Questão Social.

O Helio Torvelinho tinha sérios problemas com drogas. Não ele propriamente, mas seu filho, que era viciado em cocaína.

O rapaz, que contava com dezesseis anos de idade, consumia todos os dias cinqüenta reais dos pais, para o fim de consumir o maldito “demônio ralado”. Quando o pai não lhe dava a grana ele, como a maioria dos viciados, roubava algo de casa e entregava ao traficante. Levava rádio, talheres, sapatos e até as galinhas que o pai criava no quintal eram trocadas por pó.

A vida do rapaz e dos pais estava se transformando em pó!

Meu contato com essa família se deu na sala de espera do Fórum local, quando fui indicado pela Assistência Judiciária da OAB para defender um senhor que sofria processo por porte ilegal de arma de fogo. Não o conhecia. Perguntando ao oficial de justiça cheguei até ele. Velho, surrado e angustiado, foi-me expondo os fatos num turbilhão, como que desabafando uma situação comum hoje em dia em muitas famílias brasileiras: a dependência química de um de seus membros.

Não tinha dia que o garoto não usava. Tinha que dar um jeito! Vivia nervoso, sem dormir, sem comer, sem viver, com as narinas cheias de catarro, trancado no quarto. Acabando o efeito, queria mais. Definhava e nem pensava em outra coisa, que o diga trabalho, estudo e namorada. Queria o pó, o pó, o pó, o que os pais, angustiados, não compreendiam as proporções da dependência em cocaína, uma verdadeira doença social, juntamente com o crack.

Teve um dia, em que já cansado de tudo, Helio resolveu não dar dinheiro ao filho e nem possibilitando que o conseguisse. O filho, furioso, sacou de um veneno de rato e bebeu uma dose, começando a estrebuchar num canto da garagem. O pai, senhor de idade, muito justo, resolveu ligar para a ambulância e a polícia, com receio de que achassem que ele havia envenenado o filho. A policio chegou primeiro, e o filho, mesmo mal num canto, pedia vinte reais, vinte reais, caso contrário não iria a lugar nenhum. O policial disse ao pai para lhe entregar o dinheiro. Só assim o rapaz resolveu ir ao pronto-socorro passar por uma lavagem estomacal.

Porém, descontente com a atitude do pai, disse aos policiais que o mesmo tinha uma espingarda em casa e que vez ou outra o ameaçava de morte.

Os policiais resolveram por bem apreender a arma e instaurar um Termo Circunstanciado, o dito TC, contra Helio Torvelinho.

Eu o defendi neste caso, que não deu em nada, tendo em vista fato atípico, arma no interior da residência, impróprio para o uso, não disparava, e, além do mais, era de fabricação caseira, transferida em gerações, desde seu avô. Absolvido judicialmente, porém absorvido pelas dores de ter um filho dependente químico.

Em dado momento da audiência, no fim de seu interrogatório, Helio Torvelinho disse, num impulso:

“Se a Justiça não conseguir internar meu filho, serei obrigado a matá-lo!”.

Oremos por nossas crianças para que jamais participem de uma vida assim, vazia e sem fundamentos!

E aos que por algum acaso ao mal adentraram, por um lapso de lucidez, vejam que a vida não se resume a isso, e que o mal se regozija em fazê-lo cegar!

Abram os olhos, respirem fundo, reflitam e comecem a andar por outro caminho!

Savok Onaitsirk, 28.05.10.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 31/10/2010
Código do texto: T2588382
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