Minha Morte não me quis.

Tentei cortar meus pulsos mas a faca estava sem corte e fiquei com receio de que doesse demais. Não tinha ponta, era daquelas facas chatas, o que me desmotivou de socá-la em meu peito.

Tentei ligar o gás, mas gás não havia mais.

Tentei me enforcar, mas a corda, gasta e suja, arrebentou, me deixando apenas com um enorme vergão no pescoço, o qual arde agora. Cortaram a energia elétrica, e nem eletrocutado eu morreria...

Não tenho pomadas para sanar minha dor...

Tentei me jogar na frente de um ônibus velho, mas, incrivelmente, seu freio estava tinindo..., recém-saído da manutenção, deixando-me apenas com três costelas fraturadas.

Tentei gritar PALMEIRAS! no meio da gaviões da fiel, mas meu grito saiu rouco como o de um frango velho e broxa, e todos riram na minha cara, taxando-me de louco e bicha. Mas bicha não sou; e louco ainda não sei...

Tentei me jogar de alguns edifícios públicos, mas, quando os seguranças não me barravam e me davam uma boa surra, caía sobre as mãos de algum anjo-árvore, toldos, fios de alta-tensão, e nunca, nunca deu certo, sempre acordava com pessoas sobre mim tentando me reanimar. Reanimar pra que?

Não sei se errei, não sei aonde fui dar com meus burros, mas minha cabeça dói muito...

Meu coração palpitante insiste em bater, umas batidelas sôfregas, estranhas e intercaladas...

Todos os analgésicos, os tomei de uma só vez, mas, ou estavam vencidos ou eram fracos demais, eis que nem senti efeito, nem a dor aliviou, e cá ainda estou...

Tentei sorrir mas havia me esquecido que há muito perdi os dentes. Minha última dentadura caiu na privada quando fui vomitar meu ódio pelo mundo e pelos homens.

Calado, no entanto, tentei chorar, mas o médico me disse que tenho “olho seco”, e que, além de não lacrimejar, ainda tenho que usar um colírio caro para não ficar cego. Mais cego do que estou?

Tentei bater com a cabeça, em última instância, desesperado, na parede, mas o reboco caiu, de tão velha a minha morada, e um enorme galo me cresceu no coco.

Tentei ser eu, mas nem sabia do que se tratava...

Por fim, pedi a Deus que me jogasse um raio na cabeça, mas Ele me respondeu baixinho para “ficar na minha”, pois Ele e eu ainda tínhamos muitos problemas a resolver. Não entendi muito bem, mas, de nada adiantou..., e, passados alguns anos, cá estou, vivo e feliz, por saber que sou imortal, imoral e irracional..., e que minha morte não me quis...

Mil vezes, não me levem à mal!

Mas tentei, juro que tentei, mas agora não dou a mínima, pois meu medo era da morte, e queria adiantá-la a todo custo, com medo do medo, e agora que sei que não morro mais, vivo em paz!

(A morte não existe onde há vida! Ambas não se entrecruzam, portanto, é melhor não sofrer por nada antecipadamente!)

Savok Onaitsirk, 20.06.11.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 01/07/2011
Código do texto: T3068292
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