CAPINA NEGA CAPINA

CAPINA NEGA CAPINA

Entre os anos de vinte a trinta e tantos, as mulheres de vida vadia da Vila de São João, sabiam bem qual era o seu lugar; o delegado Zurico passou uma linha invisível separando certa zona da vila e deixou bem claro que aqueles lados, eram para as referidas damas da noite e que lá elas deviam permanecer para não ofenderem com sua presença, as distintas famílias do lugarejo.

A referida linha divisória era invisível para muitos, mas para as alegres mulheres não era, porque as que se atreviam a se esquecer dela recebiam duro castigo do mal encarado delegado; uma vez por semana, aquelas moças podiam sair de sua zona para irem a missa e ao cinema, mas na igreja elas ficavam no ultimo banco e no cinema em cadeiras reservadas em um canto mais afastado.

Nos dois lugares as damas se acomodavam sob severa vigilância de Zurico; Uma vez ou outra as donas se rebelavam, atravessavam a divisa e andavam livremente pelas ruas de São João, mas a liberdade durava pouco, só o tempo de algum xereta ir avisar ao delegado, este se enfurecia e saia a caça das faltosas, que eram presas e no dia seguinte recebiam a invariável e difícil punição.

Eram colocadas de enxada nas mãos a capinar as ruas do lugar, um soldado montava guarda de fuzil na mão e cantil a bandoleira, pois a única regalia das penitentes era um gole de água a cada duas horas de capina; o castigo durava oito horas, finda as quais as mulheres eram levadas de volta a cadeia, para passarem mais uma noite de desconforto, dormindo no chão duro da cela.

No dia seguinte recebiam severa advertência do delegado e eram levadas de volta a sua zona aonde chegavam quase mortas de cansaço, com as mãos estouradas e jurando nunca mais desobedecer as ordens do façanhudo delegado Zurico, da Vila de São João; metade da comunidade, quero dizer a parte feminina estava de pleno acordo com os métodos de disciplina de Zurico.

A parte masculina discordava e malhava o delegado pelas costas, porque frente a frente ninguém era besta de criticar suas atitudes medievais; abençoado por umas e amaldiçoado por outros, o delegado levava as coisas a seu modo e São João era uma vila de ruas limpas e senhoras respeitadas, o que nos dias de hoje já não acontece com tanta freqüência.

Maria Aparecida Felicori{Vó Fia}

texto registrado no EDA

Vó Fia
Enviado por Vó Fia em 21/09/2008
Código do texto: T1189407
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