Um homem e uma mulher

O homem que veio acuou-me com sua violência discreta. A única coisa que podia fazer era segurar meu braço e era suficiente porque eu já estava submissa ao fato de que ele exerceria sobre mim sua vontade. Não era necessária maior força física. Despejou suas palavras intimidatórias, proclamando-se criminoso capaz de tirar minha vida pois nada tinha a perder, minha vida não valia, e de fato sabíamos nós que nossas vidas realmente valiam tanto quanto essas folhas mortas tombadas pelo vento. Ele falava imperativamente e eu nada podia dizer, sua voz ali era imponente e única, e eu era apenas o cordeiro de quem se espera a súplica por piedade. Houve a busca pela propriedade que não me importa uma vez que não me pertence de fato, ele buscava os bens com uma necessidade voraz e no entanto como se houvesse algo além da materialidade. Alguns transeuntes causaram a sobrevinda da farsa, escondia o rosto através do fingimento demonstrando versatilidade existencial superior à minha, incapaz de atuar como apenas uma mulher em companhia de um homem. Éramos seres que perecem somente e durante alguns instantes o homem exercia seu poder sobre a completa vulnerabilidade da pele desprotegida e do braço preso e da respiração sôfrega e da possibilidade de sucumbir ao mais breve movimento. Então se foi com a despedida de um superior, mandando-me andar para trás e depois dirigir-me novamente até ele, mandava-me no adeus mesmo sabendo que eu não obedeceria, mesmo não desejando que o cumprisse de fato. Vi ainda seus passos afastando-se e após alguns instantes encaminhei-me ao sentido oposto, nossos passos esvaíam-se conosco, como se nos enterrássemos na terra sob o asfalto pouco a pouco acorrentados juntos ao seu centro.

Clarissa de Baumont
Enviado por Clarissa de Baumont em 06/09/2009
Reeditado em 08/09/2009
Código do texto: T1795398
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