Eles - 2 (ZeCão)
 
 
2-      O nome dele era incompreensível. Parece que só tinha consoantes. Mesmo ele não mais conseguia pronunciá-lo. Saia de seus lábios como um uivo. Mas o primeiro som remetia ao som de um Z. Por isso começaram a chamá-lo de ZeCão.

Tudo começou muito cedo. O pai, tocador de obra, levava-o consigo por todas as partes do mundo. Todos os continentes e muitos países. O menino tinha facilidade para aprender línguas. O pai dizia: vai ser diplomata.

Ninguém sabe exatamente quando a situação começou a se complicar. Mas começou. No princípio ele embaralhava as línguas. Conseguia entender  todas, mas ao responder começou a misturá-las. Misturava as línguas latinas entre si, as eslavas, as anglo-saxônicas, línguas da mesma família começaram a se juntar. Logo a situação foi se complicando cada vez mais e ele passou a embaralhar todas. Ninguém mais o compreendia e nem ele compreendia mais ninguém. Mas ainda podia pensar. Na mistura de línguas que lhe restara, ele pensava. Até que nem isso mais conseguiu: pensar. Então só lhe restou uma saída: aprendeu libras e passou a fingir-se de surdo e mudo. E quando queria falar consigo mesmo, ou pensar, tinha que ir para frente do espelho.

Série Pequenas Histórias Encantadas

Blogs - http://molimpia.blogspot.com
         http://marilim.net