Produção do Tempo - Décimo Segundo Dia

Aquelas personagens do sonho são as nossas máscaras. Sonhei este sonho.

Sonho este sonho muitas vezes. Primeiro: surge um cenário num fundo branco. Parece-me um fundo branco. Um espaço habitado por figuras. Podia identificar essas figuras, mas não são rigorosamente as figuras que eu podia identificar. Elas próprias se transmutam, metamorfoseiam em outras figuras que vão perdendo a identidade. Segundo: são estas figuras que podia identificar. Temos um cenário num fundo branco, temos figuras nesse cenário. Temos a minha dificuldade em identificar as figuras que no cenário aparecem e eu sonho. A mosca do quarto de que falei no primeiro dia existe. Preocupo-me se existem estas figuras que no cenário do sonho eu sonho. As pessoas que passam na rua, as palavras à venda num quiosque, os jardins e os parques onde ficamos ao Domingo à espera da alegria – tudo existe. Mas as figuras do meu sonho são apenas as figuras do meu sonho. Terceiro: e se a realidade é ainda este sonho ou outro sonho ou outro sonho que nunca sonhei e podia ter sonhado? Ou se é um sonho que não sei se sonhei? Ou se é um sonho que alguém sonhou? E se esse cenário num fundo branco e essas figuras que surgem, que parecem estar em silêncio, estáticas, se esse cenário e essas figuras – insisto - forem peças, peças reais, próximas, concretas? Por exemplo: uma casa totalmente branca, sombras deambulando num jogo vital de múltiplas máscaras. Se – de novo a condicional – não for eu a sonhar este sonho que sonho muitas vezes? Quarto: preciso parar aqui.

Quinto: ainda posso escrever: pode não ser sonho, mas realidade. Pode ser sonho do que pode ser realidade.

Sexto: preciso parar aqui.