Tomando no rabo.

Triste e cabisbaixo, pensando nos churrascos que o pai fazia quando era criança...

Não tinha tantas queimações estomacais, aliás, nem as tinha, como tem hoje, daquelas que o corroem por dentro, o desanimando até de respirar. Tinha um pouco de prisão de ventre. Mas lembra que também era um pouco triste àquela época. Sempre um pouco triste, mas agora mais, e tem medo de que tudo se acentue, como de fato ocorre com o passar dos tempos.

Ingerindo seis doses diárias de antiácidos, vivia tomando no rabo; tomando cervejas; tomando tapas na cara; tomando dinheiro emprestado do banco; tomando até cair de cara na vala suja de merda. Vivia e não tinha razão para sorrir. Antes morto e sepultado no esquecimento do cimento de uma cova rasa.

Não existe palavra que expresse o caos de sua vida incisiva, confusa e torta.

Tinha agora um filho para sustentar, para que num futuro próximo não fosse como ele, um cão vadio e sem razão para viver.

Tentava a escrita como salvação, como única forma sua conhecida de oração. Não acreditava em religião nem em nada. Não acreditava nem em si.

Antigamente gostava dos jogos da seleção na televisão. Agora acha tudo um processo besta de ilusão do povo que paga a concessão para que alguns sortudos e imbecilizados ganhem fortunas correndo atrás de um pedaço de vaca morta.

Vê fantasmas e sombras diariamente atrás de si, como se a perscrutar-lhe os dias, se vai tudo bem ou mal. E como vai tudo mal, pensa logo que são anjos das sombras a sugar-lhe uns resquícios de fumaça ectoplásmica ou cósmica, as energias, ou mesmo algumas gotículas de sua bebida alcoólica.

Savok Onaitsirk, 13.07.11.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 14/07/2011
Código do texto: T3094085
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