MERCADO

- Moeda, tio?

- Hein?

- Moeda?

- O que é que tem, moeda?

- O senhor tem alguma moeda?

- Tenho algumas, sim, que a moça do caixa acabou de me dar, no mercado.

- E o senhor me dá?

- As moedas?

- Claro, o senhor não me arruma umas moedas?

- Não, claro que não. Para que é que você quer moedas?

- Porque eu preciso.

- Ah, mas isso eu também preciso. Eu uso estas moedas. Elas me fazem falta, não posso ficar por aí distribuindo as minhas moedas para o primeiro que aparece e diz que precisa. E outra, meu filho, hoje em dia todo mundo precisa.

- Não quero saber dos outros, tio, quero saber de mim. Se eu não arranjar dinheiro acabo passando fome.

- Mas isso é com todo mundo, não é só com você. Por que é que você não trabalha?

- Mas eu trabalho! Venho todo dia aqui na entrada do mercado tomar conta dos carros, inclusive do seu, se o senhor quer saber. Pode ir lá conferir, tio, o senhor vai ver que o seu carro está seguro, inteirinho, sem nem um arranhãozinho sequer. Vai lá, pode ir lá ver.

- Carro?

- É, vai lá olhar.

- Mas eu não tenho carro, meu filho. Com a aposentadoria que eu ganho não posso me dar a este luxo. É muita despesa. Venho comprar neste mercado porque moro aqui perto, venho a pé mesmo.

- Tá, tio, então sai fora, não complica o meu lado. Segue a sua correria, que eu sigo a minha.

- Mas eu não estou complicando nada, meu amigo. Você é que veio me pedir dinheiro.

- Tio, é o seguinte. Presta atenção. Eu pago pra trabalhar aqui, entendeu? Esta área tem dono, e eu tenho que pagar aluguel para o dono da rua.

- Mas rua agora tem dono?

- Se liga, tio. Todo dia eu tenho que jogar um troco na mão do dono da rua pra eu poder ficar aqui, tomando conta dos carros dos bacanas. E não posso ficar perdendo meu tempo com um sujeito que não tem nem uma moedinha no bolso pra me dar.

- Mas eu tenho, só que não posso dar porque vou usar para comprar pão. E outra coisa, quem foi que disse que eu sou obrigado a ficar dando dinheiro pra você?

- Você não é obrigado a me dar nada, tio. Sai fora, senão quem vai sair prejudicado é você.

- Prejudicado por quê? Você vai me assaltar, por acaso? Vai me agredir? Me processar?

- Puta que pariu...

- Calma, calma, não precisa ficar zangado. Já estou de saída, a patroa está em casa me esperando. Agora, vem cá, só mais uma coisa: bonito, o seu tênis, hein?

- Obrigado, tio. Agora se manda.

- Quantos desses aí você tem?

- Com esse, três. Por que quer saber?

- Porque eu só tenho um, justamente esse aqui, que estou usando. E ainda por cima já está começando a abrir o bico, tá até furado na sola.

- Ê, tio. O senhor tá ferrado. Pior que eu, pô.

- Pois é. Mas ainda assim não fico por aí pedindo dinheiro para as pessoas no meio da rua.

- O mundo é dos espertos, tio. O senhor já devia saber disso.

- Pois é, já me disseram isso um monte de vezes. Mas quer mesmo saber? Nunca me convenceram. Ih, olha lá!

- Que foi?

- O dono da Mercedes preta conversível tá saindo.Corre lá, senão você perde a caixinha.

- Falou, tio!

- Isso, vai lá, moleque. Corre. Não deixa o bacana ir embora sem te dar uma moeda. Deixa que eu tomo aqui do ponto pra você! Quer dizer, pra você, não. Pra nós.

Benilson Toniolo
Enviado por Benilson Toniolo em 26/04/2009
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