Meninas, mulheres
A música tocava. Ela bailava. Não como uma menina que brinca com suas bonecas, mas como uma mulher que seduz o seu homem. Saia rodada, acima do joelho, olhar ofusco e perdido no tempo, pele sedosa e macia, uma criança aprisionada no corpo de uma dama formada, com seus seios fartos e volumosos, mãos provocantes, pés manipuladores.
Dancei, vibrei, cai no seu encanto. Tarde demais, seduziu-me jovem moça? Não, não pisque. Continue imóvel, com o reflexo das luzes sobre seus cabelos ondulados, deixe-me observar essa dádiva tão fria e cruel da noite.
Meus aposentos? Não, minha esposa. Meu carro? Impossível, nele não entra mulher alguma. Dançamos ao além, providos de luxúria e excitação.
Fim de baile, enfim hei de tirar a máscara, mostro-me um homem de quarenta anos, mas como? A pouco éramos dois moleques, com passos infantis e inocentes. Já é tarde, o pecado carnal nos consome, o ato está a se cumprir, fique quieta, não fale nada. Não fale. Adormecidos, abraçados, neste quarto profano de motel.
O sol aparece na janela perfurada, é difícil, mas é preciso voltar ao lar, espere, cadê ela, cadê a jovem que a pouco bailava sensual a me provocar? Se foi. Levou-me tudo, riqueza, locomoção, peça íntima, Deus, como pode acontecer? Correr não adianta mais, o desespero se abriga de meu corpo, não há mais o que possa fazer, olhar pela janela já é em vão. Carta à esposa, hora do Adeus, como é linda a visão aqui em cima.
Ao longe avisto aquela que me roubou. Estou aqui por você, por ser a mais viril das mulheres que perpassaram por meu desnudo. Aqui é meu fim, sinta-se culpada e vitoriosa bandida, levou-me tudo, foi a primeira. A única a roubar o inesperado, minh’alma.