A velha Margareth - parte I

Viu o homem de barba ruiva esgueirar-se pela apertada fresta do portão enferrujado, então, ascendendo um cigarro barato, Augusto sentiu o cheiro da fumaça misturar-se ao odor de urina de ratos.

O homem caminhou até ele olhando para cada canto sombrio do galpão abandonado. Era ligeiramente gordo. E sentia medo. Augusto logo percebeu. Provavelmente tinha dado cinco voltas no quarteirão vazio antes de se resolver entrar.

-Boa noite – cumprimentou o homem. Pelo telefone disse que se chamava Renan. Era mentira – Sei que estou um pouco atrasado...

-O que você tem pra mim? – cortou Augusto.

-Primeiro quero vê-las – respondeu o homem – Trago comigo o combinado.

-Está sozinho?

-Sim.

Augusto caminhou até a saída. Apertou-se por entre a fresta do portão enferrujado. Viu um carro parado junto à calçada e uma mulher já nos seus cinqüenta e tantos anos ao lado da porta. Era terrivelmente feia e coberta de maquiagem.

-Você disse que estava sozinho - resmungou Augusto.

-É a minha mãe - disse o homem, com a chuva caindo violentamente na madrugada - Mamãe, eu disse para você me esperar no carro.

-Hélio meu querido - disse a mulher - Eu não confiaria em você nem para amarrar meus sapatos - virou-se para Augusto, estudando-o - Vamos logo ao que interessa.

-No corredor – apontou Augusto para o beco ao lado do galpão.

O homem o seguiu, cochichando algo com a velha, que reclamava de algo.

O homem e a mulher pararam ao ver a van etacionada dentro do beco. Augusto virou-se para ele, esmagando o cigarro na sola da bota.

-Estão lá dentro.

-Ótimo – disse o homem esboçando um sorriso de cordialidade – E quais são as idades?

-Eu escuto bem senhor Hélio – frisou Augusto – Trouxe a sua exigência, repetida cem vezes ao telefone. A mais velha tem quatorze. As outras duas tem doze anos.

-São todas puras? – perguntou a mulher olhando desconfiada para o final do beco.

-As mais novas são. A de quatorze anos pegou barriga, mas a comprei a tempo de concertar o problema – disse Augusto –São setecentos e cinqüenta reais e mais cem reais pelo frete.

Hélio tirou um pacote de dentro do casaco. Mas a mulher segurou seu braço antes dele entrega-lo a Augusto.

-Queremos redução no preço - disse ela - os clientes reclamam quando elas têm cicatrizes de gravidez. E ela nem mais é menina. Pagamos seiscentos e cinqüenta por elas.

-Minha senhora – disse Augusto levando a mão para dento do casaco – Não gosto que brinquem comigo. Pague o que tu deve.

-Ao menos são branquinhas? – perguntou Hélio em tom apaziguador.

Augusto resmungou positivamente.

-Deixe mamãe – disse Hélio para a mulher - Nós ficaremos com elas, senhor.

-Pode pegar, a porta está destrancada. Estão amarradas e não comem há dois dias – disse Augusto pegando o pacote da mão de Hélio e guardando dentro do casaco.

-Não vai conferir? - perguntou a mulher intrigada por Augusto não ter contado o dinheiro.

-Se a senhora tiver um mínimo de amor pela sua vida, sei que a quantia está certa.

Hélio caminhou até a traseira da van. Abriu a porta ao mesmo tempo em que ouviu um baque surdo. Arregalou os olhos ao olhar lá para dentro, percebendo tarde demais que a van estava vazia. Sentiu o soco de Augusto nas costas empurra-lo conta a parede. Olhou para o lado a tempo de ver a mãe caída no chão com o nariz quebrado.

Augusto lhe deu uma banda. Torceu seu braço para trás pondo-lhe algemas.

Augusto jogou os corpos de mãe e filho no rio. Só serão encontrados daqui a dois dias. Ele então pegou seu celular.

-Alô?

-Senhora Margareth - disse Augusto - Está feito.

A voz da mulher no outro lado da linha soou satisfeita.

-Eu sabia que podia confiar em você, Augusto. Bom trabalho.

-Mas, minha senhora, ainda acho que a senhora está se expondo demais. Não seria melhor, nesses casos, chamar a policia federal.

-Não,de jeito maneira - disse a velha Margareth - Me chame de sádica, se quiser, mas vou adorar a sensação de ver as fotos desse casal de pedófilos no jornal daqui a alguns dias, não aguardando julgamento com um bom advogado, mas servindo de comida para os peixes.

-Compreendo, e as meninas?

-Elas estão aqui - Margareth pensou alguns segundos - Amanhã vou voar para Manaus, irei devolve-las as suas famílias.

-Mas eles as venderam de novo.

-Eles não mais farão isso, confie em mim, Augusto - disse a velha, pondo o telefone no gancho e voltando-se ao seu cachimbo.

Danielfaraó

Daniel Gonçalves
Enviado por Daniel Gonçalves em 24/09/2006
Reeditado em 28/09/2006
Código do texto: T248409