Anatomia do Sentir

Nos lábios da contemplação guardava todas as palavras...parecia ter desaprendido destes tantos códigos e signos verbais criados pelo homem para se comunicarem. Os que a rodeavam desconheciam os olhares tão repletos de súplicas que ela silenciava...não sabiam decifrar a linguagem das sensações e cheiros que da pele exalava. Deixava-se ficar assim, entre a certeza dolorida da indiferença e o desejo de pronunciar-se, quebrando as amarras da contenção premeditada, quando se permitiu pelo emudecer ser apenas tragada.

A palavra, ela que outrora, tanto parecia lhe dizer, já compactuava uma confissão. Como deter o curso do que se quer expor, delatando-se ao mundo? As palavras... Elas, que por vezes, desalinham a vigilante razão, fazendo com que a face de alguns silêncios corem. Já não se deixava conjugar por qualquer verbo...era preciso mais que um entreabrir de lábios, para que a alcançassem. Refletia a despeito de leituras feitas, que lhe diziam de si, repletas de obviedades falaciosas. Não, não era o fato do pressupor em si que a inquietava, mas a urgência com que as letras saíam destes lábios, acenando sabedorias e sapiências, como se o idioma do coração, fosse um amontoado de frases bem construídas que precisassem de efeitos impactantes.

Precisava tão somente do encontrar de mãos que tudo dizem, quando se olham sem vidros a lhes embaçarem o toque. Queria aquele olhar que a seguisse, mesmo depois da última curva, onde a visão não mais a enxergava. Alguns confundiam-se, quando aproximavam-se, e no desejo do conhecer, acordavam o descanso de um botão por florescer. E, se observam as pétalas, esqueciam que elas se fechavam ao cair da tarde. Era preciso mais que o supor de apenas um sentido, para lhe sentir.

Na tarde que findava, acariciou um fio de cabelo que lhe descia sobre os olhos...entendeu que até uma parte ínfima de si, falava-lhe pela linguagem do toque, como a lhe dizer que desejava e precisava da proximidade e do afago. Desatou-se da rudeza de suas próprias mãos e, entregou-se a uma carícia sem pressa. O vento assentiu e, cúmplice soprou mais forte...

Depois daquele dia, não mais esperou pelo olhar dele...talvez por sentir, que a partir de então,apenas o espelho de si mesma a refletiria...fitou-se, enquanto uma última lágrima chorava em seu olhar!

Fernanda Guimarães

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Fernanda Guimarães
Enviado por Fernanda Guimarães em 31/01/2005
Reeditado em 25/08/2008
Código do texto: T3048