cansado de ouvir os soluços de desespero de sua mãe ao ver o sofrimento dos seus filhos passando fome. Na cidade grande, ele fora obrigado a viver como pedinte, nos faróis, dia e noite. Sem receber um centavo, decidiu-se por fugir do algoz que o escravizava e foi buscar o seu próprio caminho.

Acreditando no sonho que ele buscava, a esperança de vencer o motivava a não desistir da caminhada. Um certo dia, quando ele viajava a bordo de um caminhão de carona numa tarde de domingo, avistou um imenso aterro sanitário. Pediu ao motorista que parasse, que ali ele saltaria, e assim foi...

De pé às margens da estrada vazia, a coragem era a única a lhe fazer companhia. Depois de analisar o território, e de muito pensar, decidiu que dali tiraria a sua fortuna. Então, apressou-se, pois logo escureceria. Reuniu grandes chapas velhas retiradas do lixão e fez a sua mansão - como ele batizou o pequeno barraco. Antes mesmo de cair a noite, estava tudo pronto! Visto de fora, não era nada bonito, mas, ali ele se abrigaria à noite e em dias de mau tempo. Depois de uma longa noite de sono dormindo sobre folhas de papelão num sono tranqüilo, como há muito tempo não dormia, finalmente amanheceu o dia! Assim que o sol apontou, veio o espanto!

Ele não estava sozinho. Havia homens, mulheres, crianças de todas as idades e até mesmo as de colo embrulhadas em velhas mantas. Todos vasculhavam o lixo como animais selvagens. Ele achou que estava no meio de um pesadelo que o arremessava para o passado, onde aquelas mulheres e crianças maltrapilhas representavam com perfeição a sua mãe e seus irmãos na luta pela sobrevivência. A triste visão trouxe-lhe, para o presente, a dor insuportável do arrependimento que o fez chorar.


CONTINUA...