NASCIMENTO
Nascimento
 
 
 
   Corra! Corra, você consegue...
 
   Uma voz, vinda do inconsciente, dava-me uma força descomunal.
 
   Mas como isto aconteceu.
 
    Era uma manhã, daqueles dias contados a ponta de lápis. Foram contados duzentos e trinta e quatro dias, desde que soube que sua esposa estava grávida.
 
    Primeiro filho.
 
    Porem no fundo, Alberto sabia que não fazia diferença alguma, posto que filhos não se valorizam por hierarquia.
 
    Dentro do possível, ele acompanhou toda a gravidez, em parceria total com sua senhora.
 
    Chegou a engordar quase dezesseis quilos.
 
    Cada visita ao obstetra, cada ultra-sonografia, cada exame, e lá estava ele acompanhando sua amada.
 
    Entre cada visita ao obstetra, ele construía seu corolário de questões a serem perguntadas ao doutor.
 
    Cada novo sintoma.
 
    Cada nova descoberta.
 
    Tudo era meticulosamente registrado, para conversar com o médico.
 
    Em cada consulta, após os exames de rotina, lá estava o questionário, para que o médico pudesse respondê-lo, ou explicar as dúvidas.
 
    Curioso, Alberto leu tudo sobre gravidez. Cada passo desde o zigoto fecundado, até o final nascimento do bebê. Ele era capaz de explicar, inclusive o ato da fecundação, que para o Alberto, um amante da vida, era uma jornada épica, quase intransponível, onde de algumas centenas de milhões de espermatozóides, um apenas logra o direito de fecundar aquele óvulo, e dar continuidade ao milagre da vida. Ai começa a seleção natural.
 
    Em suas pesquisas, Alberto se encantou, e convenceu sua amada esposa, que deveriam fazer o parto na água. Aquele em que o bebê nasce em meio aquático, e permanece ligado a mãe por certo tempo.
 
    “O parto na água é uma modalidade de nascimento onde a mulher fica dentro da água durante o período expulsivo do bebê, de modo que o bebê chega ao mundo no meio aquático, exatamente como estava no útero. A água é aquecida a 36ºC, o ambiente geralmente fica à meia luz e o pai ou acompanhante deve acompanhar todo o parto, e pode entrar na piscina, ou na banheira de parto, com a futura mãe.”
 
    “Esses nascimentos costumam ser muito suaves e calmos, e muitos bebês sequer choram quando são trazidos à tona para o colo de suas mães.”
 
    Ainda pelo terceiro mês da gravidez, eles comentaram com o doutor Guilherme, formalmente Mário Guilherme, este desejo.
 
    Dr. Guilherme, é um médico de inigualável saber, alem de um caráter humano esplendoroso.
 
    Surpresos, obtiveram uma explicação de que o Dr. Guilherme era especialista no parto Laboyer. Conhecido por Nascer Sorrindo, uma vez que o bebê não sofre da desesperadora dor de ter que respirar a todo custo, para não morrer.
 
    “Método desenvolvido pelo médico francês Frédérick Leboyer. Ele dava muita importância ao binômio bebê/mãe. O vínculo entre bebê e a mãe, no momento do nascimento, era de suma importância para Leboyer. Ficou conhecido pelo nome de “Nascer Sorrindo”. Este método envolve um ambiente de muita tranqüilidade, pelo uso de pouca luz, silêncio, no durante e principalmente no depois do nascimento. Implica em manter o bebê respirando pelo cordão umbilical, até que este naturalmente, sem dor, comesse a respirar sozinho. O processo final deste parto inclui massagens nas costas do bebê, e ausência da famosa palmada para fazer o bebê chorar e abrir os pulmões. Esta transição respiratória é feita de forma suave. O bebê permanece no colo da mãe durante este processo. Prega amamentação precoce, e banho perto da mãe, que pode ser dado pelo pai.”
 
    Foram necessárias poucas palavras, e este era o método de parto que desejavam.
 
    Leu tudo o que podia sobre o parto Nascer Sorrindo.
 
    Chegou ao ponto de saber tanto sobre este assunto que, terminando um curso sobre técnicas de treinamento e apresentação oral, optou por este assunto em sua aula prova.
 
    ...
 
    Agora é chegado o final do processo normal de gestação. Aguardavam apenas o sinal da natureza para o início do trabalho de parto.
 
    E ele veio. A bolsa estourou. Alberto trabalhava na Ilha do Governador e residia em Santa Tereza.
 
    Sabedor da notícia, ligou urgentemente para o Dr. Guilherme e este solicitou que levasse a mãe para a clínica previamente acordada, no Humaitá, que era preparada para o parto que desejavam.  
 
    Retornou a ligação para a esposa, para que ela aguardasse que ele estaria voando para casa, a fim de pega-la e levá-la para a clínica. Confirmou que a mãe dela estivesse junto a ela nestes últimos instantes antes do parto.
 
     De carro, voou ate a Av. Presidente Vargas. Chegando lá, transito parado. Para onde olhasse, via apenas engarrafamento.
 
    - Droga... Droga... O que está acontecendo... Reclamava o Alberto.
 
    Foram meses ensaiando tudo. O caminho até a clínica havia sido efetuado diversas vezes, em diversos horários diferentes do dia, visando saber como seria o trajeto. Todo o ritual do parto, e como deveria se comportar, estavam mentalizados. Ele não podia ficar de fora deste momento mágico, que é o nascimento de um filho.
 
    - O que devo fazer... Pensa Alberto... Pensa... Os minutos pareciam fluir em alta velocidade. A maioria dos motoristas, já havia desligado seus carros, frente ao engarrafamento, que era total.
 
    Em uma decisão de coração, ele simplesmente desligou o carro. Saiu e trancou-o. Colocou-se a caminhar apressadamente para sua casa. Enquanto fazia sua maratona particular, ele ligou para seu pai e implorou que ele lhe emprestasse seu carro. O pai do Alberto mora também em Santa Tereza e imediatamente cedeu seu carro.
 
    Enquanto isto recebe uma ligação de sua amada companheira, informando que as contrações estavam fortes e aceleradamente reduzindo seus espaços.
 
    A louca maratona virou um desafio de velocidade. Alberto, a muito tempo estava fora de forma. Mas para que servem as tais de adrenalina e os hormônios.  “Perna, para que te quero” era o lema do Alberto. Corria mais que podia. Infelizmente o preparo físico era pouco, e logo o corpo gritava de cansaço. O coração parecia desejar explodir.
 
    Foi aí que o inconsciente do Alberto começou a falar forte e alto.
 
    Corra! Corra, você consegue...
 
    Isso era o que faltava. Ele já estava na Rua Riachuelo, e com esta força adicional de seu inconsciente, superou a danada das dores e do cansaço e manteve um pique até chegar em casa.
 
    Lá chegando, seu pai já estava com o carro parado a sua porta. Sua esposa, já estava sendo confortavelmente alojada no banco da frente do carro, totalmente corrido para traz, e tendo seu encosto rebaixado para maior espaço e conforto.
 
    Alberto nem entrou em casa. Confirmou que a bolsa de utensílios básicos para a mãe e o bebê estivesse no carro. Despediu-se de seu pai e foi para a clínica.
 
    O parto. Perfeito. O bebê, Um meninão. Alberto conseguiu que durante todas as ultras o sexo ficasse sem ser revelado. O bebe, nasceu sorrido. Lindo, como um bebê pode ser lindo. Uns diziam que o bebê se parecia com ele, outros que se parecia com a mãe. Sinceramente, Alberto não conseguia ver semelhanças físicas, um bebê em seus primeiros momentos, nasce ainda sem uma forma clara. Mas as pessoas, ou por educação, ou tentando ser gentis, afirmam notar semelhanças.
 
    O que importa é que nascia seu primeiro rebento. Pai e Mãe deliravam de felicidade. E o compromisso assumido, desde a fecundação, agora ganhava contornos de realidade.
 
    ...
 
    Hoje aquele bebê tem dezoito anos. Inteligente e educado, possui uma irmã, que nascida com a mesma equipe do Dr. Guilherme, é também linda e inteligente.

 
 

Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 30/06/2010
Reeditado em 30/06/2010
Código do texto: T2350119
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