A negra face do Amor

Era uma tarde chuvosa e fria. Ela sabia que sofreria muito aquele dia, mas não perderia aquilo por nada. Colocou seu traje preto, numa intenção que julgara marcante, na tentativa de mostrar a ele que sentiria demais a sua partida. Caminhou lentamente até a porta principal, onde o encontraria para expressar suas considerações finais. Palavra engraçada essa, considerações. Considerar o quê, aliás? "Olha, estou muito triste por saber que não o verei mais,aceito a sua decisão e saiba que se decidir voltar estarei aqui, farei tudo para te ver feliz, como ontem, hoje e sempre".

Todos se colocam a postos e algumas horas depois, o grande amor da sua vida aparece. Agradece, diz que sentirá falta de todos e que foi muito bom o tempo que passaram juntos. Em seguida, beija e abraça um por um (éramos quase trinta), reiterando a certeza de lindas recordações e saudade infinita que o fará certamente questionar o porquê desse seu passo aparentemente acertado. Ela se encotrava no outro extremo de uma fila horizontal, aquelas estilo "paredão". Queria ser a última em quem ele tocaria, queria que o seu cheiro fosse com ele e representasse o que estava deixando para trás (ela). Cada passo dele em sua direção apertava mais seu coração e a dor em seu âmago fazia crescer seu desespero. "Nosso último abraço me fará desfalecer. Ainda sim, o quero".

O momento chegou. Ele parou, olhou para ela (mas não diretamente, se lembrou depois), pois vinha chegando mais uma amiga. Ele, empolgado como uma criança que ganhara seu maior presente, se lançou num abraço longo e aterrador (isso aos olhos de nossa pequena guerreira, já cansados de tanto chorar), não esquecendo de expressar quão feliz estava por sua chegada repentina, ao que a moça respondeu, 'tardo, mas não falho. Aliás, boa viagem, não se esqueça de escrever'.

Depois disso, nada. Ele se virou, acenou a todos e se dirigiu à saída.

"Isso foi há trinta anos", ela se lembra. Sabe que foi a sua maior lição em vida. "O sofrimento velado nada mais é do que oco, platonismo meramente estúpido".

Angélica Nicolosi
Enviado por Angélica Nicolosi em 10/11/2008
Código do texto: T1275595
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