Bar “Sozinho”: Conselhos do Subterrâneo.

Era tarde da noite. Rumou para o bar Sozinho. Um nome estranho para um bar.

Tinha esse nome porque ali só freqüentavam solitários e desiludidos. Um bar exclusivo para suicidas em potencial.

Naquele dia o bueiro mais uma vez tentara infrutiferamente arrastar-lhe para seu fundo imundo. Resistira bravamente. Pediu um copo da bebida mais forte, aquele que lesa, mas não mata. Seu corpo doía como se tivesse levado uns tiros no estômago, dado pela atirador vida. E os tapas da vida eram mais doloridos do que o sopro da morte, disso não haviam dúvidas. Ouvia Buddy Guy e murmurava um canto sórdido, chocho como uma cabeça de cogumelo.

Pensava que não podia desistir e não desistiria jamais! Tinha a esperança de que algumas doses de álcool bem reforçadas lhe trouxesse o sono e uma manhã transcendental... Uma manhã de infância... A ausência e os sonhos...

Foi ao banheiro. Precisava despejar suas antiguidades... Um eu sujo, doutras eras, impregnara em seu âmago, colado nas paredes de seu eu interior.

A bosta saíra voluptuosamente!, como que expulsa de dentro suas entranhas putrefatas.

O papel-higiênico estava escasso. Três fatias de folhas, praticamente, amolecidas, quase transparentes. Na hora do desespero não percebera a falta. Agora, com a bunda suja, bêbado e fodido, sentira no cerne o fiel da balança. Estava realmente fodido! E fedido!

Gritos de nada adiantariam. O dono do “Sozinho” era um rústico e acabaria rindo da situação, expondo-o a ridículo. Limpou a bunda com seu meião de jogador de futebol e se indagou, quase aos prantos: “o que fiz pra essa porra ser assim? O que fiz, caralho?”.

Nesse meio tempo, em outro recanto, requintado, deputados federais discutiam o plano de fatia de uma boa propina, degustavam iguarias raras com vinho do “Bom” e peidavam silenciosamente, às escondidelas, com o cantinho da bundona gorda e suarenta, enquanto fumavam charutos cubanos e se entortavam ainda com chivas regal. Ao lado putas “de luxe” desfilavam suas ancas promíscuas à espera do dólar, tudo numa orgia estonteante... Pobres deputados federais! De putadas em putadas vão levando e enganando as gerais, as massas falidas de lutas, bingos e missas dominicais...

De seu lado o dito inominado tentava limpar sua própria merda..., até que, no momento da descarga, um pedaço de sua merda, como que adquirindo vida própria, lhe disse, profética e enfaticamente:

“Friend, a vida é uma merda a ser limpada!

Não há como escapar!

Se não limpa agora, limpará outrora!

É imprescindível que cada um limpe a sua!

Não adianta ficar só olhando com cara de desconsolado, esperando solução pronta e perfeita; tem de pegar fundo no intestino delgado e dar um jeito para que os dias não se tornem fastidiosos a ponto da derrocada!

Olhou assustado para aquela merda falante. Não havia bebido muito, mas estava mal.

Saiu do banheiro, olhou pra cima, pagou a conta, saiu do bar e se jogou na frente do primeiro ônibus que viu se aproximar...

Por sorte o ônibus vinha devagar e só lhe causou um traumatismo craniano. Ficou sete dias em coma, viu Deus, gnomos, duendes e até o Raul Seixas. Viu também uma luz no fim do túnel e a partir de então se tornou outro homem..., um homem sem merdas...

Savok Onaitsirk, 28.07.10.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 13/12/2010
Código do texto: T2669546
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