SOBREVIVÊNCIA

Na madrugada que chega mais um dia de labuta.

Nas cabanas feitas de restos de madeiras, cercadas de papelão cobertas de plásticos já há movimento.

Pés descalços, uns ligeiros, outros ainda cambaleantes pelo sono transitam.

A lida começara.

As fogueiras ardentes esquentam a fome.

Um cheiro de comida e café se propaga no ar.

Seu João, dona Maria ,o Zeca e tantos outros se vestem como num ritual.

As roupas curtidas, cerzidas e remendadas tantas vezes, são as pedidas nos dias de labuta.

O chapéu do seu João,ou turbante da dona Maria na cabeça são peças importantes para se protegerem dos humores do tempo.

Das cabanas aglomeradas saem pai, mãe e os filhos.

Lá vão eles . Seu João ,dando baforadas do seu cigarro de palha , dona Maria chamando as crianças que ficaram para trás ,o Zeca assobiando uma modinha seu Pedro vem mais atrás com a mulher e os filhos conversando com seu Zeno um senhor já de meia idade que também estava junto na empreitada.

Quando chegaram o seu Antônio já estava esperando para distribuir o serviço do dia.

Começa a batalha pela sobrevivência.

Nos rostos queimados pelo sol, rostos marcados, pelos vincos ao redor dos olhos e bocas, parecem os mesmos deixados na mata em que passam.

O sol castigando insolentemente é sentido pelo suor escorrendo pelos rostos.

Nas mãos numa mistura de carne e aço jorra sangue das feridas abertas junto com a seiva que destila dos troncos cortados . Abertas no corpo, abertas na mata.

Abrindo clareiras seguem , vão deixando para traz um amontoado de feixes demarcando os caminhos.

Nos olhos , o brilho da determinação. Não sentem os espinhos a penetrarem seus pés, entranhando em suas carnes .

Quando a garganta seca levam a mão na cintura para pegar o cantil afim de sorverem alguns goles d água matando a sede que sentem debaixo do sol escaldante.

Retornando a tarefa de antes.

Um só pensamento os domina: seguir adiante, atingir a meta a qual se propuseram a fazer.

O sol a pino.

É meio dia... eles param...

As mulheres tiram as marmitas de comidas que estavam dentro das sacolas embrulhadas em panos para conservá-las um pouco aquecidas e procurando um lugar na sombra chama a todos para vir matar a fome.

A família de seu João trouxe farofa de carne seca , seu Pedro alguns pedaços de galinha e arroz e seu Zeno uma gó assada e farinha.

As famílias se reúnem e dividem irmanamente a comida.

Saciada a fome retornam ao trabalho.

As horas passam...

O sol declinando no horizonte vai esfriando pouco a pouco o tempo.

O cansaço aos pouco também vai tomando conta de seus ânimos.

É hora de voltar.

Corpos sujos, suados ,exaustos eles recolhem suas ferramentas e retornam para seus lares.

À noite a fogueira é acesa . Aos poucos , vão se agrupando ao redor dela enquanto no céu a lua cintila bailando entre as estrelas.

Vão chegando outras pessoas para prosear .Alguns acendem seus cigarros de palha soltando baforadas que se confundem com a fumaça da madeira ainda verde lançada na fogueira, outros tomam um gole de pinga para reanimar - dizem.

Os pequeninos no colo das mães encolhidos ficam a olhar as labaredas .

O tempo passa e eles contam suas anedotas e histórias de vida. Zeca entoa uma melodia na gaita avivando recordações no coração dolorido pela saudade de sua amada .

A noite desce cada vez mais e mais... O sono aos poucos vai dominando à todos e com um “boa noite” vão se levantando aos poucos e dirigindo- se para suas cabanas.

Seu João , seu Pedro e seu Zeno são os últimos a se despedirem ,estão cansados do eito do dia mas levam também no pensamento a Fé em Deus de que sempre haverá um pedaço de terra para trabalhar onde há tantos desempregados.

No silêncio da noite ouve-se os estalos da madeira queimando na fogueira , e de longe chega um canto que toca a alma levada pelo vento. É uma cantiga de ninar que uma mãe canta acalentando seu filho, falando de sonhos e esperança de um mundo melhor.

Belém, 21/7/00 – 00:15

Angela Pastana
Enviado por Angela Pastana em 05/12/2009
Código do texto: T1961049
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