LEILÕES E LEILOEIRO

LEILÕES E LEILOEIRO

Dias santos em Vila de São João era sempre motivo para grandes festejos; não importava qual era o santo do dia porque todos recebiam a mesma atenção, aquele era ou parecia ser um povo devoto, mas a verdade mesmo era que a alegre comunidade adorava festas e por conta disso comemoravam os santos de A a Z sem faltar nenhum, mas mesmo entre anjos e santos existiam alguns mais apreciados.

No caso de São Sebastião por exemplo, a festa começava com uma novena e durante aqueles abençoados nove dias as pessoas compareciam em massa e rezavam com muita fé, uns fazendo pedidos e outros agradecendo as graças já alcançadas; depois das rezas os senhores e senhoras aproveitavam para colocar a prosa em dia e os jovens para namorar nos bancos da pracinha em volta da igreja.

Tudo isso era muito agradável, mas melhor ainda era o encerramento da festa, porque depois da missa solene acontecia o esperado e divertido leilão; todos se vestiam com suas melhores roupas e colaboravam com prendas para serem leiloadas, os agricultores doavam sacas de café, de arroz, milho ou feijão e os criadores de animais compareciam com bezerros, porcos, cavalos e mais uma enorme variedade de animais de todos os tipos.

As senhoras levavam bandejas muito enfeitadas cheias de bolos, pudins e docinhos, além de animais domésticos como galinhas, patos, coelhos, cachorrinhos e cestos com as melhores frutas de seus pomares, mas a atração principal do evento era sem sombra de duvida Seu Gegê o leiloeiro; pessoa muito alegre e espirituosa ele fazia as pessoas arrematarem os brindes com preços altos, mas o dinheiro gasto não pagava pela divertimento proporcionado por ele.

Seu Gegê era um homem alto e desengonçado, cabelos ralos e claros, vestindo eternamente uma calça de brim kaki, camisa de um xadrez avermelhado, com suspensórios de tecido segurando a calça e botinas de couro cru; como seus dentes se foram ele usava uma dentadura grande demais para suas gengivas e falava com os dentes cerrados para não perde-la; quando ocupava seu lugar na barraca do leilão ele examinava os brindes, fazendo cara feia para os simples.

Depois dessa vistoria ele batia palmas e dizia: vamo lá gente, ta começano o leilão, apontava para um bezerro e dizia: sô Nirso faiz o lance e se o lance era baixo ele gritava: só isso? mili, mili mi reis de cruzero num é nada sô Nirso, isso é lance de fêmea e continuava nesse tom até conseguir o preço que queria; sua voz presa por causa da dentadura causava risadas dos presentes, mas ele não se ofendia e continuava com seu jeito engraçado até vender tudo pelo preço certo.

Seu Gegê foi para o andar de cima, depois de vinte anos como leiloeiro oficial de São Sebastião e demais Santos festejados na Vila de São João, mas os leilões jamais foram os mesmos sem sua alegria, sua fala amarrada pelas dentaduras folgadas e seu senso de humor; a falta de Seu Gegê foi sentida também no faturamento pois a renda dos leilões caíram muito com sua falta, a fé continua em alta e o dinheiro em baixa; enquanto isso a comunidade reza pela vinda de um novo Seu Gegê, mesmo com dentaduras chacoalhantes e fala amarrada.

Maria Aparecida Felicori{Vó Fia}

Texto registrado no EDA

Vó Fia
Enviado por Vó Fia em 21/10/2008
Código do texto: T1239400
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