"O CELULAR DA VELHINHA" Conto de: Flávio Cavalcante

O CELULAR DA VELHINHA

Conto de:

Flávio Cavalcante

Aposentada ganhando um mísero salário mínimo, dona Dolores sustenta toda uma família com a migalha que o governo chama de salário. Tempos difíceis na vida daquela pobre velhinha que deveria ter o mínimo de conforto para pelo menos ter um pouco de uma boa vida básica, já que deu boa vida pra o país em toda a sua existência e ainda é tirada daquela miséria que ganha uma quantia sugada das garras de onde ela não pode tirar, para contribuir com um país que não tem o mínimo respeito com seus filhos.

Dona Dolores sempre teve uma vida de sacrifício e pouco muita necessidade, coisa de quem depende do governo pra sobrevive. O sonho da vida de dona Dolores era de possuir um celular; pois achava bonito e chique andar com um telefone no bolso. Logo nos dias de hoje que até cachorro anda com celular pendurado no pescoço. Coisa comum para muitos e primordial na vida daquela velhinha de setenta e cinco anos que tinha uma vida sacrificada pelo destino e rugas marcadas em sua face demonstrando ter uma idade bem mais avançada.

Dona Dolores depois de seus setenta e cinco anos de idade ainda tinha uma responsabilidade nas suas costas de fazer dó.

O que mais impressionava era a garra de vencer as dificuldades que ela carregava, essa esperança de um dia sobrar algum trocado em seu dinheiro. A esperança mesmo seria quando recebesse o décimo terceiro salário pra poder comprar o aparelho de celular. Coisa muito difícil de sobrar; pois nem recebeu ainda e já tá devendo por completo na farmácia depois de ter comprado remédios para seus problemas de artrite e artrose, osteoporose na coluna, coisa que o médico já havia orientado que ela tivesse muito cuidado; porque qualquer tombo ela poderia de uma vez por todas ir para uma cadeira de rodas. Mas dona Dolores não podia ter este luxo; ela dizia bem humorada que cadeira de rodas é coisa de gente rica, pobre não tem dinheiro nem pra comer quando mais pra comprar cadeira.

Apesar das dificuldades ela sempre estava muito bem humorada numa situação que deveria tá chorando, mas ainda ia buscar de alguma forma um motivo para sorrir.

Ela sempre dizia “antes de morrer, eu vou conseguir comprar o meu celular” e ela fala isto com tanto orgulho e positividade, que até esquecia seus problemas de saúde. Ela precisava arrumar um dinheiro por fora para realizar o seu maior sonho.

Um belo dia, dona Dolores encontrou uma forma de ganhar dinheiro pra comprar o dito celular. Pegou um carrinho de mão velho que havia ganhado de um vizinho que ia jogar fora e ela resolveu guardar pra um dia que viesse precisar.

Todos os dias, aquela senhora que deveria ta em casa descansando, começava ali uma seqüência de luta e mais sacrifício, juntando pelas ruas metais e papelões para vender. Passava o dia inteiro em sol causticante e chuva pesada pelas ruas catando uma coisinha daqui outra coisinha dali. No dia quando o caminhão do lixo passava era o dia que dona Dolores conseguia mais artefatos e apurava ali algumas moedas á mais.

Dona Dolores depois de muito sacrifício, finalmente conseguiu juntar o dinheiro para comprar o celular, mas ela não queria nada de sofisticado até porque ela disse não tinha estudo para descobrir como mexer em coisa muito complicada.

Finalmente chegou o dia mais feliz de sua vida. Dona Dolores pegou seu dinheiro que guardava em baixo do colchão, fruto de um trabalho árduo e penoso e foi direto á uma loja. O seu sorriso estampado no rosto era contagiante aos vendedores da loja que sabia do caso. Comprou um celular simples o mais barato da vitrine, mas a felicidade no rosto daquela velhinha era como se ela tivesse tirado o grande prêmio da loteria esportiva. Era também dia do pagamento da sua aposentadoria e aproveitando a situação saiu para receber no banco.

Assim que saiu do banco se deparou com uma situação comum em nosso país que é de assalto á aposentado. Um menino de aproximadamente 15 anos de idade abordou dona Dolores na saída daquele banco e de arma á punho ordenou que a pobre velhinha desse o dinheiro e a bolsa; o que não negou e entregou tudo em estado de choque para o bandido. No local mesmo o “MENOR” infrator embolsou o dinheiro da velha e abriu a bolsa se deparando com o celular que havia acabado de comprar. Ironicamente ele pegou o celular e disse pra dona Dolores.

• Velha sem vergonha filha da puta! Não tem vergonha de comprar uma porcaria dessa, não? Pois eu vou lhe dar um tiro, pra senhora aprender a comprar celular bom para quando a gente vier assaltar não perder a viajem.

E deu um tiro fatal na dona Dolores que naquele dia que parecia ser o dia mais feliz de sua vida, não sabia ela que toda aquela euforia da vitória estava dando adeus definitivamente a sua estadia aqui na terra.

O que mais me deixou chocado com essa história de dona Dolores é que se trata de um fato real e aconteceu em Maceió nas Alagoas, minha terra natal.

Quantas donas Dolores não estão passando esta mesma situação?

PRECISA DAR UM BASTA DEFINITIVAMENTE NA VIOLÊNCIA DESTE PAÍS, COM PROGAMAS EFICAZES DE EDUCAÇÃO, TRABALHO E RESPEITO PELO CIDADÃO.

COM TANTO PROBLEMA PRA SER RESOLVIDO, O PAÍS FICA SE PREOCUPANDO EM GASTAR VALORES HOMÉRICOS COM OLIMPÍADAS.

ONDE É QUE VAMOS PARAR, MEU DEUS!!!!

-FIM-

Flavio Cavalcante
Enviado por Flavio Cavalcante em 04/10/2009
Código do texto: T1846781
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