O Homem sem imaginação.

Sem perder tempo, eis que já passara das cinco da tarde, Richard rumou para o bar. Dizia que seu patrão o demitiria caso ficasse um minuto a mais no trabalho.

Richard queria ser escritor, mas não tinha talento algum para coisa. Sempre escrevia sobre o mesmo assunto, coisas de bares, sem mesmo se dar conta disso. Os outros é que lhe diziam, mas sempre achava que era intriga da oposição, que nada escrevia.

Sua vida resumia-se em trabalhar, encher a cara e escrever. Uma monotonia mórbida, capaz de deixar o cidadão louco. E louco Richard já era um pouco.

Vivia pensando na garrafa de prazer do fim do dia e em alguma imaginação banal que porventura surgisse diante seus olhos tristes.

Não tinha imaginação. Sonhava com baratas e acordava com elas sobre seu pescoço, comendo restos de alguma coisa deixada na última refeição da noite; provavelmente algum salgadinho ordinário de cebola ou milho.

Toda noite ia muito ao banheiro, o que lhe tirava do sério. Por que tanta mijação? Aproveitava e cuspia na pia, e via que no dia seguinte formigas ficavam ali a zanzar. Achava que podia ser diabetes.

Sempre faltava dos compromissos, por mais escassos que fossem. Não tinha paciência para muita coisa na vida. E nem se esforçava para isso. Odiava comentários a seu respeito, mesmo que porventura elogiosos.

Não tinha filhos nem mulher, tinha uma cadela vira-latas suja que se chamava “cadela”.

Tinha um emprego que era a coisa mais idiota que um homem pode fazer, bater carimbos em folhas em branco, para futuras averbações. Esforçava-se às vezes para imaginar algum valor para aquilo, mas, mesmo espremendo até o talo, não via significado em seus malditos dias. Era um homem só, curvado diante o mundo, olhando calçadas na esperança de achar centavos, mas de tanto se atentar apenas a isso, acabava pisando em merdas de cães.

Um dia achou um real e, quando o ia pô-lo no bolso, duas freiras o interpelaram para que doasse alguma quantia para o hospital do câncer, depositando qualquer valor em uma caixinha e preenchendo um formulário. E como aquele real achado era sua única grana no momento, por impulso resolveu doá-lo de bom grado. Mas não quis preencher formulário coisa nenhuma. Foi saindo meio que resmungando...

Sua vida se resumia a tantas e tantas palavras jogadas ao léu, que não valiam o papel e fariam com que todo um dicionário bem elaborado parecesse ridículo e inútil.

Inútil! Tudo tão inútil...

Savok Onaitsirk, 13.07.11.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 14/07/2011
Código do texto: T3094086
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