BURRA DE PADRE

BURRA DE PADRE

Conta-se do Sr. Manoel, paraibano, como um bom narrador de histórias fantásticas. Sua filha me contou como ele chamava à Mula-sem-Cabeça em sua terra natal. Ele a nomeava Burra de Padre. Interessantíssimo. Sempre achei essa história muito estranha. Como uma mula sem cabeça poderia soltar fogo pelas ventas? Se não tem cabeça, não tem nariz. Por tanto não poderia soltar fogo pelas ventas. As imagens dos livros ilustrados de folclore mostram um equídeo com fogo saindo pelo pescoço. Mais tarde fiquei sabendo. As ventas na realidade não ficavam na cabeça. Ficavam, digamos, bem mais abaixo na anatomia do animal. Por questão de pudor não diziam exatamente de onde o fogo saía. Mas você já percebeu de onde é porque a mula foi uma mulher amaldiçoada após ter mantido relacionamento com um padre. O sacerdote foi condenado ao inferno. A mulher recebeu como pena vagar assombrando as pessoas para sempre e soltando fogo, pois era fogosa. Entende?

Penso que Burra de Padre seja mais interessante. Na realidade foi o acontecido. Quem se apaixona por um padre sabe das consequências. Logo, seria burra em insistir no relacionamento proibido. O padre por sua vez seria um fraco que sucumbiu aos desejos da carne? Por isso mereceu o inferno? A mim parece o castigo maior ter recaído sobre a amante. Além de viver atormentada e sem seu desejo satisfeito, vive a assombrar inocentes passantes das estradas em busca de luz. Ela suga qualquer forma de brilho existente em sua frente no afã de escapar de seu infortúnio. Portanto devem todos os que pressentirem a presença do quadrúpede afogueado fechar os olhos e a boca e esconderem as unhas, pois são pontos luminosos em nosso corpo. Se o monstro os verem (Sem cabeça ele enxerga assim mesmo. Lenda é lenda), chupará nossos olhos, arrancará nossos dentes e nossas unhas em busca de iluminação. Acredito que sirvam de combustível para seu fogo eterno. Sugestivo buscar olhos, dentes e unhas. A vítima ficaria então prostrada sem energia. Sugestivo também. Ela era realmente a Burra do Padre?

Oswaldo Eurico Rodrigues
Enviado por Oswaldo Eurico Rodrigues em 05/06/2010
Reeditado em 14/10/2020
Código do texto: T2302120
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