Voltando tarde pra casa

Eles estavam à procura de uma nova forma de amar, a procura de um jeito diferente do casual seguido pelos nossos pais. E eles estavam rodando as altas horas sem ter para onde ir à procura de algo que não conheciam e talvez jamais conhecessem.

Eles: Julieta e Adam eram velhos amigos do tempo de veraneios nas praias do litoral do nosso Estado, a casa que meus pais alugavam sempre ficava ao lado da dos pais de Julieta que sempre levava Adam sua fiel companhia, seu fiel companheiro, seu fiel e único amor.

Eu tinha sérios problemas com namoros e como fazerem com que eles durassem mais de três ou quatro meses, eu admirava o amor deles, Adam e Julieta, na nossa turma eles eram os namorados verdadeiros daquela nossa turma onde todas as meninas ficavam comigo e com os outros.

Eles se amavam, e eu os admirava, mas infelizmente parecia que aquelas voltas tarde pra casa não dariam em bons resultados, pois algo invadia a vida deles e eu ainda não sabia o que realmente era. Adam era praticamente um irmão, um grande amigo e ele a cada dia estava mais longe parecia que flutuava por entre as nuvens meio lerdo, mas com problemas para resolver.

Adam parou de ligar-me durante alguns dias e a noite quando eu o ligava ele geralmente já estava em alguma festa com som alto e na maioria das vezes não atendia o celular, parecia que tanto ele quando ela estavam sendo sugados para um grande abismo.

Estava entrando na sala de aula quando meu telefone toca, então atendo antes de entrar na sala, era ele: Adam, ele estava com a voz ofegante e me perguntou onde eu estava, eu lhe disse e ele pediu-me para ir as pressas ao apartamento onde ele morava, parecia não estar muito bem, não pensei duas vezes e sai da escola, peguei o ônibus e fui ao encontro do meu amigo.

Não tardou mais de vinte minutos e eu estava à frente da porta do seu apartamento, era o número 1214 de um prédio de classe média-alta de um bairro nobre da capital, meu coração parecia atormentado, pois parecia que iria enfrentar algo terrível ao ultrapassar aquela porta.

Chamei: “Adam abra a porta”, porem nem um som saia lá de dentro, ao não ser o som da vitrola que tocava uma canção do Aerosmith muito antiga que eu não me lembrava pelo nome, então chamei varias vezes até decidir que entraria por bem ou por mal naquele apartamento.

Tentei arrombar a porta, mas foi em vão, pois não possuía força para tanto, meu telefone tocava, era o pessoal da escola, não atendi, apenas ignorei os chamados, mas depois de alguns minutos olhei novamente o telefone e havia uma chamada perdida de Julieta, retornei a ligação, ela atendeu me perguntando onde eu estava, lhe contei tudo e ela pediu que esperasse pois tinha a copia da chave do apartamento, ela também parecia nervosa.

Sentei com minhas costas encostadas na porta do apartamento, tentei ligar pra Adam, mas, ele não atendia, passou-se um pouco mais de dez minutos e Julieta invadia o corredor correndo com a chave na mão.

Ela estava muito nervosa então eu a - abracei e peguei a chave das mãos dela e abri a porta, entramos correndo, ela correu para verificar os quartos e eu fui à sala onde ficava a pequena biblioteca e a vitrola que já não cantava mais a canção do Aerosmith, quando ultrapassei a porta, lá estava Adam deitado por cima do tapete.

Não sei o que aconteceu naquele momento, acho que os meus sentidos foram estraçalhados, o planeta se partiu ao meio e todos os nexos foram rompidos, nada naquele momento fazia sentido, Adam estava deitado no tapete, talvez morto, e aquilo era muito para que eu pudesse assimilar.

Aproximei-me de forma esquisita, vi seu pulso e seu coração ainda batia, coloquei sua cabeça nos meus braços e ele abriu lentamente os olhos, chamei por Julieta e disse pra ele segurando sua mão que: “tudo iria ficar bem”, ele pediu-me para prometer e eu lhe prometi, Julieta entrou na sala e desaguou em lagrimas. Abraçamos-nos os três, podia ser a ultima vez que teríamos aquele momento, ninguém falou nada durante uns cinco minutos, mas todos sabiam o que o outro sentia.

Julieta se levantou e ligou para a ambulância ainda nervosa e entre soluços pediu socorro, disse onde estava e desligou o telefone.

Adam delirava, e falava “hoje vamos chegar tarde em casa”, eu estava desesperado mas, fui tomado por serenidade pois se eu me alterasse talvez Julieta ficasse mais mal.

Coloquei Adam em meus braços, ele não pesava muito, parecia bem mais magro do que antes e isso era algo que eu não tinha notado antes.

Levantei-me com ele, ele com os olhos semi-abertos, reparei que a veia do seu braço esquerdo estava furada e vi uma seringa em cima da mesa da vitrola, possivelmente estaria a algum tempo usando heroína e isso com certeza estava o destruindo, Julieta talvez tivesse experimentado algo, mas logo caiu fora deste jogo de morte e azar, mas infelizmente não conseguiu tirar Adam deste buraco.

A ambulância já se encontrava lá em baixo e eu já tinha decido com Adam e Julieta pelo elevador. Quando chegamos lá em baixo ajudei a colocar Adam em uma maca enquanto Julieta subia pra dentro da ambulância, colocaram ele pra dentro e me perguntaram o que aconteceu, eu olhei para Julieta e percebi em seus olhos aquela vergonha por ter deixado ele chegar neste estado, não iria mentir para o técnico de enfermagem e falei de forma curta e triste: “foi possivelmente heroína”, ele franziu a testa e disse que eles fariam o máximo para ajudá-lo, mas se fosse por uma dose muito elevada talvez ele não suportasse.

Não subi na ambulância, assim como meu celular cheio de chamadas não atendidas estava o meu coração transbordando de perguntas e pensamentos.

Vi eles partindo e soube que naquela noite talvez Adam não chegasse tarde a casa, porque desta vez ele poderia não voltar, talvez naquela noite fosse o fim e seus pais não poderiam mais reclamar de suas voltas, pois naquela noite ele poderia não mais voltar.

Modesto C. Batista Neto - www.orelator.blogspot.com