Buscando o amanhã VII - capítulo VI

CAPÍTULO VI:

Ela passou algum tempo em seu quarto, pensando sobre tudo o que acabara de ouvir. Sua mente formulava uma estratégia, maquinando lentamente, enquanto digeria aquele banho de água fria que fora aquela conversa.

Depois de muito pensar, soube o que iria fazer. Determinada, saiu do quarto, cuidando para não fazer nenhum barulho sequer.

Seguiu pelos corredores sem encontrar nenhuma alma viva pelo caminho, uma vez que já era tarde da noite. Sabia onde deveria ir. Todos os castelos tinham o mesmo sistema de construção básica.

Desceu as escadas até o último patamar e caminhou até um corredor onde havia vários quartos. Aquelas eram as acomodações dos cavaleiros, modestas, simples.

Sua dificuldade seria achar qual era o quarto onde deveria entrar.

Analisou por um momento as portas e optou pela porta no final do corredor. Com cuidado, virou a maçaneta, abrindo a porta de madeira lentamente. Não precisou dar mais de dois passos para descobrir que havia acertado; aquele era o quarto que procurava. Fechou a porta atrás de si e caminhou até a proximidade da cama.

-William, acorde! – Disse ela, sacudindo-o levemente.

Ele resmungou alguma coisa abrindo os olhos.

-Senhora? – Questionou ele, ao abrir bem os olhos e fitar o rosto de Lore. – O que fazes em meu quarto em horas tão tardias?

-Preciso lhe falar, senhor. – Disse ela.

Ele sentou-se na borda da cama.

-Não poderias esperar até o alvorecer? – Perguntou ele. – Se alguém a encontrar aqui, será mal falada.

-Pouco me interessa. – Disse ela. – Temos que tratar de um assunto que não poderia ter momento mais propicio.

-E do que trataremos, afinal? – Ele perguntou.

-Política. – Disse ela. – Seu tio pretende dar-te um golpe.

-Como? Dizes absurdos?! – Disse ele.

-Ouça-me. – Disse ela. – Acho que para explicar teremos de começar do começo. Para começar, eu não me chamo Lore Lindberg e não sou germânica.

-Quem é você, então? – Ele perguntou, começando a desconfiar daquela conversa.

-Meu nome é Irene. Sou a filha do Duque de Áquila. – Disse ela.

-QUÊ?! – Ele perguntou aturdido. – És então uma louca! Se meu tio descobrir-te aqui, lhe entregará para a inquisição.

-Eu sei. – Disse ela. – Mas durante todos esses anos eu estive bem abaixo dos olhos dele, e ele sequer me notou. Eu sempre me comportava como criada na casa de minha tia, a marquesa Adelaide.

-Sim, lembro-me agora! – Disse ele. – Eu a vi no estábulo da marquesa.

-Sim. – Disse ela. – Mas não é disso que devemos tratar. Você conhece as histórias que cercam minha mãe. Na verdade, tudo faz parte de um golpe que seu tio formulou para apoderar-se das terras de meu pai. Ele tinha o plano perfeito: quando meu pai foi convocado às cruzadas, denunciou minha mãe e ela foi condenada. Seria questão de tempo e ele me entregaria para a inquisição também, sob a afirmação de que eu era filha de uma magia da feiticeira. Mas ele não contava com minha fuga. E agora ele teria outro empecilho: se eu estivesse viva, e me casasse, todos os bens de meu pai passariam a ser de posse de meu marido. E para seu próprio desespero, eu já havia sido prometida em casamento. Ele passou então a me caçar para terminar seu plano.

-Tudo isso faz sentido, mas ainda não entendi o que tu quiseste dizer quando afirmou que ele daria um golpe em mim. – Disse ele.

-Acontece que para ironia, o meu noivo é justamente... Você. – Disse ele.

-Eu sei. Mas se você for considerada morta, eu não tenho nenhuma utilidade a ele. – Disse ele.

-Sim, mas como ele está em duvida sobre minha sobrevivência ou não, passou a ter uma nova preocupação: você. E é por isso que ele quer livrar-se de você, mandando-o para as cruzadas.

William encarou-a durante alguns momentos.

-E o que você sugere? – Perguntou ele, pensando. – Que eu me oponha? Jurei minha lealdade quando fui nomeado cavaleiro e não posso quebrar esse juramento.

-Na verdade, eu tenho uma outra idéia... Mas precisarei de sua ajuda pra poder realiza-la.

-Então me conte. – Disse ele.

Conversaram por um longo tempo. Quando por fim a noite começou a encaminhar-se para o seu fim, Lore voltou a seus aposentos para não despertar desconfianças.

Mesmo que não tivesse tomado essa precaução, o conde estava tão ocupado em prepara a recepção ao Marquês de Ramos, com quem pretendia firmar uma aliança política, que nem teria notado que Lore estivera no quarto de William. E se tivesse notado, provavelmente teria ignorado esse fato, já que ela era uma barda.

O Marquês deveria chegar durante a tarde, com sua Marquesa e seu filho.

Logo a condessa estava muito atarefada, organizando os criados e servos na limpeza e arrumação do castelo e na preparação dos quartos de hóspedes.

Lore fugiu da correria daquele lugar assim que foi possível e encontrou Arthur no jardim. O garoto passou bem alguns minutos agradecendo a ela por ter mudado a opinião do conde. Depois ela perguntou-lhe sobre a visita à Marquesa Adelaide e o menino lhe contou, entusiasmado, sua conversa com a Marquesa.

-Sabia que ela o aceitaria como aprendiz. – Disse Lore quando ele terminou de descrever sua conversa com a Marquesa.

-Você a conhece? – Perguntou Arthur.

-Um pouco. – Disse ela. – Mas saiba que é o bastante para formar uma opinião a respeito dela.

Passou mais algum tempo conversando com ele, até que uma das criadas da Condessa a chamou.

-Senhora, minha senhora pediu que eu lhe entregasse isso. – Disse a criada, estendendo-lhe um vestido. – Disse que deseja que a senhora vista para a recepção do Marquês.

-Diga a ela que acatarei ao pedido dela. – Disse Lore.

-A senhora crê que precisará de ajuda com o vestido? – Perguntou a criada.

-Não, mas agradeço a oferta.

A criada retirou-se, deixando o vestido nas mãos de Lore.

Arthur continuou com ela por mais algum tempo, mas então uma outra criada apareceu para chamá-lo a se trocar para a recepção.

Lore achou que o melhor que tinha a fazer era ir até o quarto e trocar-se também.

Olhou-se no espelho por um momento. Usava um vestido vermelho com detalhes dourados. Prendeu os cabelos em um elegante penteado no alto da cabeça.

Pensar que logo tudo estaria acabado era estranho.