Nem Todos Os Ônibus São Azuis.

Hoje penha manhã um ônibus da viação São Bento tocou meu coração. Toquei em disparada atrás dele, mas já era tarde; o motorista não olhou pelo retrovisor e os passageiros estavam distraídos demais para ver um louco correndo atrás do ônibus.

Senti aqueles momentos de partida em que, com o coração partido, adentrava-me num Danúbio Azul e me deixava balançar em pensamentos sobre rodas, fumaças, situações e circunstância da vida cotidiana. Só o fato de deixar os familiares para trás me comovia a ponto de lacrimejar.

Sempre gostei de ônibus, seu cheiro e seu jeito aparentemente lento de rodar, sua maciez, seus condutores, pessoas, poltronas, água e se possível ar-condicionado. Se pudesse resgatar todos os pensamentos vãos que tive em viagens de ônibus acho que seria um cara preocupado.

As viagens de ônibus sempre me trouxeram certa instabilidade com relação à vida, o medo de ficar só, acidentes e me perder de algum modo. Por isso, toda vez que adentro a um ônibus, ou passo por perto da porta, como hoje, tenho a mesma sensação de insegurança.

Poderia narrar aqui algumas desventuras que tive em viagens de ônibus, mas estou impaciente, não tanto para deixar de relembrar a memorável viagem em que, bêbado, fumei no banheiro sem que nada acontecesse. Acho que os demais passageiros sentiram o cheiro, ou até mesmo o motorista o sentiu, mas resolveram deixar pra lá. Talvez por medo do desconhecido, de interpelá-lo, ou talvez mesmo porque o odor estava bem suave, uma vez que fumei praticamente fora do ônibus, com a janela escancarada e o braço do lado de fora.

Houve também casos de correrias atrás do ônibus que estava partindo; do caso dos velhos corocas que ficaram a viagem inteira papeando como se estivessem em roda de bar; o do bebê que quase me fez chorar por não parar de chorar a noite inteira, e eu cansado pra burro; casos de braços em cima de mim, pessoas relaxadas, mulheres gostosas e subaqueiras grotescas foram freqüentes.

Numa dessas viagens descobri também que nem todos os ônibus são azuis.

Cristiano Covas, num dia qualquer, 26.11.07.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 06/09/2010
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