TROCANDO AS URNAS

TROCANDO AS URNAS

Quando a família Lobato se reunia por qualquer motivo, coisas diferentes do usual aconteceriam com toda certeza; eram boas pessoas, trabalhadores, honestos e muito religiosos pois eram todos evangélicos, de igrejas diferentes na verdade e com pontos de vista diferenciados sobre a Sagrada Bíblia, mas fieis a ela e por isso seus encontros sempre foram abençoados com os mais belos hinos e como todos possuíam belas vozes, era realmente uma beleza.

Alegres ou tristes os Lobatos não se cansavam de louvar ao Senhor, mas isso não impedia que eles se metessem em grandes confusões porque fazia parte de sua natureza as brigas e desacertos, mas na maior parte desses entreveros as coisas terminavam em boas risadas porque eram todos amalucados e muito engraçados e quando a irmã Julita faleceu aconteceram coisas incríveis durante o velório, mesmo para a surpreendente família foi um exagero aqueles eventos.

Julita era uma morena bonita, saudável, muito alegre e de repente caiu desmaiada, correram com ela para o hospital mais próximo, mas ela morreu assim que chegou ao mesmo; foi um susto

para todos e o jeito foi providenciar tudo para um velório de acordo com a importância daquela dedicada irmã de fé; a igreja foi enfeitada com as mais belas flores e uma urna muito bonita foi comprada de uma conhecida Funerária que colocou nela a falecida e a ornamentou.

O salão do velório foi pequeno para a família enlutada e todos seus amigos, e o dia avançava na mais completa ordem com muitas orações ao som de lindos hinos até que chegou um irmão da morta e se espantou quando lhe disseram o preço da urna, ele achou um absurdo e disse: vou ali, já volto e foi direto para uma outra funerária e descobriu uma urna idêntica a de Julita pela metade do preço, ele comprou, pagou e colocou na traseira da caminhonete que conduzia.

De repente o irmão esperto entrou no salão carregando a urna e disse: vocês foram roubados e vamos devolver essa urna para aquele ladrão, apoiado pela família toda trocaram a recém morta da urna cara para a mais barata, colocaram novas flores e mandaram chamar o dono da primeira funerária que chegou cuspindo marimbondo de tanta raiva e foi dizendo: não aceito devolução coisa nenhuma, isso é uma coisa nunca vista e as flores estão estragadas seus malucos.

Quando o homem terminou de falar, recebeu as flores no meio da cara atiradas por Luciana irmã da morta, esse foi o sinal para o massacre: todos os parentes da falecida partiram para cima do papa-defuntos que apanhou tudo que tinha direito e até o que não tinha, o jeito foi pegar a urna usada e sair dali correndo para não morrer; encerrado o turbulento episodio, se acalmaram e recomeçaram as orações e os belos hinos em honra de Julita e em louvor a Jesus.

Tudo isso aconteceu na parte da manhã e como o enterro estava marcado para o final da tarde sobrava um bom tempo para a irrequieta família aprontar mais alguma confusão; um rapaz muito elegante e com ares de moçoila tocava o piano para acompanhar a cantoria, algumas parentas da morta olhavam para ele cochichavam e riam, o músico se sentiu ofendido e disfarçadamente chamou a policia pelo celular, em poucos minutos a policia chegou e chegou brava.

O sargento chegou perguntando o que estava acontecendo e João outro dos irmãos respondeu que ali era um velório e que a policia estava sobrando, o sargento revidou com um empurrão e o mundo desabou, porque os truculentos Lobato atacaram de todos os lados e a guarnição da radio patrulha foi pequena para conter todos e se retirou em correria na maior humilhação; o coitado do músico tentou escapar e não conseguiu levando uma surra enorme para deixar de ser fofoqueiro e maricas.

Felizmente chegou a hora marcada para o enterro, e todos voltaram civilizadamente aos hinos e orações para garantir um ótimo lugar na morada de Deus Pai para a pranteada e saudosa Julita; depois do sepultamento voltaram para casa, e como bons descendentes de imigrantes italianos prepararam um caldeirão gigantesco de sopa minestroni que tomaram bem acompanhada por um ótimo vinho tinto e grandes pedaços de pão italiano para recuperar as forças perdidas naquele histórico velório.

Maria Aparecida Felicori{Vó Fia}

Texto registrado no EDA

Vó Fia
Enviado por Vó Fia em 14/10/2008
Código do texto: T1227235
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