RIO NOTURNO

Sobe no parapeito da ponte, disposto a pular nas águas turvas do rio.

– Ei, você aí!

Do susto, Tonho quase perde o equilíbrio e cai de vez.

– O que tá fazendo, companheiro?

O intruso era um ruivinho de óculos, livro debaixo do braço.

– Vai pular mesmo?

– Por quê? Você vai me impedir?

– De jeito nenhum! Quero é pular com você...

– O quê?

– Faz tempo que eu queria pular, sabe?

– Não já pulou por quê?

– Faltou coragem de pular sozinho... Aí eu estava na praça lendo esse livro de poesias, vi você passando pra esse lado e pensei: “Esse cara tá indo pular da ponte.” Então vim correndo atrás de você. Posso subir aí?

– Vai embora, não me enche saco!

– Por favor, amigo, me deixe pular com você!

– Não sou seu amigo. E saia logo daqui enquanto não te quebro a cara de porrada!

– Tá bem, eu vou embora... Mas antes me fala uma coisa, pode ser?

– Que coisa?

– Por que você quer morrer?

– Não é da sua conta!

– Tá certo, me desculpe a intromissão... Vou embora. Tchau!

– Espera!

– O quê?

– E você... por que tá querendo morrer?

– Sei lá! Desde pequeno sempre tive a vontade de pular dessa ponte, uma noite... Você tinha essa vontade também?

– Não, é que ando meio chateado com umas coisas, entende?

– Sei como é... E aí, vai me deixar pular com você?

– Você quer mesmo?

– Ora se quero!

Sorrindo, Tonho desce do parapeito.

O ruivinho se desespera:

– O que foi? Não me diga que desistiu!

– Desisti...

– Só porque eu ia pular com você?

– Não é isso, não... Eu não quero morrer, acho que só me precipitei um pouco...

– E agora?

– Agora, se você quiser, vai ter que pular sozinho!

– Ah, não! Sozinho de jeito nenhum!

Sorrindo de novo, Tonho propõe tomarem uma cerveja num bar qualquer.

– Ou uma cachaça, se você preferir...

O outro, ligeiro, estende a mão:

– Feito! Como você se chama?

Hélio Sena
Enviado por Hélio Sena em 04/03/2011
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