NADA ACONTECE POR ACASO .

Uma chuva fininha e continua, lavava a pequena cidade.

Nas ruas o vai e vem dos transeuntes.

Mulheres equilibravam pacotes, crianças muitas vezes mais que uma, embaixo de guarda-chuvas coloridos.

Era a semana do Natal.

Marcela olhava a tudo maravilhada.

Em quase toda loja podia-se ver Papai Noel.

___Quanto “papai Noel”!

As arvores de natal, com seus enfeites luminosos, fazia o coraçãozinho de Marcela bater acelerado.

___Olha mãe, que lindo mãe.

___Ande menina, entre embaixo do guarda chuva, você está se molhando!

Anda, anda... Vai anoitecer e nos estamos aqui ainda. Seu pai nos espera no ponto do ônibus.

E aos tropeços lá vai Marcela segurando a mão de sua mãe.

Ao dobrarem a esquina ...

____Papai, papai... eu vi papai Noel!!!!

____Filha pare... Marcelaaa !!!!! olha o carro!!!!

Dona Ana desesperada sem se dar conta de que sua filha soltara sua mão, ouviu os gritos angustiantes de seu Aldo.

Abrindo caminho na multidão que se formara,

Dona Ana avistou o corpo retorcido de seu Aldo ao lado de sua filhinha também inerte.

____Nãooo !!! Meu Deus... Nãooo !!!

Difícil descrever tamanha dor.

O povo curioso aglomerava-se mais e mais ficando difícil a chegada de auxilio.

Dona Ana abraçara-se ao marido, olhando de vez em quando sua filhinha ali ao lado.

Aos poucos Marcela mexia as mãozinhas como se quisesse alcançar as do pai. Não viu nem sentiu mais nada.

Um mês havia passado.

Marcela sentiu forte dor nos olhinhos, a claridade vinda da janela, inundava o quarto.

___Mamãe?... Mamãe?

A enfermeira solicita, tomou-lhe as mãos e com imenso carinho...

___Acordou pequena Marcela... Sua mãe já vem... Antes vamos falar com o Dr. Lauro.

Foi então até a janela, cerrou as cortinas para que o quarto ficasse na penumbra.

Voltou até a campainha, na parede em cima da cama, acionou-a.

___Que bom ver você assim com os olhinhos abertos, minha linda...

Minutos depois outra enfermeira entrou no quarto,

No mesmo momento saiu entrando em seguida com o jovem médico.

___Olá... Vamos ver como está nossa menina...

___Quero a mamãe... Cadê o papai?

___Calma minha linda... Fique quietinha que eu vou examiná-la...

___Hum... Perfeito... Vamos tomar uma sopinha? Está com fome?

___Quero a mamãe...

Medico e enfermeira trocaram um olhar cúmplice.

Veio a sopa e ambos saíram do quarto.

___Pobre menininha, dona Ana mal vem aqui, culpa a filha pela morte do marido, está em tratamento psicológico, mas parece não querer reagir.

Em alguns dias Marcela poderá ir para casa. Dona Ana terá que vir buscá-la.

___Quer que eu conte a ela sobre o pai Doutor?

___Sim mas espere mais uns dias até que ela tenha alta.

Marcela sentada na cadeira em frente a janela, estava ansiosa.

Enfim veria sua mãe, seu paizinho que ela tanto amava.

Por que será não tinham vindo visitá-la?

A enfermeira, bateu de leve na porta.

___Posso entrar?

___Tia Marisa, sabe que vou pra casa hoje?

___Sim minha linda... Antes vamos conversar!

Você lembra-se do acidente?

___Não, mas sei que é por isso que estou no hospital.

O carro bateu em mim não foi?...Cadê papai ?? Quero ver meu pai !!.

Pela angustia que se via em seus olhinhos, podia-se notar que ela lembrara-se de tudo.

Com cinco aninhos Marcela era inteligente e perspicaz.

Marisa enxugou as lagrimas de Marcela e as suas próprias.

___Papai foi para céu Marcelinha, mas ele continua te amando muito.

Marcela envolveu seus bracinhos ao redor do pescoço de Marisa.

___Mas mamãe não me ama mais eu sei... Nem veio me ver!

___Veio sim querida, mas você estava dormindo...

___Amo tanto a mamãe...

Dona Ana mal falou com a menina quando veio buscá-la. Seu rosto pálido deixava transparecer o sofrimento dos últimos acontecimentos.

Marcela tentou um abraço, mas foi repelida. Um suspiro dorido cortou-lhe a voz.

___Ma... mãe!!!

A mulher como se açoitada pelo soluço da filha relutou antes de abraçá-la ligeiramente.

___Te amo tanto mamãe.

Não ouviu resposta. Soube então com certeza que sua mãe não a amava mais.

Não foi fácil para ambas a convivência durante os anos que seguiram.

Marcela, com dez anos se tornara rebelde, desafiava a mãe que por sua vez a espancava.

As doces musicas de Natal tomavam conta da cidade.

___Odeio Natal... Ganhei como presente o remorso pela morte de meu pai, o ódio de minha mãe...

¬¬Não sei por que teimo em vir vender balinhas aqui na esquina da tragédia!

___Dona... Compra Dona... Não? Então vai lamber sabão...

Dizia sorrindo com ironia.

Foi em um desses momentos de má criação que Marcela sentiu-se imobilizada com firmeza.

Voltou a cabeça para ver seu agressor.

O guarda, bonachão. Pensou marcela, até me lembra papai Noel. Já escapei dele outras vezes.

___Ah Ah menina, hoje você não me escapa.

Marcela foi levada para a Delegacia de menores.

___Me solta... Não fiz nada!!!

Na instituição de amparo a infância, olhos curiosos voltaram-se para Marcela.

___Vá tratando de conhecer as colegas... Vai ficar por aqui por enquanto.

___Mais um “lindo” natal... falou entre dentes.

As crianças umas maiores outras menores, viam Marcela chegar sem muita curiosidade.

Apenas Soraya se aproximou.

___Oiii ..Sou Soraya e você?

___Marcela... e aí? Que horas é o rango, to cheia de fome!

___Já já! Toca a sineta pra gente entrar se lavar e logo vem a janta.

___E o rango é bom?

___Bom! Muito bom! Venha, quero que veja uma pessoa

Marcela!... Marcela!... Acudam Marcela desmaiou.

Marcela viu-se então indo ao encontro de seu pai, no abraço afetuoso, ouviu sua voz...

___Filha, não mais se culpe pela minha morte, continuo vivo, Tinha que ser assim.

Perdoa sua mãe, habitues se a prece, de hoje em diante terá lindos presentes de natal.

Acordou com a enfermeira lhe tocando a face.

___Marcela...

___Tia Marisa... é você mesmo? Não morri?... Continuo sonhando...

___Marcela querida... A quanto tempo não se alimenta?

Venha vamos. Daqui em diante vou cuidar de você, tudo farei para adotá-la.

___Cadê Soraya ?

Perguntou Marcela.

___Soraya? Não temos ninguém com esse nome aqui!

___Não? Mas como... Resolveu calar-se

Os dias ali foram de muita paz, enquanto aguardava a adoção buscava nas preces, seu refugio. Não mais sofria ao lembrar-se do pai, sua mãe a visitava raramente, no começo nervosa, irritada, mas depois, mais calma, carinhosa até.

Cinco dias para o Natal. Marcela amanhecera com ótimo humor naquele dia.

Sabia que em alguns minutos veria Marisa, isto a deixava muito feliz.

___Ótimas noticias minha linda... Tham Tham Tham ... Saiu a adoção!

___Jura?!

Momentos de muita alegria invadiram as duas. Naquele Natal Marcela receberia como havia dito seu pai,

O seu primeiro lindo presente de natal.