Conto de um Fantasma Traído

Foi na morte, aquilo que foi na vida. Portanto, partiu desta chorando, ajoelhado e humilhado. Pensou ainda antes de seu carrasco cortar o fio que segurava a guilhotina, "Maldito, logo hoje que pensei em reagir..". Tão tardia foi sua reação que o sangue lavou a lâmina e coloriu de vermelho o mórbido cesto onde repousava sua cabeça. Alegria dos espectadores, tristeza do decepado. Foi aos 29 anos, deixando saudades em quase ninguém, dívidas em todas areas da atuação humana e um caderno, talvez seu maior mérito em vida. Folhas sujas, de uma escrita mal humorada, pessimista e fria. Era aprendiz de perfumista, e já havia decorado a essência de mais de mil fragâncias, todas anotadas em seu caderno, ao lado algumas idéias.. eram combinações, experimentos, talvez levassem aquele homem à algum lugar de respeito na sociedade, mas morreu antes.

Seu experimento, era um perfume diferente ao ponto de ser igual a todos os demais. Estudava friamente em seu alojamento sujo de barro e esterco, aos fundos da loja do seu senhor e patrão. A idéia seria algo, que soasse tão comum quanto a fragância de uma rosa, porém que tivesse em segredo, fórmulas mágicas capazes de hipnotizar pessoas. Transforma-las em seu escravo. Não seria dificil, precisava apenas dos ingredientes certos e em alguns meses ele teria sucesso o suficiente para, primeiro tomar a loja e depois, tendo dinheiro suficiente dar avanço a suas pesquisas e aumentar sua area de atuação. Mas, a cabeça infeliz daquele homem não era das melhores e obviamente falhou em determinados pontos.

Com a forma de fantasma, voltou demoniacamente para terminar seus experimentos. Usou de bom senso para persuadir seu velho patrão nos sonhos, e amedrontando o velho ficou com a loja só para si, pois o velho partiu na manhã seguinte o pesadelo profético. Deu início as suas fantásticas experiencias, misturou todas fragâncias que precisava, e como estava morto, foi fácil conseguir as que faltavam. Por fim, precisava apenas da essência de belas virgens. E por tais crimes fora condenado, extrair a virgindade de moças virgens era um feito e tanto, se fosse descoberto a morte era o caminho menos doloroso. Havia no entando, algo que lhe impedia: Como um fantasma iria tirar a virgindade de uma moça, e ainda se conseguisse, como iria segurar seus fluídos? Encontrava-se nesse empasse o fantasma quando então viu um casal entrando na sua loja, até então abandonada. Eram namorados, e fugiam dos olhares tentadores da sociedade. Escolheram um bom lugar para desfrutar da libertinagem, normal para idade. E o fantasma logo viu sua oportunidade de conseguir tais fluídos, posicionou-se com um jarro logo abaixo do casal e quando começaram os grandes movimentos, escorreu livre pelas pernas da moça os fluídos que cheiravam tão virginais quanto daquelas que ele deflorara anteriormente. Por final, após o fato concluiu a experiencia.

O fantasma finalizou então o perfume e deixou o liquido dentro de um frasco pequeno. Pensou em utilizar naquele casal que repousava de um orgasmo recém alcançado, mas achou melhor guardar a essência para casos mais preciosos, afinal quando teria a chance de conseguir outra virgem assim.. tão facil? E enquanto organizava as fragâncias nos devidos lugar, (sim, mesmo depois de morto.. continuava com seus 'problemas de organização'), deixou alguns frascos cairem e o barulho despertou a atenção do casal. Os dois curiosos foram rápidos até o interior de uma sala, onde se lia 'Laboratório', e lá encontraram o tal perfume.. diferente de qualquer outro, pela imensa singularidade que expressava. Brilhou nos seus olhos e descobriram o segredo, lendo ao lado o caderno do falecido e frustrado inventor. O fantasma traído imaginou o que iria acontecer, e como previsto, aconteceu! Em poucas semanas, o casal distribuiu nas melhores lojas do ramo.. ganhou milhões, fama e reconhecimento mundial.. e quanto ao fantasma traído, foi na eternidade, o que foi na morte. Portanto, viveu esta, triste, esquecido, frustado e humilhado. Eternamente.

Reny Moriarty
Enviado por Reny Moriarty em 20/07/2009
Reeditado em 07/07/2010
Código do texto: T1709770
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