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Comprei um desodorante que não usava há tempos. Ah, seu perfume, o quanto ele me faz lembrar de outra cidade!

A cidade com prédios verticalizados e pessoas mais horizontalizadas, com shoppings e camelôs e enxorradas de carros populares, a preços populares, e comidas típicas, populares no Brasil todo. Sua gente mais bonita e menos arrogante, seus sorrisos um pouco mais demorados, seus mendigos famosos e honrados, mais famosos que os políticos safados. As devoções corridas no meio do trânsito sinal-da-cruz ao passar por uma igrejinha afogada no concreto, em trânsito, sempre em trânsito, em viadutos e ruas em construção e desconstrução constante. Ah, esse desodorante me lembra tantos amores, tantos bares simples, o pagode, o blues e o rock'n'roll todos abraçados no mesmo lugar.

Ah, esse desodorante me lembra qualquer cidade, menos Brasília. Brasília não tem odor.